Correntes d’ Escritas: como escolher o que não contar?

A frustração de não se poder escrever sobre tudo o que se experimentou num programa “louco” de oferta literária.

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O Correntes d'Escritas decorreu de 14 a 18 de Fevereiro na Póvoa de Varzim DR

Há um banquete literário anual na Póvoa de Varzim. Durante cinco dias, as diferentes iguarias são servidas no Cine-Teatro Garrett, nas escolas, na Biblioteca Municipal, no Diana Bar, nas freguesias limítrofes, na Fundação Dr. Luís Rainha, na rua. Ou seja, em todos os lugares onde haja apetite pela palavra. Onde não houver, cria-se.

O menu do Correntes d’Escritas é decidido pela chefe da divisão municipal da Cultura, Manuela Ribeiro, em conjunto com a sua equipa: colaboradores institucionais, mas também voluntários, que podem vir da área dos transportes, do mercado ou da gestão dos cemitérios. São funcionários que pedem, todos os anos, para que o município os coloque ao serviço da logística do festival, que já leva 24 anos de realização. Uma delícia.

Como escolher o que não contar de tudo o que se experimentou, deglutiu?

Assiste-se a várias comunicações, de muitas mesas, acompanha-se escritores a escolas; observa-se a casa de um bibliotecário coleccionista que já morreu (Manuel Lopes), enquanto uma encenação de textos comoventes decorre em cada canto (A Casa, com Álvaro Laborinho Lúcio, Luís Ricardo Duarte, Manuela Ribeiro, Rui Spranger); reflecte-se sobre as fronteiras entre poesia e teatro, pelas mãos e vozes de Jaime Rocha e Paulo Campos dos Reis, numa leitura encenada de O Homem e a Sombra; visitam-se exposições; volta-se a escutar as histórias e opiniões de Alberto Manguel e faz-se por acompanhar alguns lançamentos de livros. Um banquete, sim.

Apetece estar em todo o lado e desfrutar de todas as ofertas de um programa “louco”, mas a ubiquidade não é para os mortais. Mesmo de entre aquelas a que foi possível ser-se exposto, há que escolher as que não se traduzirão em prosa publicada. Uma dificuldade e uma frustração.

Como não criar “tempo de antena”, por exemplo, para as comunicações de Simão Lucas Pires ou de Afonso Cruz, sob o mote (de Ana Luísa Amaral, como o de todas as mesas) “Pergunto: o que há num nome?” ou de dar voz a todos os intervenientes da Mesa 9, “Se o real me parece uma coisa desigual”? Aqui, a diversidade de registos, idades, origens e géneros literários foi muito saborosa: Afonso Reis Cabral, Bernardo Pinto de Almeida, Gonçalo M. Tavares, Marcial Gala e Patrícia Portela —moderados e espicaçados… por João Gobern.

Também teve de nos escapar a Mesa 8 (“Este cansaço às oito da manhã não é normal”), em que estava presente a vencedora do Prémio Literário Casino da Póvoa desta edição, Maria do Rosário Pedreira (com O Meu Corpo Humano); a inauguração da exposição Agustina Bessa-Luís. Vida e Obra; o lançamento de O Mundo Sepúlveda, assim como O Dever de Deslumbrar —​ Biografia de Natália Correia. E muitos outros momentos a que gostaríamos de ter assistido e de aqui lhe dar conta, caro leitor. As nossas desculpas.

Divulgámos a Mesa 1, “O milagre do mundo a acontecer”, e a visita de João Rios e Mário Rufino à EB2/3 Aver-o-Mar. Pouco? Talvez. Fica como aperitivo para as próximas edições. Vislumbra-se loucura (repasto…) maior para o próximo ano, o 25.º do Correntes d’Escritas.

O PÚBLICO esteve na Póvoa a convite do festival

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