Membro do Governo de Bolsonaro diz que apoiantes de Lula têm “que morrer”
Sargento Travassos enviou vídeos e áudios a incentivar participação nas manifestações que pedem golpe militar. Militares do activo recolhem assinaturas para carta em tons golpistas.
Um militar no activo que está destacado no Gabinete de Segurança Institucional (GSI), liderado pelo general Augusto Heleno e que tem nível de ministério no Governo de Jair Bolsonaro, divulgou vídeos e áudios, citados pela Folha de S. Paulo, a incentivar os protestos a favor da intervenção das Forças Armadas para evitar que o Presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, tome posse do cargo a 1 de Janeiro.
No dia da estreia da selecção brasileira no Mundial de futebol do Qatar, o sargento da Marinha Ronaldo Ribeiro Travassos divulgou um vídeo gravado numa manifestação a mostrar que, mesmo em dia de jogo, o protesto continuava. “O povo não quer saber, o povo está aqui lutando pelo Brasil. Eu tenho a certeza que o ladrão não sobe a rampa”, numa referência a Lula e à “rampa” do Palácio do Planalto, sede da presidência.
O Partido dos Trabalhadores (PT), de Lula, já fez saber que deu entrada com um pedido de afastamento do sargento Travassos do GSI no Supremo Tribunal Federal na noite de terça-feira. “Temos aqui pelo menos dois problemas: incitação ao crime e crime contra as instituições eleitorais”, disse o deputado Paulo Teixeira à Folha.
O ódio do militar da Marinha estende-se de Lula aos seus apoiantes que ele considera que merecem ser assassinados pelas suas opções políticas. “Quem faz o L é terrorista. Tem que morrer mesmo, ou mudar ou morrer, porque não tem jeito uma pessoa dessa”, disse, garantindo que daria um tiro na cabeça do próprio irmão se ele fizesse o L que é o gesto característico dos apoiantes de Lula.”
O sargento Travassos é a expressão mais radical do estado de espírito de muitos militares brasileiros que não se conformam com a derrota de Bolsonaro na segunda volta das eleições de 30 de Outubro, Presidente que povoou o executivo de homens das Forças Armadas, no activo e na reserva.
Alguns militares no activo estão a envidar esforços para recolher assinaturas para uma carta aberta apócrifa que defende os actos antidemocráticos junto a quartéis, permanentes em alguns estados desde a divulgação da vitória de Lula nas eleições presidenciais.
Apesar de ser uma carta anónima, posta a circular nas redes de WhatsApp, e a maioria das assinaturas até agora recolhidas corresponderem a militares na reserva, o Alto Comando do Exército abordou o assunto na sua reunião de terça-feira, garante o mesmo jornal.
A “carta dos oficiais da activa [no activo] ao Comando do Exército”, refere que “é natural e justificável que o povo brasileiro esteja se sentindo indefeso, intimidado, de mãos” e procure nas Forças Armadas “o amparo para suas preocupações e solução para suas angústias”, diz a missiva.
Perante toda esta situação, mais a decisão dos chefes dos três ramos das Forças Armadas, em combinação com o Presidente Bolsonaro, segundo o Estado de São Paulo, de deixar o cargo antes do fim do ano e não esperar pela tomada de posse de Lula, o Presidente eleito resolveu jogar por antecipação. Não só anunciando que irá divulgar o nome do seu ministro da Defesa já para a próxima semana (e que seja ele a liderar equipa de transição), como também pedindo ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, para antecipar uma semana, de 19 para 12 de Dezembro, a chamada diplomação de Lula e do seu vice-Presidente, Geraldo Alckmin. No que foi confirmado esta terça-feira pelo TSE.
A diplomação é mecanismo legal que formaliza o resultado das urnas e habilita o Presidente e o vice-Presidente a exercerem os seus mandatos.
A imprensa brasileira aponta José Múcio Monteiro como o favorito para assumir a pasta. O ex-juiz do Tribunal de Contas da União (TCU) tem fama de conciliador e, segundo a Folha, foi bem recebido por Nelson Jobim, ex-ministro da Defesa a quem terá sido proposto o cargo e declinou.
Escolher o nome de um civil para a Defesa terá sido uma tarefa árdua para Lula e a sua equipa. É uma das pastas mais espinhosas para assumir numa altura em que as Forças Armadas assumiram um papel político como há muito não tinham. Num movimento que começou no Governo de Michel Temer e se acentuou de grande maneira com Bolsonaro.
De acordo com um estudo do TCU feito em 2021, o número de militares com cargos no Governo federal era de 2765 com Temer e chegou a 6175 com o actual Presidente.
Lula vai querer desmilitarizar o Governo e devolver os militares ao seu lugar nos quartéis, ao mesmo tempo que tentará não desagradar às altas chefias castrenses. E Múcio não só é visto como habilidoso pelos militares, como não é do PT, como Jaques Wagner, o ex-ministro da Defesa que chegou a ser ponderado para assumir de novo o cargo.
Não desagradar às chefias começará por respeitar as regras de antiguidade para a nomeação das chefias do Exército, Marinha e Aeronáutica que substituirão os comandantes que anteciparam a sua saída.