BdP prevê “redução muito substancial” dos dividendos a entregar ao Estado e quer “cautela” da banca
Mário Centeno justifica a redução de dividendos a entregar ao Estado com o impacto da subida das taxas de juro sobre os seus resultados. Do lado da banca, espera “cautela”.
O Banco de Portugal (BdP) prevê que haverá uma “redução muito substancial” dos dividendos que entrega ao Estado nos próximos anos e, ao mesmo tempo, espera que as instituições que supervisiona adoptem uma postura de “cautela” na hora de distribuir dividendos aos accionistas, de forma a conservarem capital nos actuais tempos de incerteza.
As declarações foram feitas na apresentação do mais recente Relatório de Estabilidade Financeira, publicado esta quarta-feira pelo BdP, no qual o regulador recomenda aos bancos uma maior prudência na concessão de crédito, tendo em conta o aumento dos riscos para a estabilidade financeira que se verificou nos últimos meses. Para além de um reforço da avaliação de novos clientes e de um ajustamento das condições associadas aos contratos de crédito, o BdP recomenda que os bancos ajustem o nível de provisões ao novo contexto, de forma a acomodarem potenciais perdas.
A isso, o regulador acrescenta uma recomendação quanto à conservação de capital por parte dos bancos. “O contexto realça a importância de o sector (...) seguir práticas adequadas de provisionamento e de conservação de capital, promovendo a capacidade para absorver eventuais perdas e financiar a economia”, pode ler-se no relatório.
Questionado sobre este alerta, Mário Centeno ressalvou que esta não é uma recomendação – no sentido oficial – do BdP, até porque as orientações quanto à distribuição de dividendos cabem ao Banco Central Europeu (BCE). Ainda assim, admite que, tal como outros operadores da economia, também os bancos devem ser prudentes nas decisões que tomarem nos próximos tempos, marcados pela incerteza.
“Todas as medidas de cautela sobre a conservação do capital que permitam reforçar financeiramente as instituições em todos os sectores da economia são importantes em momentos de incerteza. Não há uma recomendação e não há uma decisão sobre dividendos, uma vez que não é ao BdP que compete tomar essas decisões no contexto regulatório actual, mas há, claramente, uma chamada de atenção para que, neste momento, tenhamos todas as atitudes de cautela que considerarmos adequadas. Seguramente, a conservação de capital dos bancos é uma delas”, afirmou Mário Centeno.
Quanto à política que será adoptada pelo próprio BdP, o governador admite que também aqui a prudência irá imperar. “A previsão que temos, neste momento, é de uma redução muito substancial do que possam ser dividendos do BdP nos próximos anos”, disse. “O custo de financiamento dos bancos centrais, em virtude das taxas de juro negativas que vivemos durante muito tempo e desta súbita alteração das taxas de juro, é mais oneroso do que o retorno dos activos dos bancos centrais. Isto gera pressão nos seus resultados”, justificou ainda.
Esse será mais um golpe para os cofres públicos, tendo em conta a dimensão dos dividendos do BdP nos últimos anos.
Em 2022, o BdP entregou ao Estado 406 milhões de euros em dividendos, o que já representou uma ligeira redução em relação aos 428 milhões que tinham sido entregues no ano anterior. Já em 2023, de acordo com as estimativas inscritas no Orçamento do Estado, o Governo prevê que o BdP entregue 240 milhões de euros em dividendos, o que, a confirmar-se, representará uma forte redução em relação a este ano.