O Brasil, a Indonésia e a República Democrática do Congo (RDC) formalizaram, esta segunda-feira, a criação de uma aliança estratégica para a preservação das florestas tropicais. Os três países abrigam 52% das zonas com este tipo de vegetação no planeta, localizadas nas áreas verdes da bacia amazónica, do Congo, de Sumatra e Bornéu, um património natural cuja protecção é considerada crucial para evitar uma catástrofe climática.
“A cooperação do [hemisfério] Sul com o Sul é muito natural”, disse antes da assinatura a ministra do Ambiente da República Democrática do Congo, Eve Bazaiba, citada pela agência Reuters. “Temos os mesmos desafios, a mesma oportunidade de ser a solução para as mudanças climáticas.”
Representantes dos três países anunciaram o acordo de cooperação numa declaração conjunta à margem da cimeira do G20 – o grupo dos 20 países industrializados –, que tem início esta terça-feira em Bali, na Indonésia. O documento ainda foi negociado por representantes do governo liderado pelo Presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que perdeu as eleições a 30 de Outubro para Luís Inácio Lula da Silva.
A eleição de Lula foi interpretada pela comunidade internacional como um balão de oxigénio para deter a destruição da Amazónia. Só no ano passado, mais de 1,5 milhões de hectares de floresta tropical primária foram devastados (ver infografia). Diferentes líderes mundiais chegaram mesmo a referir a questão ambiental quando, após a divulgação dos resultados eleitorais no Brasil, saudaram o presidente eleito.
Duas cimeiras em simultâneo
O G20 coincide com a segunda e última semana da Cimeira do Clima das Nações Unidas (COP27), que decorre no Egipto até 18 de Novembro. A conselheira ambiental de Lula, Izabella Teixeira, que está em Sharm el-Sheikh para participar no evento internacional, afirmou que o Brasil envidará todos os esforços para que, num futuro próximo, os outros noves países da bacia amazónica também sejam evolvidos nesta cooperação.
“As florestas importam, a natureza importa. E acredito que, sem protecção da Amazónia, não podemos ter segurança climática”, referiu Izabella Teixeira, que foi ministra do Ambiente do mandato anterior de Lula, que terminou em 2010. “Acredito que o Brasil deve promover a união”, disse a ex-ministra à agência Reuters.
O esforço de envolver mais nações é particularmente importante se pensarmos que só a Bolívia, o Peru e a Colômbia – países que não fazem parte da aliança estratégica agora celebrada – testemunharam em 2021 a destruição conjunta de 574.220 hectares de floresta tropical primária, segundo a empresa de análise de dados Statista.
“As florestas tropicais entraram em sério declínio na última década. Em termos de hectares perdidos, o Brasil supera em muito qualquer outro país, com impressionantes 1.548.657 hectares de terra destruídos em 2021. A Amazónia é a maior do género no planeta, absorvendo quase dois bilhões de toneladas de CO2 por ano. Os cientistas alertam que estamos chegando perigosamente perto de um ponto de não-retorno”, afirma num artigo Anna Fleck, jornalista de dados da Statista. Fleck refere que, face a estatísticas aterradoras, a eleição de Lula devolveu alguma esperança aos ambientalistas.
Lula está a caminho do Egipto, onde participará na COP27 na quarta-feira, tendo precisamente a Amazónia como assunto primordial de discussão. No seu primeiro discurso após a vitória renhida nas urnas, o candidato do Partido dos Trabalhadores reservou várias palavras à Amazónia e à crise climática, prometendo lutar pelo fim da desflorestação.
“O Brasil está pronto para retomar o seu protagonismo na luta contra a crise climática, protegendo todos os nossos biomas, sobretudo a floresta amazónica. No nosso governo, fomos capazes de reduzir em 80% o desmatamento. Agora, vamos lutar pelo desmatamento zero da Amazónia”, afirmou o Presidente eleito no discurso de vitória, proferido em São Paulo na noite do dia 30 de Outubro.
OPEP das florestas
Lula também estava a trabalhar numa parceria com a Indonésia e a RDC para pressionar os países mais abastados a financiar a conservação das florestas, refere a Reuters. Contudo, segundo o jornal Folha de São Paulo, a declaração conjunta anunciada esta segunda-feira resulta de uma negociação levada a cabo por representantes do Governo de Bolsonaro, mais precisamente pelo diplomata Marcus Paranaguá, secretário do Ministério do Ambiente do Brasil responsável pela pasta do clima e das relações internacionais.
Aliás, segundo diferentes jornais brasileiros, foi o próprio Paranaguá quem baptizou a aliança como “OPEP das florestas”. O nome faz referência à influência que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) tem na agenda energética mundial e nas relações internacionais. Do mesmo modo, esta coligação de nações que abrigam florestas tropicais pretende dar as cartas em matéria de conservação ambiental, adoptando posições conjuntas nas cimeiras dedicadas ao clima e à biodiversidade.
Segundo o diário britânico Guardian, o acordo prevê que os três países coordenarão as negociações sobre clima e biodiversidade Nações Unidas relacionadas com as florestas tropicais, com destaque para as áreas de apoio financeiro, gestão sustentável e regeneração.
Entre as propostas em cima da mesa está a criação de “um mecanismo de financiamento sustentável” que permita aos três países apoio mediante resultados – ou seja, só quem de facto combate a desflorestação pode receber o montante previsto. Isto além de um reforço do financiamento oriundo do programa REDD+ das Nações Unidas, destinado a reduzir a desflorestação.