A música tradicional na obra de José Afonso celebrada num concerto em Lisboa

A Associação José Afonso celebra os seus 35 anos num concerto com a Brigada Victor Jara, Janita Salomé, Miguel Calhaz e Moçoilas. Dia 19, no Fórum Lisboa.

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José Afonso num concerto, a tocar adufe DR

Fundada em 1987, a Associação José Afonso (AJA) tem vindo a organizar anualmente, desde há uns anos, concertos comemorativos no Fórum Lisboa. Nesse contexto, já ali foram celebradas as obras de músicos que de algum modo se relacionaram com José Afonso (1929-1987), como Francisco Fanhais, Manuel Freire e Rui Pato. “Este ano, alguém lançou a ideia de falar da importância da música tradicional em Portugal pelo lado da divulgação que o Zeca lhe deu”, explica ao PÚBLICO Francisco Fanhais, hoje presidente da AJA.

Foi assim que se chegou ao cartaz que anuncia A Música Tradicional Portuguesa na obra de Zeca Afonso, num concerto marcado para o próximo dia 19 de Novembro, um sábado, às 16h, com a participação da Brigada Victor Jara, de Janita Salomé, de Miguel Calhaz e do grupo Moçoilas. “Fizemos uma lista grande”, diz Fanhais. “Uns estavam disponíveis e outros não, por razões de agenda. Ainda tentámos os Galandum Galundaina, de Trás-os-Montes, mas era logisticamente muito complicado. E ficaram estes quatro nomes no cartaz. A ideia básica é que, por um lado, cada um se exprima através do Zeca e, por outro, através da sua própria produção e inspiração.”

A música tradicional na obra de José Afonso já foi tema, recorde-se, de dois livros do musicólogo Mário Correia, ambos editados pela Sons da Terra, o mais completo dos quais é A Raiz Genuína. A Música Tradicional na Obra de José Afonso, de 2016, que além de enquadrar historicamente o desenvolvimento dessa relação, analisa todas as canções tradicionais gravadas por José Afonso – e não são poucas – com as respectivas letras, desde o Vira de Coimbra (1960) até Tu, gitana (1985), passando por Tenho barcos, tenho remos (1962), Canção vai.. e vem (1963), Canção longe (1967), Os bravos (1967), Resineiro engraçado (1970), Saudadinha (1968), Senhora do Almortão (1968), Oh! Que calma vai caindo (1969), Canta camarada canta (1969), S. Macaio (1969), Deus te salve Rosa (1969), Lá vai Jeremias (1969), Maria Faia (1970), Moda do entrudo (1970 e 1985), Milho verde (1970) e Ó minha amora madura (1972).

Francisco Fanhais, que esteve a rever o tema por causa do concerto, recorda: “A divulgação da música tradicional começou nos anos 30, pelo Artur Santos. E o Zeca, pela estima extraordinária que tinha pelo povo, deve ter entendido que, ajudando a divulgar a música tradicional, de alguma maneira punha o povo a intervir, não por objectivos direccionados para a política, mas pela valorização da cultura popular.”

Canto Moço nas escolas

Além dos concertos e de outras iniciativas relacionadas com a obra de José Afonso (um dos projectos em curso é a edição em livro de uma colectânea de entrevistas do cantor), a AJA tem vindo, ao longo dos anos, a criar novos núcleos, como sucedeu em 2018, com a abertura de um núcleo na Galiza, o seu décimo-sexto. Mas têm nascido outros, como diz Fanhais: “Registámos com muito agrado a recente criação de dois núcleos, surgidos por vontade de pessoas da terra, nas Caldas da Rainha e em Viana do Castelo.”

A par disso, há um projecto a que a AJA dedica especial atenção: “É o projecto Canto Moço, destinado a difundir pelas escolas o tema dos direitos humanos na obra do Zeca. Começámos por Setúbal e está bastante desenvolvido.” Helena Carmo, também da AJA, explica ao PÚBLICO que este projecto se enquadra “nos EEA Grants, geridos pela Fundação Gulbenkian, com financiamento de três países do norte da Europa, o Lichtenstein, o Luxemburgo e a Noruega”. A candidatura foi apresentada em 2020 e aprovada em Março de 2021. “O objectivo é trabalhar a questão dos direitos humanos a partir das canções do José Afonso, para uma faixa etária do 2.º ciclo do Básico, 7.º, 8.º e 9.º anos. Trabalhamos também com associações que têm actividades com adolescentes.”

Em Setúbal, onde o projecto começou, a candidatura de Canto Moço foi feita em parceria com a Câmara Municipal de Setúbal, o SOS Racismo e a Associação de Juventude do Bairro da Cova da Moura. “A cada momento, partilhando com os professores de Cidadania ou com monitores, no caso das associações, sessão a sessão, a partir de uma canção de Zeca Afonso exploramos um direito humano com o grupo ou a turma. Há ainda uma aplicação informática, que é um jogo didáctico neste mesmos moldes”, acrescenta Helena Carmo. “E há também uma oficina de formação de professores, multiplicando as possibilidades de concretização deste projecto.”

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