Santos Silva defende o seu papel na AR e deixa recado ao PS: “Não nos devemos esquecer do nosso próprio eleitorado”
O socialista e presidente da Assembleia da República pediu aos socialistas que não esqueçam o seu eleitorado, nem negligenciem quem se sente “inseguro” na actual conjuntura. E vincou que não é tempo para divisões entre o grupo parlamentar e o Governo.
Se uma maioria absoluta é sinónimo de (alguma) estabilidade política, os deputados do PS entram no novo ano político com três alertas deixados por Augusto Santos Silva. No encerramento do segundo dia das jornadas parlamentares do PS, o socialista eleito pelo círculo Fora da Europa pediu ao seu grupo parlamentar que tenha em mente duas prioridades: não esquecer “o seu próprio eleitorado”, conquistar mais eleitorado jovem e manter o PS unido nas suas duas frentes, a parlamentar e a governativa, para que não se “desperdicem as condições únicas” do partido.
As declarações do socialista surgem num momento em que cada vez mais vozes no PS se têm posicionado contra a decisão do Governo de não avançar com a criação de um imposto para as empresas com lucros extraordinários. “É preciso que o grupo parlamentar e Governo funcionem em harmonia para que possamos ultrapassar as dificuldades económicas”, reiterou.
Num discurso que não durou mais do que dez minutos, Santos Silva defendeu o seu papel enquanto presidente da Assembleia da República e disse que “o tempo” se “encarregará” de mostrar, “a algum deputado ou a alguma deputada que não compreende”, o “respeito que é exigido” no Parlamento em defesa dos que não estão presentes no hemiciclo, sejam eles “portugueses ou estrangeiros a viver em Portugal”, e que os deputados têm “a assumida honra de respeitar”.
E pediu atenção para os portugueses que se sentem “inseguros”, para evitar que sejam “presas fáceis da demagogia e do populismo”, até porque “quem ficar à espera da direita para combater esse populismo pode bem esperar sentado”, dando como exemplo “o que se passou neste domingo na Suécia” e o caso italiano para afirmar que “só a esquerda democrática consegue fazer esse debate”.
Santos Silva pediu ainda ao PS que não esqueça a sua “própria base eleitoral política e social”. “Somos os representantes das classes populares e médias em todo o território nacional, que querem um Portugal bem integrado na Europa, um país democrático, livre, inclusivo, que acolhe bem os estrangeiros e quer um Governo moderado”, disse. E pediu “especial atenção” para aqueles que “trabalham, mas vivem perto do limiar da pobreza, sentem insegurança nos seus bairros, nos seus empregos e no ambiente geral de conflitualidade e guerra”, e cujas “angústias e problemas não podem ser ignorados”.
O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros afirmou que tem respeitado o debate “vivo, franco, confrontacional quando deve ser, mas com o respeito, a cordialidade e a civilidade necessária”. “Asseguro que o debate vivo se faça no respeito pelos valores democráticos. Se algum deputado não compreende isso, o tempo se encarregará de fazer com que ela ou ele o compreenda”, disse.
Sem referir nomes de qualquer deputado ou partido, Santos Silva disse que o seu objectivo “se resume numa frase: cumprir as obrigações constitucionais e regimentais”. “Não faço mais do que isso nem menos do que isso. Nunca farei mais do que isso nem menos do que isso”, insistiu.
Além da sua base eleitoral, Santos Silva pediu que se faça “cada vez mais” pelas “jovens famílias das classes médias portugueses que, por circunstâncias, estão ligadas ao mercado de arrendamento, à competitividade das empresas portuguesas, às relações de trabalho em Portugal, estão hoje numa posição de bastante vulnerabilidade”. “Não percam tempo com aquilo que não merece que nós ocupemos o nosso tempo”, concluiu, antes de os jornalistas serem convidados a sair da sala para que os deputados jantassem sem a presença da comunicação social. No hall do hotel, ia sendo montada uma pista de dança.
As jornadas parlamentares do PS terminam esta terça-feira, na Nazaré, com uma intervenção de Ana Catarina Mendes, ministra dos Assuntos Parlamentares.