Fotografia
Há fome no Afeganistão e milhões de dólares retidos nos EUA. Fotógrafos vendem obras para ajudar
O Afeganistão atravessa, após a tomada do poder pelos taliban, uma crise económica e humanitária profunda, agravada pela seca extrema e pela retirada de fundos públicos do país. A organização britânica Ishkar lançou uma venda de fotografia online com o objectivo de angariar fundos para fazer face a essa crise.
No dia 15 de Agosto de 2021, após 20 anos de guerra ininterrupta com os Estados Unidos, o Afeganistão caiu, finalmente, sob jugo taliban. O país, que sofreu ao longo desse período de conflito uma profunda crise política, social e económica, viu, então, a situação degradar-se ainda mais com a retirada do exército norte-americano, a 30 de Agosto.
Presentemente, o Afeganistão sofre uma crise económica sem precedentes, agudizada pela seca extrema que deixou, segundo dados da ONU, 98% da população em situação de escassez alimentar. Mas não só. Os serviços públicos afegãos estão à beira do colapso. Com a crise provocada pela covid-19, com o afastamento das mulheres das equipas médicas dos hospitais e com 3,5 mil milhões de fundos públicos retidos pelos Estados Unidos, o sistema nacional de saúde do Afeganistão não consegue dar resposta à procura, fazendo disparar a mortalidade, sobretudo a infantil.
"Nos últimos 12 meses, milhões de afegãos enfrentaram uma nova onda de dificuldades: fome generalizada, desemprego, pobreza universal", pode ler-se num comunicado lançado por 32 organizações não-governamentais de cariz social do Afeganistão publicado recentemente, no qual apelam em conjunto à devolução dos fundos públicos retirados do Banco Central do Afeganistão pelo governo norte-americano. O pedido surge um ano depois de sete mil milhões de dólares, aproximadamente o mesmo valor em euros, terem sido retirados do Banco Central do Afeganistão e depositados no Banco de Reserva Federal dos Estados Unidos. O presidente Joe Biden congelou os fundos e decidiu dividi-los a meio, justificando que metade deveria destinar-se à possível compensação de familiares das vítimas do 11 de Setembro e que a outra seria aplicada em ajuda humanitária à população afegã.
Após vários protestos populares e exigências por parte das ONG, os 3,5 mil milhões de dólares prometidos à população afegã continuam retidos nos Estados Unidos, que justifica temer vê-los em cair mãos erradas. Ao mesmo tempo, a ONU e a UNICEF apelam à contribuição civil para o combate à crise e a Amnistia Internacional condena a "indiferença" da comunidade internacional em relação às condições de vida e direitos humanos no Afeganistão.
É neste contexto que surgem iniciativas internacionais que têm como objectivo a angariação de fundos para os hospitais afegãos. A Ishkar, uma organização britânica de cariz social, lançou, em conjunto com um grupo de fotógrafos - entre os quais Steve McCurry, Andrew Quilty, Emily Garthwaite - uma venda de fotografia online que pretende obter receita para doação à Emergency, que opera no Afeganistão em três centros médicos e 40 postos de primeiros socorros. "Durante a guerra, as pessoas morriam no conflito", explica um dos médicos do Centro Médico Cirúrgico da Emergency, em Cabul. "Agora morrem de malnutrição. Antes, as pessoas não podiam andar na rua para evitar os bombardeamentos, agora estão a morrer dentro de casa. A situação económica é pobre e os problemas de saúde agravam-se em resultado disso."
Parte das 24 imagens para venda no site da organização está à vista nesta fotogaleria. "Um ano depois [da transição política no Afeganistão], o mundo esqueceu o assunto", refere a Ishkar, em comunicado. "Aqui damos oportunidade de o mundo provar que ainda se importa."