Fotografia
Carlos Pérez Siquier: ui, que calor
As praias de Almería e a massa humana que as invadiu a partir dos anos 1970 são talvez a face mais visível da obra do espanhol Carlos Pérez Siquier. Mas há um antes e um depois desses ícones da cor, como revela uma monumental retrospectiva em Madrid, até 28 de Agosto.
O fotógrafo espanhol Carlos Pérez Siquier morreu no dia 13 de Setembro de 2021. Exactamente um ano antes, era inaugurada em Barcelona a mais completa exposição retrospectiva sobre o seu trabalho, que Siquier (Almería, 1930) pôde apreciar. Agora, integrada na programação do festival PHotoEspaña, a mesma exposição viaja até Madrid para que a capital também possa celebrar a obra de um dos mais marcantes fotógrafos espanhóis da segunda metade do século XX. Siquier já não pôde percorrer os dois pisos da Fundación Mapfre que resgatam algumas das suas mais icónicas imagens e que traçam um percurso coeso, questionador, pioneiro e vibrante. Agora, é tempo de a sua obra viver (e falar) por ele.
Não deixa de ser irónico que esta celebração em jeito de balanço seja feita a partir das duas maiores cidades de Espanha, quando era conhecida a sua “militância” regionalista, uma certa teimosia em manter-se à margem dos grandes centros como “artista periférico”. Almería, a sua costa mediterrânica e as suas redondezas sempre foram a sua geografia íntima e a sua mais estimulante matéria-prima de trabalho. E foram mais de 60 anos nisto. Certo é que ao percorrer as seis séries que compõem esta retrospectiva (com várias imagens inéditas) não se nota qualquer sinal de cansaço, letargia ou repetição.
Pérez Siquier não saiu de Almería, mas esse gesto está longe de significar provincianismo ou qualquer limitação criativa. Muito pelo contrário. A partir dali manteve contacto com alguns dos mais importantes fotógrafos espanhóis da época e ajudou a operar uma pequena revolução no meio, através do Grupo AFAL, uma associação de fotografia regional que Siquier tornou nacional, dinâmica e vanguardista. A partir dali, descobriu, através de imagens a preto e branco, um bairro (La Chanca, Almería) que pode (ainda hoje) ser lido como metáfora da condição humana. A partir dali começou a usar a cor na fotografia, no início dos anos 1960, tornando-se num dos pioneiros mundiais neste suporte. A partir dali, criou uma obra mordaz, carregada de humor fino. A partir dali captou um mundo original, espectacular; pequeno e grande, local e universal ao mesmo tempo. A partir dali foi capaz de criar um azul, o “azul Siquier”.