O futebolista Sébastien Haller, de 28 anos, foi diagnosticado com cancro do testículo. Em 1996, o ciclista Lance Armstrong descobriu também o mesmo tipo de cancro, mas já metastizado no pulmão, no abdómen e no cérebro. Trata-se de um tumor raro — só 1% dos casos de cancro no homem —, sendo mais frequente na faixa etária dos 15 aos 35 anos, e que geralmente afecta só um dos testículos.
Quais são os principais sintomas desta doença? Existe possibilidade de tratamento? Há cuidados que possam ser adoptados tendo em vista a prevenção? O PÚBLICO conversou com o oncologista Mário Fontes e Sousa, do Hospital CUF Tejo, em Lisboa, para dar resposta a estas e outras questões.
É possível prevenir o cancro do testículo?
Não há uma forma de prevenir o aparecimento deste tipo de tumor, sendo, contudo, fundamental “fazer vigilância” para garantir que não há doença. No entanto, existe um conjunto de factores que podem aumentar o risco. Primeiro, a idade: o cancro do testículo é “mais frequente entre os 15 e os 35 anos”, diz Mário Fontes e Sousa. O oncologista aponta também para a genética como algo a ter em conta, pois se alguém tiver um caso na família, é mais provável desenvolver cancro testicular. O desenvolvimento da doença pode ainda dever-se a alterações cromossómicas, em que se verifica excesso ou falta de cromossomas.
Para Fontes e Sousa, há que estar ainda alerta ao próprio modo como o testículo se desenvolve. Este é suposto descer até à zona do escroto, por isso se tal não acontecer o risco é maior. Outros factores passam por patologias como a síndrome de Klinefelter, que se traduz num desenvolvimento anormal do órgão. A infertilidade também aumenta o risco, bem como alguns traumatismos.
A que sinais estar atento?
O cancro do testículo é geralmente “indolor”, explica ao PÚBLICO o médico oncologista, mas há um conjunto de sinais que podem ajudar a perceber o desenvolvimento do tumor. “Normalmente é o inchaço que é o primeiro sinal”, assinala. Além desse inchaço, ou edema, geralmente podem-se verificar nódulos no escroto ou uma sensação de peso acrescido no mesmo. O tamanho dos testículos pode ainda ser reduzido, tal como pode haver lugar a uma maior sensibilidade na zona mamária, acrescenta Mário Fontes e Sousa.
Como é que se diagnostica?
Como salienta o oncologista, este cancro não é como os outros no que toca ao seu diagnóstico. “Não é um tipo de tumor que tenha um rastreio definido”, explica. Assim, normalmente, o que acontece é que o próprio doente identifica o cancro através de “uma apalpação regular” dos testículos.
Mesmo assim, há alguns diagnósticos que podem ser realizados após consultar médica, para verificar e confirmar a presença de um tumor. Por exemplo, pode passar, numa fase inicial, pela análise da história clínica do doente e pela realização de um exame físico, em que se tenta, tal como na auto-apalpação, procurar um nódulo ou sinais de inchaço. Mário Fontes e Sousa refere ainda biomarcadores como “uma forma de diagnosticar”, podendo ser identificados a partir de análises ao sangue.
O cancro testicular é curável?
O cancro do testículo, ao contrário da maioria, vai só até ao estádio 3, em que já se encontra metastizado, sendo importante um diagnóstico precoce para um tratamento mais eficaz. Contudo, independentemente da fase da doença, o prognóstico é positivo: “Estamos a falar de percentagens elevadas de cura”, assegura o oncologista ao PÚBLICO. “São valores que não conseguimos ver em mais nenhum tipo de cancro”, acrescenta, apontando para uma eficácia do tratamento em mais de nove em cada dez casos, tal como mostram os vários estudos e publicações. Segundo um relatório da CUF Oncologia, o prognóstico de sobrevida, até dez anos após o diagnóstico, supera os 90%.
No início, o processo de tratamento passa por uma orquidectomia, uma “cirurgia de remoção do tumor inicial”, explica o oncologista, ou seja, a retirada do testículo. Tal permite identificar a natureza do tumor, as suas características e a extensão da doença no organismo. Fontes e Sousa alerta ainda para a importância da operação “acontecer em poucos dias”. Posteriormente, estando o cancro na fase mais inicial, é necessário manter a vigilância, com exames regulares. A quimioterapia é geralmente o recomendado para quando o tumor já se encontra metastizado. “Há muitas situações em que realmente [o tratamento] pode ter de passar por quimioterapia”, diz.
No entanto, a cura pode trazer consequências como a perda de fertilidade. É por isso que se costuma fazer uma colheita de esperma antes de qualquer tratamento, nota o oncologista da CUF. Assim, “fica congelado de maneira a ser utilizado no futuro”.
Mário Fontes e Sousa admite que não há muita preparação “para este tipo de situações” por parte dos mais jovens, pois não constitui uma preocupação; o cancro é ainda bastante associado à idade, destaca. Constitui toda “uma nova aprendizagem” que faz “as pessoas terem de repensar a vida”, conclui.
Texto editado por Bárbara Wong