Profissão: mãe
O que é mais claustrofóbico, aquilo que dá vontade de fugir sem olhar para trás, sendo que sabemos perfeitamente que nunca o faremos, é a preocupação.
Querida Ana,
Fecha a porta do quarto, fecha os olhos e deixa-os em autogestão. Lembras-te que era esta a filosofia do livro É meia-noite, não chove e ela ainda não está em casa, que escrevemos juntas. Toda a gente pensava que “ausente” era uma filha adolescente, mas na nossa história era a mãe que tinha sido depositada pelos filhos num orfanato de mães, porque estavam fartos de a aturar.
Simplesmente, quando a loiça se acumulou na cozinha, não havia ninguém para ler histórias à noite, e a cama que acolhia os assustados pelos pesadelos estava vazia, decidiram pedir-lhe para voltar. Só que ela exigiu um contrato de trabalho, férias pagas e subsídio de Natal.
Nessa altura, eu era a voz da mãe, e tu, a voz dos oito filhos. Agora estás no papel de mãe, no final de um terceiro trimestre da escola... Como te sentes? Queres fugir para um orfanato de mães?! Posso ajudar-te a pagar a primeira mensalidade...
Querida Mãe,
Sim! Claro que às vezes apetece fugir das birras, dos cestos da roupa suja, apetece fugir das discussões non stop por causa do lugar à janela no carro ou pela posse do brinquedo. Apetece fugir da lavagem dos termos, de enfiar uma meia num pé, enquanto ele tira a outra. Das birras para entrar no banho e do histerismo para sair. Por vezes, apetece fugir de cozinhar, mas também apetece fugir dos douradinhos, a que recorremos em excesso. Mas, mãe, eu sei que isto vai passar. Sei que, no limite, tenho sempre alguém a quem os posso “delegar”. Posso dar-me ao luxo de fugir mesmo.
O que é mais claustrofóbico, aquilo que dá vontade de fugir sem olhar para trás, sendo que sabemos perfeitamente que nunca o faremos, é a preocupação. O medo de não os conseguirmos proteger. A necessidade de tomarmos constantemente decisões importantes. A impossibilidade de fugir àquela sensação vertiginosa de que hoje estão bem, mas amanhã tudo pode mudar. As saudades quando não estão connosco, e o cansaço quando estão.
Há momentos, sim, mãe, em que apetece fugir a sete pés dessa responsabilidade gigante. Mas depois, basta um olhar, um sorriso, até uma birra mais disparatada e para a qual conseguimos olhar um bocadinho de fora, para percebermos que este cargo é duro e difícil, mas é a melhor coisa do mundo!
No Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. Mas, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam. Facebook e Instagram.