Estalo de Will Smith a Chris Rock entre “a coisa mais bonita” e o perigo da “normalização da violência”
Incidente roubou a atenção dos prémios. Para uns, Will Smith foi uma espécie de herói de capa e espada, para outros, a personificação da masculinidade tóxica que o filme que lhe valeu um Óscar nesta mesma noite retrata.
“Sei que ainda estamos todos a processar, mas a forma como a violência casual foi normalizada esta noite perante uma audiência nacional colectiva terá consequências que nem sequer podemos imaginar no momento”, alertou quase de imediato Janai Nelson, presidente da LDF, uma reconhecida organização de direitos civis norte-americana. Nelson referia-se à agressão de Will Smith a Chris Rock em plena cerimónia de entrega dos Óscares, que decorreu na última madrugada, depois de o apresentador ter feito uma piada sobre a cabeça rapada de Jada Pinkett Smith. Will Smith primeiro riu-se, mas ao ver o ar incomodado da mulher, levantou-se, dirigiu-se ao palco e, perante uma perplexa plateia, esbofeteou o humorista.
O acto, porém, não é visto da mesma maneira por toda a gente. Para a actriz Tiffany Haddish, vencedora de um Emmy pela sua participação no programa satírico Saturday Night Live, foi “a coisa mais bonita alguma vez vista”, já que, explicou à revista People, a fez “acreditar que ainda há homens por aí que amam e se preocupam com as suas mulheres, as suas esposas”.
Mas a publicação de E. Jean Carroll, a jornalista que acusou Donald Trump de violação e, depois de este negar o ocorrido, apresentou queixa de difamação por lhe ter chamado de mentirosa, esclarece que de facto “o amor far-te-á fazer coisas loucas”, como alegou Will Smith, contudo, “todas as mulheres que já foram agredidas ouviram esta [frase]”, sublinha.
A explicação do amor é também questionada por Maria Shriver, a jornalista, sobrinha de John F. Kennedy, que foi casada com Arnold Schwarzenegger até 2021. “Will Smith diz que quer ser um meio de transporte de amor. O amor não é violento. Amor não é o que foi exposto num palco global esta noite”, escreveu no Twitter, revelando-se revoltada por, depois da agressão, Smith ter sido ovacionado de pé na altura em que recebeu o prémio de melhor actor.
O facto de a cerimónia ter prosseguido como se nada tivesse acontecido, ou quase, também é motivo de choque, com a argumentista de televisão norte-americana Ty Ross a apontar o dedo ao facto de Will Smith “não ser sido escoltado pela segurança”, considerando “um lembrete de dois Estados Unidos: que se se é rico e famoso, as regras são diferentes”. Mais: “O facto de se ter sentado no seu lugar prova que Will também sabe isso.”
A técnica Diane Cuthbert também se pergunta “como Will Smith não foi retirado da cerimónia”. “Como é que ataca alguém no palco diante de uma câmara e não há consequências?”
Mas o ataque, que muitos queriam acreditar que se tratava de uma paródia, como Trevor Noah (“Não estava escrito?????”), levanta outras questões, como atira a humorista Kathy Griffin. “Deixem-me que vos diga que é uma prática muito má subir ao palco e agredir fisicamente um comediante. Agora todos temos de nos preocupar com quem quer ser o próximo Will Smith em clubes de comédia e teatros.”
Mas para o filho do casal, Jaden Smith, o pai terá agido da forma mais acertada. “É assim que fazemos”, escreveu o jovem actor no Twitter, acrescentado noutra publicação a emoção sentida ao ouvir o discurso após o prémio de melhor actor: “O discurso do meu pai pôs-me a chorar”, confessou.