Fotografia
Ucrânia: na iminência de um novo conflito, Avdiivka sustém a respiração
O fotógrafo português Igor Aboim está a seis quilómetros de Donetsk, na Ucrânia, próximo do epicentro da presente crise militar entre a Rússia e o Ocidente. A fustigada cidade de Avdiivka sustém a respiração na iminência de um novo conflito.
A apenas seis quilómetros de Donetsk, que está no epicentro da presente crise militar entre a Rússia e o Ocidente, Avdiivka sustém a respiração. A pequena cidade da Ucrânia foi das primeiras a ser tomada pelos separatistas, em 2014, e foi palco da guerra civil que, ao longo de sete anos, já provocou cerca de 30 mil mortes. Quem por lá vive não esquece, também, a batalha que deflagrou entre 29 de Janeiro e 4 de Fevereiro de 2017 e deixou mais de 17 mil residentes sem água, electricidade ou aquecimento.
As feridas de guerra são muitas e visíveis nos edifícios perfurados por balas, destruídos por mísseis; essas transformaram Avdiivka no que parece, "em muitas partes, uma cidade fantasma". A descrição é do fotógrafo português Igor Aboim, que enviou as fotografias ao P3 a partir do local. "A cidade é das últimas antes da frente de guerra", onde pretendia chegar. "Entrar em Donetsk e Luhansk é impossível sem uma autorização do Ministério da Defesa." Mesmo para entrar em Avdiivka foi necessário passar por um posto de controlo. "Só consegui entrar graças ao taxista que me acompanhou, natural de Spartak, que fica a três quilómetros do aeroporto de Donetsk."
Que clima se vive na cidade-fronteira do conflito? "Nota-se a destruição deixada pelos anos de conflito em muitos prédios, paragens de autocarro, bombas de gasolina abandonadas", descreve o fotógrafo de 28 anos, em entrevista ao P3 a partir da Ucrânia. "Há um pequeno centro que continua a viver como se nada se passasse – confesso que é até um pouco surreal." Na atitude das pessoas, não é notória a mesma passividade. A guerra deixa marcas que a memória não deixa apagar. "Sente-se tensão, as pessoas olham um pouco desconfiadas", relata. Quase ninguém quis falar com Aboim. Abordou civis, militares, mas ninguém quis prestar declarações ou deixar-se retratar, excepto duas mulheres, funcionárias de uma mercearia e de um minimercado. "Sente-se que não há normalidade."
Olga, nascida e criada em Avdiivka, disse a Aboim que agora a situação está "mais ou menos calma" em comparação ao conflito que decorreu entre 2014 e 2017. "Na altura foi muito difícil, muita coisa foi destruída", partilhou a funcionária de um supermercado local. A ucraniana considera que há "uma hipótese de 50% daquela zona ser novamente capturada", mas que não tenciona fugir. "Espera ansiosamente pela altura em que se possa reconstruir novamente a cidade e que todos possam retomar uma vida mais próxima da normalidade."
Algo impressionou Igor Aboim, natural de Matosinhos, aos longo dos dias que passou na Ucrânia, onde pretende permanecer nos próximos dias: "O espírito quase indestrutível de todas as pessoas que conheci em Kiev, em Kramatorsk e Kharkiv", revela. "Têm um sentimento muito forte de defesa da pátria, uma força e resiliência impressionantes." Esse espírito fá-lo adivinhar um futuro sangrento em caso de invasão russa. "A resistência vai ser forte, ninguém se vai deixar ficar."