João Costa: mais autonomia na contratação de professores pressupõe um “modelo rigoroso”

No final de dois dias de negociações sobre a alteração do modelo de recrutamento de professores, o ministro da Educação aproveitou para responder a críticas e apresentar as injustiças do sistema actual.

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João Costa agendou novas sessões negociais para o final de Outubro LUSA/ANDRE KOSTERS

O ministro da Educação, João Costa, defendeu nesta quinta-feira que dar mais autonomia às escolas na contratação de professores pressupõe que tem de se “encontrar um modelo que garanta que uma escolha com um perfil de competências seja também objectivo, rigoroso, criterioso”. Em declarações aos jornalistas no final de dois dias de negociações com os sindicatos de professores, João Costa respondia deste modo às críticas de que com mais autonomia de contratação se corre o risco de as escolas desenharam perfis de competências “à medida dos candidatos”, como já aconteceu no passado.

“Eu, por sistema, não desconsidero os professores. Não parto do princípio de que as pessoas são desonestas”, contrapôs João Costa, sublinhando as injustiças do modelo actual, no âmbito o qual os professores são colocados com base numa lista nacional, em que estão ordenados em função da sua graduação profissional. “Neste momento sabemos que o modelo de contratação de professores olha para o professor em função da sua nota de fim de curso e dos dias que trabalhou [variantes do cálculo da graduação profissional]”, criticou, frisando também que esta “dimensão até desvaloriza” os professores que investem em formações específicas.

“Podemos pegar num exemplo: uma escola de 1.º ciclo aqui em Lisboa, numa determinada zona, onde há mais de 30 ou 40 nacionalidades. Há professores de 1.º ciclo que investiram na sua formação em multiculturalidade, em ensino do português como língua não materna, há outros que não. Será uma má gestão de recursos humanos não aproveitarmos este potencial e colocar um professor com este perfil numa escola monolingue e deixar de fora este recurso”, especificou João Costa.

O ministro quer que no novo modelo de recrutamento as escolas tenham autonomia para contratar, e também vincular aos seus quadros pelo menos um terço dos seus professores que respondam aos “perfis de competências” necessários para o desenvolvimento dos projectos em curso.

Um problema de “amiguismo"

Mas este é um ponto onde o consenso com os sindicatos parece ser impossível à partida, como reafirmaram vários dirigentes sindicais à saída dos encontros realizados nesta quarta e quinta-feira. “Defendemos o primado da colocação de professores pelo concurso nacional e pela sua graduação profissional, nunca defenderemos que a vinculação e mesmo a contratação de professores seja feita por contratação directa”, reafirmou o secretário-geral adjunto da Federação Nacional de Professores (Fenprof), José Costa. Este ponto será sempre rejeitado pela Fenprof e poderá “ser um problema” caso o ministro não recue na decisão, frisou.

Também o vice-secretário-geral da Federação Nacional da Educação, Pedro Barreiros, voltou a deixar claro que esta estrutura sindical “defende e defenderá sempre uma listagem nacional que apresente um modelo justo, transparente e reconhecido por todos”.

“Não concordamos, claramente, com aquilo que seja uma possibilidade de as direcções das escolas poderem contratar directamente um terço dos professores necessários para o quadro da escola.” Porquê? “Sabemos o país em que vivemos e sabemos aquilo que se passa em concreto em cada uma das escolas do nosso país. Sabemos os casos que temos com processos judiciais relacionados com amiguismo.”

João Costa insistiu, por seu lado, que este era o início de um “processo negocial”. O ME ainda não apresentou nenhuma proposta concreta aos sindicatos, mas apenas o que diz serem “pressupostos” para a alteração do actual modelo de recrutamento de professores. As negociações só prosseguirão no final de Outubro.

Levantamento das necessidades reais

Mas o ministro fez questão de sublinhar que nesta primeira ronda “praticamente todas as organizações sindicais expressaram a sua concordância com os pressupostos de base” de um trabalho que está agora a iniciar-se. Ou seja, continuou, “uma necessidade de valorização da carreira docente com o reforço da estabilidade dos professores, com redução da mobilidade no território, com uma fixação maior em quadros de escola sempre assentes também em algo que todas as organizações sindicais reconheceram como fundamental que é fazer um bom levantamento daquelas que são as necessidades reais e permanentes das escolas”.

João Costa indicou, a propósito, que o levantamento destas necessidades terá na base o recenseamento feito pela Universidade Nova e pela Direcção-Geral das Estatísticas da Educação e Ciência, a pedido do ME, que aponta para a necessidade de recrutamento de 34 mil novos professores até 2030 devido às aposentações em massa que acontecerão até lá.

O ministro destacou também por parte das organizações sindicais “uma concordância com aquilo que será já matéria dos próximos encontros que é a redução dos quadros de zona pedagógica (QZP), que têm uma extensão territorial muito grande e que faz com que os professores dentro da mesma zona tenham de se deslocar por muitos quilómetros”.

Quando vinculam, os professores começam por ficar afectos a estes Quadros de Zona Pedagógica, que muitas vezes têm uma dimensão superior a um distrito e que os obriga a dar aulas em escolas que podem distar mais de 60 quilómetros umas das outras.

Sobre a falta de professores que se faz sentir nas escolas, João Costa reconheceu que é algo que o “preocupa imenso” e por isso “o Governo tem estado, desde o início de funções, incansavelmente a adoptar medidas”. “Claro que cada aluno sem aulas, cada horário por preencher é uma preocupação grande para nós, mas a verdade é que são já 2000 horários que foram recuperados por estas medidas que têm vindo a ser adoptadas”, destacou.

Entre estas medidas conta-se a possibilidade que foi dada às escolas para contratarem professores que tenham apenas uma licenciatura pós-Bolonha, não tendo por isso a habilitação profissional que passou a ser condição para o exercício da profissão docente e que só é alcançada actualmente com os mestrados em ensino.

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