Israel não ficará “legalmente vinculado” por acordo nuclear com o Irão
Primeiro-ministro Naftali Bennett diz que o Estado hebraico não abdicará da sua “liberdade de acção”, mesmo que isso implique conflitos “com alguns dos nossos melhores amigos”.
A poucos dias de mais uma tentativa para relançar o acordo nuclear com o Irão, Israel avisou que não ficará “legalmente vinculado” com os compromissos que saírem das negociações entre as potências ocidentais e o Governo de Teerão.
“Mesmo que se regresse ao acordo de 2015, não faremos parte dele e não estaremos legalmente vinculados”, afirmou esta terça-feira o primeiro-ministro Naftali Bennett, enfatizando que Israel não abdicará da sua “liberdade de acção” no que ao Irão diz respeito.
As declarações de Bennett foram proferidas no mesmo dia em que o director-geral da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), Rafael Grossi, defendeu em Teerão o aprofundamento da cooperação com a República Islâmica.
“A agência quer continuar e aprofundar o diálogo com o governo do Irão. Concordámos em prosseguir o nosso trabalho conjunto sobre transparência”, disse Grossi, que chegou a Teerão na segunda-feira para manter conversações com o Governo iraniano sobre pontos que a AIEA considera “essenciais” para reactivar o acordo nuclear de 2015, tais como o tratamento dado pelas autoridades aos inspectores da agência e a reinstalação de câmaras nas instalações nucleares iranianas.
Teerão e Washington retomarão a 29 de Novembro, em Viena, as negociações indirectas, que estão suspensas desde Junho, para encontrar formas de fazer reviver o acordo nuclear, do qual o ex-Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, saiu há três anos, impondo duras sanções ao Irão.
Em resposta, o Irão fez tábua rasa dos limites estabelecidos pelo acordo assinado em 2015 com os países com assento no Conselho de Segurança da ONU, mais a Alemanha, e começou a enriquecer urânio com uma pureza de 60%, bem acima dos 3,67% impostos pelo acordo. No início do Novembro, Teerão anunciou que, no espaço de um mês, quase duplicou a quantidade de urânio enriquecido armazenada em menos de um mês, que seria agora de mais de 210 quilos a 20% e 25 quilos a 60%.
Apesar de o Irão negar que o enriquecimento de urânio tenha um objectivo militar, Israel vê o programa nuclear da República Islâmica como uma ameaça que tem de ser contida. “O Irão está numa fase muito avançada do seu programa nuclear e a sua capacidade de enriquecimento de urânio é maior e mais sofisticada que nunca”, disse Bennett numa conferência sobre defesa e segurança na Universidade Reichman, em Telavive, prometendo que “o erro” que Israel cometeu após a assinatura do acordo de 2015 “não se repetirá”.
“O momento em que o acordo foi assinado afectou-nos como um remédio para dormir. Israel adormeceu e distraiu-se com outras coisas. Mas aprendemos com esse erro”, afirmou o primeiro-ministro israelita, reafirmando a autonomia de Israel, mesmo que um eventual acordo venha a ser alcançado. “Manteremos a nossa liberdade de acção”, prometeu, mesmo sendo possível que venham a existir conflitos com “alguns dos nossos melhores amigos”.
“Israel é forte, bem-sucedido e aberto ao mundo”, argumentou Bennett, observando que o Irão se encontra actualmente “no seu ponto mais extremo desde 1979”, ano da Revolução Islâmica. “É um regime que nem sequer é capaz de dar água aos seus cidadãos. Água. Um regime com uma economia débil, com um governo corrupto que lidera pela força e pelo medo”, reforçou.
Na mesma conferência, também o ministro das Finanças israelita, Avigdor Lieberman, alertou para o perigo do programa nuclear iraniano: “Com acordo ou sem acordo, o Irão tornar-se-á numa nação nuclear e terá uma arma nuclear em cinco anos, no máximo.”
Houve também espaço para críticas ao primeiro-ministro no evento da Universidade Reichman. Tamir Pardo, antigo director da Mossad, acusou o Governo de Bennett de não ter uma estratégia para lidar com o Irão.
“A questão é se Israel tem uma estratégia em relação ao Irão, e eu acho que não tem. Parece-me que a tendência é que Israel volte ao que era antes”, afirmou Pardo, um crítico da política do anterior primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, de oposição total ao acordo nuclear, defendendo que, apesar de todas as suas debilidades, o compromisso assinado em 2015 possuía algumas vantagens.