110 Histórias, 110 Objectos: a primeira imagem do Técnico

O podcast 110 Histórias, 110 Objectos, do Instituto Superior Técnico, é um dos parceiros da Rede PÚBLICO.

No podcast 110 Histórias, 110 Objectos, um dos parceiros da Rede PÚBLICO, percorremos os 110 anos de história do Instituto Superior Técnico (IST) através dos seus objectos do passado, do presente e do futuro. Neste 19.º episódio do podcast, conhecemos a história da primeira imagem do IST.

“Você é o arquitecto que eu e o Conselho escolhemos. Portanto, só tenho um caminho a seguir: entregar-lhe o projecto para o Instituto ou confiar este trabalho a um arquitecto estrangeiro”. Terá sido com estas palavras, na inauguração estação ferroviária do Cais do Sodré, em 1928, que Duarte Pacheco (que foi director do IST e ministro das obras públicas e comunicações) convenceu o então jovem arquitecto e também professor do IST, Porfírio Pardal Monteiro, a desenhar aquilo que ainda hoje é o traçado base do campus da Alameda. “Ele [Duarte Pacheco] queria mostrar que o Técnico era uma instituição actual e que a sua arquitectura acompanhava essa modernidade”, conta João Pardal Monteiro, professor na Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa e sobrinho-neto de Porfírio Pardal Monteiro.

Foto
A primeira imagem do Técnico Débora Rodrigues

“O Técnico é de facto a primeira obra moderna de Portugal, a primeira que segue o movimento moderno, quer com os terraços, as janelas corridas, os pavilhões”, defende Ana Tostões, professora do Instituto Superior Técnico. “Falamos de um campus, de espaços verdes e espaços livres que vão criar esta atmosfera muito especial. Esta opção de fazer vários edifícios ligados por um espaço público verde é também muito pioneira para a época”, complementa. Nascia assim o “primeiro campus universitário de Lisboa, que resulta do pensamento crítico do Alfredo Bensaúde, que giza o programa de uma universidade baseada na ciência aplicada e que é única em Portugal”, aponta.

A “1.ª imagem do Técnico”, uma perspectiva desenhada por Porfírio Pardal Monteiro (também conhecido como “o arquitecto de Lisboa”) e colorida a aguarela por Fred Kradolfer, mostra um projecto muito semelhante àquilo que se veio a tornar o Instituto Superior Técnico, em Lisboa. “Os arquitectos na altura tinham essa sorte, faziam os projectos e poucas alterações lhes faziam. Eles discutiam muito antes, mas, quando faziam o projecto, o projecto ficava”, partilha João Pardal Monteiro. “Quase todas as intervenções [posteriores] tiveram o cuidado de deixar os pavilhões do Porfírio intactos”, acrescenta. No desenho do projecto vê-se uma cidade bem diferente da Lisboa de hoje. “Havia o Arco do Cego mas os prédios à volta não existiam. O Técnico acaba por chamar o que vem à volta”.

A estratégia de construção, que durou menos de uma década, passou por empregar o maior número de pessoas mas também de gastar o menor dinheiro possível. Não estranha que as oficinas tenham sido os primeiros edifícios a serem construídos no IST: “Foi possível empregar pessoas e fazer as coisas lá sem ter que pagar fora. O mobiliário, as portas, alguma serralharia foi tudo feito no Técnico”. Uma filosofia de poupança que deu também azo a mitos e histórias caricatas. A mais conhecida: as quatro casas de banho do pavilhão central do IST terão ficado com azulejos diferentes até ao final do século porque foram feitas com amostras pedidas a quatro companhias, que as haviam enviado para tentar ganhar o concurso. “Há esse mito. Eu não acredito nisso. Era impossível”, contrapõe Ana Tostões.

Foto

O edifício terá sobrevivido a tentativas posteriores de desmantelamento. “Chegou a pensar-se em deitar o Técnico todo abaixo e deixar só o edifício do Pavilhão Central como memória. De certo modo foi a razão de surgirem as Torres e o Pavilhão de Civil, como forma de manter o Técnico ali. O património ou se intervém e se usa, ou morre”, defende.

Para além de dar origem ao nascimento do edifício do IST, este desenho marcou o início de uma colaboração e amizade entre Pardal Monteiro e Duarte Pacheco, interrompida por um episódio que já se tornou famoso entre engenheiros e arquitectos: “Duarte Pacheco tinha a mania de riscar em cima dos desenhos dos arquitectos, que é uma coisa de que nenhum arquitecto gosta. Um dia estavam a discutir o arranjo de Vila Viçosa e o Porfírio levou-lhe o desenho emoldurado com um vidro. O Pacheco ficou furioso. A zanga tem coisas mais profundas do que isso, mais filosóficas, mas essa foi a gota de água”. Não chegaram a fazer as pazes, uma vez que Duarte Pacheco viria a morrer num acidente de automóvel, em 1943. Porfírio apenas teria oportunidade de lhe fazer um elogio fúnebre.

O podcast 110 Histórias, 110 Objectos é um dos parceiros da Rede PÚBLICO. É um programa do Instituto Superior Técnico com realização de Marco António (366 ideias) e colaboração da equipa do IST composta por Filipa Soares, Sílvio Mendes, Débora Rodrigues, Patrícia Guerreiro, Leandro Contreras, Pedro Garvão Pereira e Joana Lobo Antunes.

Siga o podcast 110 Histórias, 110 Objectos no Spotify, na Apple Podcasts ou em outras aplicações para podcast.

Conheça os podcasts da Rede PÚBLICO em publico.pt/podcasts.

Sugerir correcção
Comentar