O que nasceu primeiro: a galinha geneticamente modificada ou o ovo para uso farmacêutico?

Novogen White é uma espécie de galinha geneticamente modificada cujos ovos são utilizados pela indústria farmacêutica na produção de vacinas e medicamentos. O fotógrafo Daniel Szalai visitou uma das fábricas onde são produzidas em massa para esse fim, na Hungria, e levanta a questão: "Os benefícios para a espécie humana justificam a forma como tratamos estas galinhas?"

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As galinhas Novogen White são "peças vivas de tecnologia", descreve o fotógrafo Daniel Szalai. Fruto de manipulação genética, as que vivem na fábrica que Szalai visitou cumprem a missão de produzir, semanalmente, 120 mil ovos imaculados que serão utilizados pela indústria farmacêutica para a produção de vacinas e outros medicamentos de uso humano e animal. "Vivem num ambiente rigorosamente controlado, dentro de gaiolas", descreve na sinopse do projecto Novogen, desenvolvido entre 2017 e 2018, em exposição em Braga ao abrigo do Festival Internacional de Fotografia Encontros da Imagem. "Não sobreviveriam fora desse ambiente por não terem um sistema imunitário capaz de dar resposta." Nesta fábrica, quando a produção de ovos de uma galinha decresce ou perde qualidade, a mesma é morta por injecção letal. "A crueldade reside no facto de tudo decorrer através de processos automáticos que promovem um total desapego e que estão descritos, sucintamente, nos manuais de marketing da própria fábrica", explica o fotógrafo à Lens Culture.

A saúde de cada galinha Novogen White é controlada através de um chip que lhe foi colocado e cada ovo que põe é monitorizado com rigor por funcionários da fábrica. A sua alimentação é composta, estritamente, de alimento que evita o desenvolvimento de patologias. Nascem, crescem, põem ovos e morrem sem sair do interior de uma fábrica; e quando deixam de ser necessárias, são descartadas. "Elas são protagonistas numa indústria, o seu trabalho salva vidas e, no entanto, são invisíveis." Por considerar importante dar-lhes visibilidade, Szalai decidiu retratar, individualmente, 168 galinhas. "A sua produção em massa coloca questões ao nível da sua individualidade", reflecte o fotógrafo. "O facto de, à primeira vista, suspeitarmos que os retratos poderiam referir-se a apenas a uma galinha desvenda a forma como pensamos sobre estes animais. São tratados e conceptualizados como sendo produzidos em massa, cada um funcionando como uma pequena peça de uma unidade fabril, que existe apenas para produzir mais um produto, neste caso, o ovo."

O papel destes animais na indústria farmacêutica "coloca dilemas e questões vitais sobre a forma como o ser humano se relaciona com a natureza". Qual o preço a pagar - e por quem - por mantermos a nossa saúde e longevidade enquanto espécie? "Hoje, a galinha é vista como um produto e um símbolo de civilização, da sociedade globalizada. É uma criatura criada pelo ser humano que, em 70 anos, passou de animal num quintal a utilidade rica em proteína que alimenta o mundo inteiro. Representa, por isso, a fascinante intersecção entre natureza e tecnologia." Szalai questiona: "Deveria a humanidade ter o poder de instrumentalizar outros seres vivos? Os benefícios para humanos e outros animais justificam a forma como tratamos estas galinhas?" O fotógrafo acredita que, no fundo, "a galinha revela muito acerca de quem a criou nestes moldes" e que o seu projecto Novogen "pode ser, por isso, encarado como um retrato da própria humanidade".

©Daniel Szalai
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