A nova vida da cerveja Musa está cheia de Virtudes
A marca de cerveja artesanal emancipou-se e já tem um taproom fora da capital. No Porto, no privilegiado Passeio das Virtudes, já jorram as bicas de cerveja artesanal e “insensata”, a música emergente e comida gulosa sem talheres.
Foram quatro dias de festa para assinalar a abertura do espaço Musa no Porto, em pleno Passeio das Virtudes, com vista desafogada sobre um dos miradouros mais procurados da cidade, jardim de relva rala e a Ponte da Arrábida no horizonte. Ainda estão secas algumas das 15 bicas a saltar da parede e, apesar de ser segunda-feira e dia de ressaca, há música alto e bom som — Le Freak, CHIC só para aquecer — e um interessante rebuliço criativo pós-pandemia.
Abriu “finalmente” a Musa das Virtudes. “Parece milagre, mas é real”. O “hiato”, como lhe chama José Veríssimo, foi longo. Principalmente se tivermos em consideração que a primeira ameaça séria de a Musa sair da capital tinha sido lançada em Junho de 2019 com os Zen aos saltos e as Virtudes a rebentar pelas costuras. Agora, depois da fundação da Fábrica da Musa e da Musa da Bica em Lisboa, depois de uma exasperante pausa, estão escancaradas as portas da Musa perto da Árvore e daquele mural XL do Hazul que quer ser mais do que um espaço obrigatório para apreciadores de cerveja artesanal.
“Estamos numa das zonas do Porto onde faz sentido a Musa estar, um sítio agradável com capacidade para trazer gente. O Passeio das Virtudes tem imenso potencial, uma vista fabulosa e boa vizinhança”, resume José Veríssimo, responsável da área comercial de uma equipa com ligações umbilicais à cidade. “Queremos contribuir para o tecido da cidade. Queremos ser um projecto âncora e acreditamos muito que os novos valores trazem muito às cidades”, atira, enquanto nos serve uma Born in the Ipa, uma American ipa que é a bandeira desta “revolução”, que é feita de cerveja artesanal séria, mas sem se levar demasiado a sério, “atenta ao mundo e ao que nele se passa”.
“Ainda estamos em fase de ganhar terreno e de muita pedagogia num país que não tem muita cultura cervejeira”, assegura José Veríssimo. Mas a verdade é que estamos numa fase em que “já não é tão vulgar alguém perguntar ‘Musa, o que é isso?!'”.
A Musa foi criada para ter “cervejas distintas”, para “democratizar” o acesso à cerveja artesanal, como ao longo das décadas o fizemos com os vinhos. “Fico feliz quando chego a qualquer sítio e vejo uma cerveja artesanal. Acreditamos que temos que crescer todos juntos.” A Musa foi pensada para ser “descomprometida e acessível” e, de raiz, para ter uma componente muito ligada à música — Eye of the lager, Red Zeppelin, Born in the Ipa, Frank Apa, Peste & Sidra e Twist & Stout não são meras coincidências. “Fazemos festas porque gostamos e porque acreditamos que temos que aproveitar a vida e as coisas boas.”
Ao contrário de outras marcas de cerveja artesanal, sempre fez sentido que a Musa tivesse bares e “atraísse diferentes tribos”, que desenvolvesse eventos e criasse sinergias e que trabalhasse “as forças da cidade”, que desencantasse as suas musas, o rock'n'roll, as bandas emergentes, as pistas de dança e sobretudo o forrobodó, que é feito da conjugação de cerveja “simples”, música e uma miscelânea de coisas de comer à mão — mesmo sem talheres — criadas por “novos valores da cozinha portuguesa”, “malta nova que está a inovar”, “um bocadinho funky, um bocadinho de experimentação”, cozinha “de lamber os beiços”. A saber: Cristiano Barata, transmontano, João Baião, alentejano de mãe minhota, e Ana Leão, quase tanto do Porto como da Austrália, os chefes de serviço nas Virtudes autorizados a meter o bedelho no menu, que ameaça mudar ao ritmo da playlist.
É “uma mixórdia de temáticas espectacular e fabulosa”, sorri Ana “Leoa”, uma romã em cada mão, jovem cozinheira com 15 anos de experiência, uma road trip pela Austrália que durou dez anos e paragens no Dos Palillos e no elBulli. Há batata frita e há orelha frita, há sandes e sandochas (de bifada do cachaço, de biqueirão fumado e de bacalhau) e há um crescente número de alternativas vegetarianas e veganas, pão paratha com grão-de-bico, amba de dióspiro e romã, sande de queijo taleggio panado com couve kale e pickle de pêra rocha, espetada de couve e parte de marmelos. “Queremos que as pessoas venham cá e que continuem interessadas em voltar”, explica João Baião, que foi afinando a sua arte no 100 Maneiras, no Minerva Comporta, no Ela Canela, no ONA e mais recentemente ao serviço do projecto Vino Vero.
“Damos espaço a novas vozes. Não queremos estar cristalizados”, sublinha José Veríssimo. Fica a promessa: “Não vamos ficar por aqui.”