Começaram, novamente, as férias de Verão e desta vez não vou repetir a emergência do grito “Deixem os emigrantes em paz". Talvez porque depois da comunicação digital acentuada com a covid-19, das pessoas que regressaram em teletrabalho de Portugal para o estrangeiro e da entreajuda entre residentes-emigrantes, quero antes sussurrar em jeito de apontamento a importância de vermos as pessoas, sem barreiras.
Temos a tendência de ver o mundo na perspectiva "nós versus outros" e aqui, fora da nossa pele, cabem todos os preconceitos: seja contra migrantes, etnias, orientações sexuais, religiões, género/s, idades, cor de pele ou mesmo costumes. Tudo o que é diferente da nossa realidade mais imediata é alvo.
Encaixotamos sempre os outros porque é mais fácil, mais rápido e mais conveniente do que conhecer os desafios e vitórias da pessoa. Sobretudo, é um mecanismo para evitar o desconhecido, o medo da novidade e a incerteza – como se estivéssemos às escuras numa sala – e é sempre mais fácil seguir um sinal luminoso para sair, do que para saber onde acender a luz, para que todos possam ter oportunidade do mesmo.
Usando a analogia de acender a luz, ao acender “a minha sala pessoal”, quase como que uma coreografia em que vou vendo e experienciando o que se passa fora da minha pele, encontro palco para derrotar preconceitos que vão surgindo ao longo da vida e dos quais não estamos imunes. Não podemos é ser imunes à informação e dar asas à ignorância.
Quando reflicto na migração, penso sempre que na minha geração muitos emigraram, das gerações anteriores (pais, tios, avós) também muitos emigraram e nos mais jovens também muitos fazem o mesmo voo. Todos com sonhos, desejos, tragédias, desgostos, choros e risos, mas todos com uma certeza: emigrar significa procurar um local onde nos sintamos mais seguros e concretizados.
As diferentes gerações foram mudando, bem como o que tinham para oferecer/receber nesta experiência. Se as migrações eram usualmente encaradas como um corte pela distância e percepções culturais muito diferentes entre países, agora esse factor é minimizado. As pessoas tendem a procurar melhores condições laborais, de aceitação social, de pensar no bem-estar – dos próprios e dos que ficam – e é mais simples partilhar e fazer parte destas inúmeras dinâmicas dentro e fora do país, mesmo quando os regressos são marcados por férias.
A maioria não creio que regressa nas férias para ostentar “pimbalhice”, mas sim os símbolos, as memórias e os objectos que os fazem recordar o país de onde vieram. Se quisermos ver justamente esta questão, talvez devamos antes pensar no que a cultura portuguesa lhes transmitiu, no quão limitada era (e pode ser) numa pós-ditadura e aceitar o mix da interculturalidade como bênção da democracia.
Ver emigrantes com hábitos entre Portugal e o país onde vivem, ou línguas e gastronomia diferentes não é, de todo, mau, apenas o mundo a evoluir no sentido de aceitar a beleza que é partilhar. Boas férias!