ONU pede resposta “sistémica” contra o racismo e fim da “impunidade” da violência policial

Relatório das Nações Unidas investiga violações do Direito Internacional dos direitos humanos pela polícia, as respostas dos Governos a protestos pacíficos, a reparação das vítimas e as “desigualdades complexas” das comunidades negras.

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A morte de George Floyd motivou o movimento Black Lives Matter e o debate sobre a justiça racial e a violência policial rui gaudencio

A Alta-Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, pediu esta segunda-feira à comunidade internacional para responder de forma “sistémica” contra o racismo. O apelo surge na sequência do relatório da ONU que analisou a justiça racial, reconhecendo a “impunidade” dos agentes policiais que violam os direitos das pessoas afrodescendentes e as “desigualdades complexas” que as pessoas com descendência africana enfrentam.

A análise foi iniciada em Junho de 2020, pouco depois da morte de George Floyd, a 25 de Maio, para compreender o racismo sistémico contra os afrodescendentes. Foram investigadas violações do Direito Internacional dos direitos humanos por agentes policiais, respostas dos Governos a protestos pacíficos contra o racismo, tal como a responsabilização e reparação das vítimas.

Cerca de 190 mortes em todo o mundo foram analisadas e foi concluído que os agentes policiais raramente são responsabilizados por matarem pessoas negras, em parte devido a investigações insuficientes e à incapacidade de reconhecer o impacto do racismo estrutural.

Uma das mortes analisadas é o caso de Kevin Clarke, que morreu depois de ter sido detido pela polícia em Londres, em 2018. No inquérito realizado sobre a morte de Clarke, que tinha sido diagnosticado com esquizofrenia paranóide em 2002, o júri considerou que a forma inadequada como a polícia conteve Clarke contribuiu para a sua morte.

Outros casos incluem Luana Barbosa dos Reis Santos e Pedro Matos Pinto no Brasil, George Floyd e Breonna Taylor nos Estados Unidos, Janner García Palomino na Colômbia e Adama Traoré em França. As conclusões revelam “padrões e semelhanças surpreendentes” por todo o mundo.

O documento analisa ainda as “desigualdades complexas” e a “acentuada marginalização política e socioeconómica” que afecta afrodescendentes em muitos países. Em especial “a desumanização de pessoas afrodescendentes (…) reforçou e fomentou a tolerância da discriminação racial, desigualdade e violência”, refere o texto.

Segundo a análise, na América do Norte e do Sul da Europa é “desproporcional o número de afrodescendentes que vivem em pobreza e que enfrentam graves obstáculos no direito à educação, à segurança sanitária, ao emprego, a uma habitação adequada e acesso a água potável”. Do mesmo modo, enfrentam restrições à participação “na vida pública e exercício de outros direitos humanos fundamentais”, continua.

Michelle Bachelet, que liderou o relatório, descreveu o status quo como “insustentável”. “O racismo sistémico precisa de uma resposta sistémica: é necessária uma abordagem compreensiva, ao invés de uma abordagem fragmentada, para desmantelar sistemas de discriminação e violência que foram consolidados durante séculos”, disse.

A Alta-Comissária salientou ainda o sistema “desolador” que não apoia as vítimas e familiares e alertou para a “excessiva vigilância de que são objecto as pessoas e comunidades negras, que as faz sentir ameaçadas em vez de protegidas”.

Por isso, Bachelet apela a “todos os Estados membros a pararem de negar, e começarem a desmantelar o racismo, a terminarem com a impunidade e construírem confiança, a ouvirem as vozes das pessoas com descendência africana, a confrontarem os legados do passado e repararem o seu impacto”.

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