Morreu o compositor e maestro espanhol Cristóbal Halffter
Músico tinha 91 anos e uma carreira que privilegiou a experimentação, sem nunca esquecer a música do passado.
Cristóbal Halffter, um dos mais importantes compositores e maestros da cena artística espanhola, morreu domingo no castelo de Villafranca Del Bierzo (província de Léon), aquela que foi a sua casa durante boa parte da vida.
Nos obituários que esta segunda-feira lhe dedica a imprensa espanhola merece elogios pela sua capacidade de conciliar tradição e vanguarda, criando uma música verdadeiramente universal.
Cristóbal Halffter nasceu em 1930 numa família de músicos que tinha nos seus tios, Ernesto, um dos alunos favoritos do compositor Manuel de Falla, e Rodolfo, as principais referências.
Aos 17 anos, já regressado a Madrid depois do exílio durante a Guerra Civil de Espanha (1936-39) — mudou-se com os pais para a Alemanha nazi, onde frequentou os primeiros anos de escola, daí o seu alemão fluente —, Halffter deu início aos seus estudos no Real Conservatório de Madrid, tendo o compositor Conrado del Campo por mestre.
Nas aulas de Del Campo, o jovem músico não tinha acesso à produção artística das vanguardas que tanto o entusiasmavam e, por isso, começou a procurar outras sonoridades por conta própria, estudando Igor Stravinsky, Béla Bartók, Arnold Schönberg ou Alban Berg.
Lembra o diário El País que Halffter terminou o curso em 1951, no mesmo ano em que começa a fazer-se notar a geração fundadora da música contemporânea espanhola, de que aliás faz parte, composta por nomes como Luis de Pablo, Ramón Barce, Josep Soler, Román Alís ou Carmelo Bernaola (conhecida como Geração de 51, bem a propósito).
Entre as suas primeiras obras, que já denotam o seu desejo permanente de experimentar, estão Antífona Pascual (a estreia, em 1952), Concierto para piano y orquesta (1953) e Tres piezas para cuarteto de cuerda (1955).
O trabalho de composição, em que combinava técnicas de vanguarda com elementos tradicionais espanhóis ou com a música do Renascimento e do barroco, fê-lo acumulando, entre 1955 e 1963, com a direcção da Orquestra Falla.
Um pé na literatura
Passariam quase 50 anos até que Cristobál Halffter se estreasse na ópera, apresentando o seu Quijote, baseado na obra eterna de Miguel de Cervantes, no palco do Teatro Real, em Madrid, com o prazer acrescido de ter um dos seus filhos, Pedro, a dirigir a orquestra. A este Quijote lírico seguiram-se outras obras com um pé na literatura como Lázaro e, já em 2013, La novela del ajedrez.
As outras expressões artísticas, fosse na da pintura ou a na poesia, eram presenças habituais no seu universo de criação. Em Pinturas Negras homenageia Goya, por exemplo, e em Elegía a la muerte de tres poetas españoles faz a vénia a Antonio Machado, Federico García Lorca e Miguel Hernández.
Com uma carreira em Espanha e fora de Espanha, sobretudo em França e na Alemanha, é de sua autoria a cantata com que as Nações Unidas celebraram os 20 anos da Declaração Universal dos Direitos do Homem, Yes, speak out (1968).
“Halffter deixa também uma herança silenciosa, mas igualmente poderosa; era um homem de uma grande preocupação social e intelectual, com uma grande profundidade de pensamento”, escreve o ABC, citando em seguida uma das frases-programa do compositor, dita numa entrevista a este diário em 1993: “Pediremos aos gritos silêncio para poder desfrutar da música.”
Na sua lista de encomendas encontram-se prestigiadas orquestras estrangeiras, como a Sinfónica de Baden-Baden e a Filarmónica de Berlim, ambas na Alemanha.