Coronavírus
“Incrivelmente alto”: como se fotografa a ansiedade em confinamento?
Ao longo do primeiro confinamento, Beatriz Pequeno começou a pensar como seria fotografar a ansiedade. O resultado são dez fotografias que desconstroem o processo: desde a altura em que é um tema estranho, até à altura em que é aceite.
“São três da manhã e a casa está silenciosa, a rua está parada, a noite está sossegada e, ainda assim, está tudo incrivelmente alto. Há perguntas sem respostas e muitas hipóteses de coisa nenhuma. O que é isto?” A resposta à pergunta de Beatriz Pequeno, 26 anos, surge num conjunto de dez fotografias sobre ansiedade, tiradas ao longo de 2020. “Veio da urgência de encontrar uma resposta ao que fui sentindo durante os primeiros meses de confinamento”, explica a jovem, formada em Biologia, que, à semelhança de muitos outros portugueses, foi enviada para casa em Março de 2020, deixando em pausa o trabalho como educadora ambiental no Centro Pedagógico do Jardim Zoológico de Lisboa e numa geladaria da cidade.
A vontade de “fotografar a ansiedade” tornou-se uma distracção e projecto final do Curso Profissional de Fotografia do Instituto Português de Fotografia (IPF) que, em 2018, começou a tirar em regime nocturno. Em Fevereiro de 2021, deveria ser um dos vários trabalhos em exposição na Galeria Arte Graça, em Lisboa.
“Ao longo do tempo em que estive confinada no meu quarto em Lisboa, quis perceber aquilo que se passava com o meu corpo e de que forma é que as outras pessoas também sentem a ansiedade e a vêem”, detalha a fotógrafa que criou a série de imagens com base em vários inquéritos e conversas com uma psicóloga. “Fui entendendo que mais pessoas iam sentindo aquilo que seriam os efeitos do confinamento — ansiedade, angústia e insónia.”
O resultado são dez fotografias que desmontam o processo da ansiedade: desde a altura em que é um tema estranho, desfocado e longe (começo da série), até à altura em que a pessoa aceita e aprende a lidar com ela. “Há um processo de descoberta e introspecção sobre o que é a ansiedade”, resume.
Agora que o país enfrenta o segundo confinamento, Beatriz Pequeno espera que as fotografias ajudem a iniciar conversas. “Há muitas pessoas que sofrem de ansiedade e não conseguem perceber que é ansiedade, ou não querem admitir. É importante as pessoas serem ouvidas e retratadas”, sublinha. “Se, mais tarde, esta série servir para entender todos aqueles que também passam pelo mesmo e por transmitir compreensão, então sentirei que o meu trabalho fez ainda mais sentido.” E reforça: “Mesmo que as pessoas estejam confinadas, não quer dizer que estejam sozinhas.”