Costa do Marfim: reeleição do Presidente confirmada depois da prisão dos principais opositores

Teme-se uma escalada de violência no país, depois de umas eleições que a esmagadora maioria da oposição boicotou e cujos resultados não reconhece. Muitos marfinenses já fugiram para países vizinhos, diz a ONU.

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O Conselho Constitucional confirmou o resultado das eleições e a vitória de Alassana Ouattara LEGNAN KOULA/EPA

Depois de umas eleições marcadas pelo boicote em bloco da oposição e por episódios de violência que fizeram dezenas de mortos, o Conselho Constitucional da Costa do Marfim validou esta segunda-feira sem surpresas a reeleição do Presidente Alassana Ouattara para um terceiro e já muito contestado mandato. Segundo este órgão, não houve “nenhuma irregularidade grave” nas urnas tida em conta para o apuramento dos resultados – a oposição impediu que a votação se realizasse em 5000 assembleias de votos.

Ouattara, de 78 anos, obteve assim 94,27% dos votos nas presidenciais de 31 de Outubro, sendo “proclamado eleito à primeira volta”, como anunciou o presidente do Conselho Constitucional, Mamadou Koné, em declarações ao país a partir de Abidjan. De acordo com este responsável, não só não se registaram irregularidades como não foi apresentada “nenhuma reclamação”.

Mamadou Koné falou como se as eleições tivessem decorrido com toda a normalidade e o país aguardasse tranquilamente a divulgação dos resultados. Mas a realidade é bem diferente. Ouattara, no poder desde 2010, acabou com meses de especulação sobre a possibilidade de tentar alargar a sua permanência no cargo em Março, altura em que garantiu que não seria de novo candidato. Só que alterou a posição em Agosto, quando o sucessor que escolhera, o primeiro-ministro Amadou Gon Coulibany, morreu inesperadamente.

A Constituição do país estipula um limite de dois mandatos presidenciais, mas Ouattara insistiu que essa contagem não deve começar em 2010, mas em 2016, altura em que actual Constituição foi aprovada. Uma interpretação apoiada pelo Conselho Constitucional que não convence nem opositores nem muitos marfinenses.

Como se esperava, a oposição recusa reconhecer os resultados de umas eleições que considera inconstitucionais e pouco depois da votação anunciou a criação do Conselho Nacional de Transição, um governo paralelo. Uma dezena de opositores foram em seguida acusados de terrorismo e sedição: no sábado, as autoridades confirmaram a prisão de Pascal Affi N’Guessan, porta-voz do campo que se opõe a Ouattara, e antigo primeiro-ministro, ao mesmo tempo que o actual líder da oposição, o ex-Presidente Henri Konan Bédié, está detido na sua própria casa, em Abidjan, vigiado por forças de segurança.

Dez anos depois

As presidenciais disputaram-se num contexto de enorme tensão – desde que Ouattara confirmou que se recandidatava, perto de 40 manifestante morreram em confrontos entre apoiantes dos dois campos políticos e entre estes e as forças de segurança; já durante e depois da votação, a violência provocou pelo menos 14 mortos.

Segundo as Nações Unidas, há uma semana já 3200 marfinenses tinham fugido da violência para a Libéria, o Togo e o Gana.

Os receios de uma escalada são muitos, num país ainda a recuperar da guerra em que se transformou a crise pós-eleitoral de 2010, e que nos meses seguintes fez 3000 mortos. Ouattara foi eleito precisamente nessas presidenciais e acabaria por tomar posse em Maio de 2011, seis meses depois do anterior chefe de Estado, Laurent Ghagbo, ter recusado deixar o lugar.

O regresso de Ghagbo

Curiosamente, Laurent Gbagbo, que entretanto foi julgado por crimes contra a humanidade no Tribunal Penal Internacional, de Haia, e absolvido em Janeiro do ano passado, está agora a tentar mediar a crise, apelando ao diálogo. Já em Setembro, Gbagbo tinha assinado com Bédié (e outros ex-dirigentes da Costa do Marfim) um manifesto em que punha em causa as condições democráticas para a realização destas eleições.

O anterior Presidente dissera que não falaria sobre a situação política até regressar ao seu país, mas poucos dias antes da votação deu uma entrevista à TV5 Monde a partir de Bruxelas, onde explicou ter decidido falar por causa do “desastre” que via aproximar-se. “Vejo que os confrontos nos vão conduzir ao abismo. Como ex-Presidente da República, não seria responsável ficar quieto”, afirmou. E referindo-se à crise que o afastou do poder, defendeu que “as pessoas têm de se sentar para discutir e negociar, ainda há tempo”.

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