StayAway Covid obrigatória? Não concordo

E se todos somos parte da solução para este problema, e até aqui estamos de acordo, é não só difícil como impossível compreender a imposição da instalação da StayAway Covid em contexto laboral, escolar, académico e nas forças armadas e de segurança.

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MIGUEL MANSO

Liberdade, sempre a liberdade, acima de tudo a liberdade. Por uma questão de princípio, ou não tivesse sido esta a premissa governamental desde que a StayAway Covid foi disponibilizada para as plataformas móveis.

Infelizmente, os tempos e os ventos não correm de feição para a liberdade, antes pelo contrário. Porquê? Porque os números não param de subir. Porque o vírus está à solta. Por não haver solução à vista. Nem capacidade de testagem de populações inteiras. Nem um sistema de rastreio capaz de acompanhar tal processo. Nem camas suficientes nos hospitais. Nem exércitos de profissionais em quantidade suficiente para acudir a todos os pacientes e convalescentes.

E se todos somos parte da solução para este problema, e até aqui estamos de acordo, é não só difícil como impossível compreender a imposição da instalação da StayAway Covid em contexto laboral, escolar, académico e nas forças armadas e de segurança.

Para já, porque nem toda a gente tem um telemóvel esperto, e nem todos os telemóveis espertos têm a capacidade e/ou modernidade necessárias para a instalação de tal software. Infelizmente, a resposta governativa, inclemente, já está de dedo apontado e pronto a disparar: quem não tiver a aplicação está sujeito a uma multa de 500 euros. Culpados? Sim, da nossa miséria, da nossa pobreza, de vivermos nos antípodas de dirigentes incapazes de compreender e vivenciar a vida e as dificuldades do cidadão comum.

Depois, porque ao violar o princípio ético da voluntariedade de instalação de aplicações móveis, não estamos senão a criar uma rampa de lançamento para que apps como a StayAway Covid passem a ser centralizadas, mas não só, com acesso aos dados GPS de cada cidadão num mundo tão “orwelliano” como distópico, uma realidade já existente em países como a Coreia-do-Sul ou a China. Que mundo queremos criar? Para nós, para os nossos filhos.

Dizem estarmos perante um dilema, mas o dilema não existe, é um golpe publicitário. Não, não prescindiremos da nossa liberdade para combater uma pandemia enquanto as economias ocidentais insistirem em resgatar bancos e amigos falidos ao invés de populações em apuros, desviando fundos da educação, justiça, saúde e segurança social, privatizando serviços, transportes, meios de comunicação, recursos naturais, preterindo a nossa saúde, o nosso futuro, a nossa vida em nome da finança, mas nunca a nossa, a deles.

Ao impor nos nossos ombros a responsabilidade do rastreio de um vírus, ao tomar medidas tão incompreensíveis como desesperadas, o Governo não está a apenas a sacudir toda e qualquer culpa de quanto venha a correr mal, está também a assumir a certeza do desastre que se avizinha. Se tudo correr mal, a culpa é nossa por nos termos recusado a instalar a aplicação. Mas nem por isso do Governo, nem por isso de todos os governos precedentes, nem por isso de 46 anos de delapidação do Estado em nome próprio.

E por aqui se percebe terem os hospitais nomes de santos. Deus nos acuda, literalmente, porque o Governo não nos pode acudir, e este 3310 que trago no bolso também não, senhor guarda. Veja lá se a aplicação cabe aqui, já tirei a bateria, já abri o telemóvel todo e nada, nem aplicação, nem nada, só mensagens, só chamadas e o Snake para aquela viagem de hora e meia em pé, no autocarro lotado às 6h30 da margem sul para Lisboa.

Está a chover. E o pára-arranca é o prenúncio das nossas vidas e dos 40 anos seguintes. Nunca saímos do mesmo lugar. Mesmo se um dia tivemos emprego. Agora nem isso. Só uma aplicação, e nem a quisemos instalar.

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