Telemóveis mostram como casinos de Las Vegas são pólo de infecção para a covid-19

O alerta é da organização de jornalismo de investigação ProPublica que usou dados de localização de 26 mil telemóveis (com aplicações de meteorologia e fitness activas) para perceber a evolução da pandemia da covid-19 nos Estados Unidos.

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Em teoria, deve-se usar máscara ou viseira nos espaços públicos de Las Vegas Steve Marcus/Reuters
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Steve Marcus/Reuters

Os casinos de Las Vegas, nos Estados Unidos, tornaram-se num dos grandes pólos de infecção de covid-19 no país desde que reabriram no início de Junho. A conclusão é da ProPublica, uma organização norte-americana de jornalismo de investigação que, além de entrevistar vários epidemiologistas e trabalhadores de casinos, pediu a empresas de análise de dados para traçar os percursos realizados por 26 mil telemóveis que foram utilizados em Las Vegas em meados de Julho.

O objectivo era perceber se os estabelecimentos de Las Vegas ― outrora uma das localizações preferidas para passar férias ou escapadelas de fim-de-semana ―estavam entre os motivos que levam os Estados Unidos a serem incapazes de conter a propagação do vírus. Ao todo, os casos no país aumentaram mais de 10 vezes nas cinco semanas desde que os casinos reabriram.

“Milhares dos visitantes de Las Vegas deslocaram-se por todo o país”, resume a equipa da ProPublica nos resultados da investigação publicada esta terça-feira.

Em apenas quatro dias, de entre 26 mil telemóveis com serviços de localização activos em Las Vegas, 3,700 foram também detectados no sul da Califórnia, 2,700 no estado do Arizona, 1000 no Texas, mais de 800 nos estados de Illinois, Wisconsin e Ohio, e 100 na região de Nova Iorque.

Para chegar aos dados, a ProPublica juntou-se à analista de dados Tectonix e à empresa X-Mode que recolheu dados anónimos de utilizadores de smartphones que usaram aplicações de desporto e meteorologia durante um fim-de-semana de Julho em Las Vegas. Muitas vezes, estas aplicações pedem acesso à localização dos dispositivos para darem direcções, medirem as distâncias percorridas pelos donos dos telemóveis ou mostrarem informação geográfica pertinente.

Casinos são “oportunidade” para o vírus

Os epidemiologistas contactados pela ProPublica corroboram a tese de que os casinos estão entre as causas do actual surto de covid-19 nos EUA. 

“[Com os casinos] há uma oportunidade séria para espalhar o vírus, especialmente por pessoas que estão moderadamente doentes ou que não sabem que estão doentes”, explicou Crystal Watson, uma investigadora sénior na Universidade de Johns Hopkins que lembra que até 40% das pessoas infectadas com o novo coronavírus não apresentam sintomas. 

“As pessoas têm sido altamente móveis e, como resultado, é lógico que vemos uma continuação do surto”, reforçou o epidemiologista Oscar Alleyne. 

Alleyne, que é um dos responsáveis pela associação de oficiais de saúde de cidades e municípios (NACCHO na sigla inglesa), acredita que os dados mostram que as viagens até Las Vegas podem estar a acelerar a propagação da covid-19 no país. Mais de um milhar de visitantes passaram pelo aeroporto de Las Vegas desde que os casinos reabriram (um quarto dos valores de 2019).”Com a pressa de reabrir e repor as actividades económicas, tudo o que temos feito é espalhar e ampliar o alcance desta doença”, frisou o epidemiologista.

A realidade dos casinos torna difícil o rastreio de contágio tradicional, em que os profissionais de saúde entrevistam pessoas recentemente diagnosticadas com covid-19 para perceberem os locais por onde passaram e as pessoas com quem estiveram em contacto próximo. Muitos dos visitantes de Las Vegas não têm a certeza da identidade ou número de pessoas com quem contactaram.

Uma solução possível seria implementar uma forma de rastreio automática com telemóveis a avisar os donos, anonimamente, quando estiveram em contacto com pessoas infectadas com o novo coronavírus. Apesar de existirem várias aplicações do género a serem desenvolvidas em todo o mundo, incluindo nos Estados Unidos e em Portugal, a adesão tem sido fraca nos países democráticos

Os responsáveis pelos casinos de Las Vegas insistem que se estão a esforçar por detectar visitantes infectados com a covid-19. A rede MGM Resorts Internacional (dona de hotéis e resorts populares como o Bellagio, o Aria e o Mandalay Bay) explica que as pessoas que passam por aqueles espaços devem avisar os estabelecimentos, por email, se forem infectados com o novo coronavírus.

Máscaras, viseiras e álcool gel fazem parte da nova realidade dos casinos nos EUA Steve Marcus/Reuters
Máscaras, viseiras e álcool gel fazem parte da nova realidade dos casinos nos EUA Steve Marcus/Reuters
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Máscaras, viseiras e álcool gel fazem parte da nova realidade dos casinos nos EUA Steve Marcus/Reuters

A organização dos casinos também mudou: há um limite de visitantes, as máquinas estão mais afastadas, e há várias estações com álcool gel e sabão nos salões de jogo. Além disso, o governante do Estado de Nevada decretou que as pessoas que frequentem casinos devem usar máscaras.

A investigação da ProPublica, porém, também cita vários trabalhadores que se queixam que os casinos não os estão a proteger, nomeadamente, ao obrigá-los a trabalhar mesmo com sintomas. Parte do problema, argumentam alguns especialistas, é a discrepância nas regras em vigor nos Estados Unidos com locais que promovem o distanciamento social e o uso de máscara, e outros em que não é visto como necessário.

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