Ser médico no século XXI
Na Escola de Medicina da Universidade do Minho acreditamos que ao transformar o ensino da Medicina nos colocamos ao serviço de quem precisa de nós! Assim se constrói uma sociedade mais culta, mais feliz e mais saudável.
A prática da medicina sempre foi, é e será um exercício de serviço. Serviço aos que precisam de ajuda médica; serviço aos que querem manter a sua saúde. Serviço hoje, serviço amanhã.
Servir hoje já é um desafio, mas preparar para servir no futuro é ainda mais complexo porque carece de uma formação adequada que antecipe as necessidades do futuro. Como tal, antecipar (o melhor possível) as necessidades dos sistemas de saúde em 2050 é o desafio da educação médica em 2020. E como acredito que “a melhor forma de prever o futuro é criá-lo – citação atribuída a Abraham Lincoln –, tentemos construir esse futuro a partir de hoje.
A formação médica inovadora centra-se na aquisição das competências clínicas “clássicas” – que se encontram em permanente mutação –, mas também de um conjunto de “novas” competências que assegurem clínicos preparados para enfrentar os desafios societais, demográficos, climáticos e tecnológicos do futuro. No primeiro grupo contam-se, por exemplo, sólidos conhecimentos acerca dos mecanismos das diferentes patologias ou a capacidade de efetuar corretamente gestos técnicos e de comunicar de forma eficaz com doentes, cuidadores e outros profissionais de saúde. No segundo, contam-se competências em áreas de interseção de conhecimentos, como a “investigação (bio)médica”, “inteligência artificial”, “medicina digital”, “data science”, “robótica”, “gestão na saúde”, “tecnologias na saúde”, mas também competências de “liderança”, “empreendedorismo”, “segurança e qualidade do doente”, “novos desafios bioéticos” ou “trabalho em equipa”. A criação de um ecossistema que permita a aquisição destas competências, transversais e interdisciplinares sem comprometer a aquisição das competências centrais na medicina é um enorme desafio. Porventura, o maior desafio da Escolas Médicas e das comunidades formativas de vanguarda.
Na Escola de Medicina da Universidade do Minho, encaramos este desafio de forma inovadora. Em alinhamento com a nossa missão – “melhorar os cuidados de saúde, através da formação, geração de conhecimento e de valor” –, construímos uma visão clara, onde se “concretiza a ambição de cada pessoa, através de um modelo educacional transformativo de referência, num cluster aberto de investigação e inovação que antecipa o futuro da saúde”. E, no domínio da formação médica pré-graduada, isto corporiza-se num novo curriculum – MinhoMD – que tem por base quatro pilares (ciências biomédicas, ciências clínicas, ciências dos sistemas de saúde e humanidades em medicina).
Estes pilares convergem em ciclos de formação obrigatórios onde as competências dos diferentes saberes (saber cognitivo, saber fazer e saber estar) são trabalhados por metodologias ativas (ensino baseado em casos, laboratórios ativos) que promovem o contacto precoce com a clínica e o raciocínio clínico (os tópicos clínicos são apresentados por sintomas e problemas clínicos) e são consolidados por uma avaliação ao serviço da aprendizagem. Estes ciclos são agregados através da construção de um perfil próprio para cada estudante e pela liberdade de escolha de opções (com a duração cumulativa de um ano letivo completo). Aqui, cada estudante tem uma oportunidade única de adquirir um conjunto de competências complementares, mas que acreditamos serem críticas, para o seu desenvolvimento profissional futuro.
A organização destas opções foi desenhada como um espaço de liberdade para o estudante, garantindo uma formação personalizada onde navega entre diferentes oportunidades de formação que façam sentido para a construção do seu perfil profissional. Após escolha de um conjunto de cursos curtos no início do segundo ano da formação médica, o estudante propõe ao corpo docente uma série de ações formativas; estas podem ocorrer no contexto da Universidade do Minho ou fora dela, podem estar organizadas de forma livre ou conducente a grau (majors e minors), podem ter coerência temática ou permitir experiências distintas. E sempre como complemento a uma sólida formação (bio)médica, que transforma cada estudante num médico competente.
Acreditamos que ao transformar o ensino da Medicina nos colocamos ao serviço de quem precisa de nós! Assim se constrói uma sociedade mais culta, mais feliz e mais saudável.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico