Japão: a pandemia ameaça a sobrevivência da tradição gueixa

A Reuters acompanhou as gueixas do bairro de Akasaka, em Tóquio, que garantem ter perdido 95% dos clientes em resultado da imposição de medidas de distanciamento que condicionam a sua performance.

Mayu ajusta o kimono de Koiku, que usa máscara de protecção nos momentos que antecedem a sua performance, num restaurante de luxo Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
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Mayu ajusta o kimono de Koiku, que usa máscara de protecção nos momentos que antecedem a sua performance, num restaurante de luxo Kim Kuyng-Hoon|REUTERS

Embora o declínio da tradição gueixa, no Japão, esteja em curso há já várias décadas, nunca como hoje a sua sobrevivência esteve tão ameaçada. A pandemia de covid-19 diminuiu a procura dos seus serviços e obriga as artistas — conhecidas pelas suas suas elegantes conversas, pela beleza e aptidões nas artes tradicionais japonesas — a novos cuidados, que condicionam movimentos. "Quando nos sentamos perto dos clientes, conseguimos transmitir sentimentos, a nossa paixão transparece", explicou à Reuters a experiente gueixa Ikuko, de 64 anos. "Quando estamos a dois metros de distância, a conversa esmorece."

São cada vez menos as mulheres que dedicam a vida à aprendizagem da arte gueixa e, simultaneamente, devido às actuais medidas de prevenção de contágio, cada vez menos aqueles que estão dispostos a partilhar com elas um espaço fechado — a Reuters aponta para uma quebra de 95% na procura. Por esse motivo, Ikuko e as suas 20 colegas gueixas estão sem trabalho há vários meses. As que continuam, esperadicamente, a trabalhar fazem-no seguindo novos regulamentos. Deixou de ser permitido que sirvam as bebidas nos copos dos clientes, que lhes toquem e se sentem a uma distância inferior a dois metros. As máscaras de protecção não são obrigatórias devido à complexidade do traje tradicional, que inclui o uso de peruca. 

Também o processo de maquilhagem se tornou mais difícil. Mitsunaga Kanda, que dedica, há décadas, a sua vida à elaborada maquilhagem das gueixas, afirma que foi praticamente forçada a interromper o trabalho, devido à falta de procura. "[Quando maquilho uma gueixa,] toco na sua pele e nas suas caras, em todos os locais visíveis, e mesmo que não conversemos a essa curta distância, continuamos a estar muito próximas — algo que só agora percebemos que acontece."

Há 30 anos, o bairro de Akasaka tinha 120 gueixas; hoje, em toda a capital japonesa existem apenas 230. Ikuko, que é gueixa desde que chegou a Tóquio, em 1964, está preocupada com o futuro desta arte. "Estamos, hoje, a viver o pior momento", lamenta. "Como é que vamos ultrapassar isto? Teremos de sacrificar corpo e alma para tornar isso possível."

Ikuko, que é gueixa há várias décadas, chegou a Tóqui em 1964. As fotografias foram tiradas no interior da sua casa.
Ikuko, que é gueixa há várias décadas, chegou a Tóqui em 1964. As fotografias foram tiradas no interior da sua casa. Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Ikuko sentada diante do espelho, na sua sala de estar. Prepara-se para sair, irá actuar num restaurante de luxo, em Tóquio.
Ikuko sentada diante do espelho, na sua sala de estar. Prepara-se para sair, irá actuar num restaurante de luxo, em Tóquio. Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
As gueixas Koiku e Maki limpam a casa de Ikuko antes do almoço
As gueixas Koiku e Maki limpam a casa de Ikuko antes do almoço Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Koiku, Mayu, Maki e Ikuko almoçam juntas na casa de Ikuko
Koiku, Mayu, Maki e Ikuko almoçam juntas na casa de Ikuko Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Koiku pinta o corpo da gueixa Mayu, enquanto se preparam para o trabalho no restaurante de luxo.
Koiku pinta o corpo da gueixa Mayu, enquanto se preparam para o trabalho no restaurante de luxo. Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
A gueixa Ikuko prepara-se, em casa, para a sua performance no restaurante de luxo
A gueixa Ikuko prepara-se, em casa, para a sua performance no restaurante de luxo Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Koiku, Maki e Ikuko entram no taxi em direcção ao restaurante onde irão trabalhar
Koiku, Maki e Ikuko entram no taxi em direcção ao restaurante onde irão trabalhar Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
As gueixas Koiku e Mayu entram num restaurante de luxo, em Asada, onde alguns clientes estão a dar uma festa e onde irá decorrer a sua performance
As gueixas Koiku e Mayu entram num restaurante de luxo, em Asada, onde alguns clientes estão a dar uma festa e onde irá decorrer a sua performance Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
A gueixa Koiku usa máscara de protecção para o retrato da Reuters
A gueixa Koiku usa máscara de protecção para o retrato da Reuters Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Gueixas ajudam Koiku a colocar a máscara de protecção para o retrato da Reuters, no interior do restaurante de luxo.,Gueixas ajudam Koiku a colocar a máscara de protecção para o retrato da Reuters, no interior do restaurante de luxo.
Gueixas ajudam Koiku a colocar a máscara de protecção para o retrato da Reuters, no interior do restaurante de luxo.,Gueixas ajudam Koiku a colocar a máscara de protecção para o retrato da Reuters, no interior do restaurante de luxo. Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
As gueixas Koiku, Maki, Ikuko e Mayu ensaiam antes da chegada dos clientes ao restaurante de luxo onde trabalham.
As gueixas Koiku, Maki, Ikuko e Mayu ensaiam antes da chegada dos clientes ao restaurante de luxo onde trabalham. Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Clientes de restaurante onde decorreu a performance usam máscaras de protecção contra a covid-19
Clientes de restaurante onde decorreu a performance usam máscaras de protecção contra a covid-19 Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Mayu, Maki e Koiku praticam dança numa aula destinada a gueixas
Mayu, Maki e Koiku praticam dança numa aula destinada a gueixas Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Maki, Mayu, Koiku e Ikuko usam máscaras de protecção após participarem numa aula de dança
Maki, Mayu, Koiku e Ikuko usam máscaras de protecção após participarem numa aula de dança Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai, desce as escadas do seu estúdio, em Tóquio,Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai, desce as escadas do seu estúdio, em Tóquio
Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai, desce as escadas do seu estúdio, em Tóquio,Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai, desce as escadas do seu estúdio, em Tóquio Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Mitsunaga Kanda, maquilhadora, Yurie Hatanaka, estilista de perucas, usam máscara de protecção enquanto trabalham no figurino de Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai, antes de uma performance
Mitsunaga Kanda, maquilhadora, Yurie Hatanaka, estilista de perucas, usam máscara de protecção enquanto trabalham no figurino de Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai, antes de uma performance Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai, dança diante das câmaras
Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai, dança diante das câmaras Kim Kuyng-Hoon|REUTERS
Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai posa diante de um computador portátil, num estúdio em Tóquio.
Tokijyo Hanasaki, bailarina de jiutamai posa diante de um computador portátil, num estúdio em Tóquio. Kim Kuyng-Hoon|REUTERS