Covid-19: analista alerta para risco de Brasil ter 110 mil mortos até Agosto
Investigadores da Universidade Federal de Pelotas estimam que o país já tem pelo menos oito milhões de infectados pelo coronavírus, quase seis vezes mais do que o número oficial.
Com a curva de infeçcão por covid-19 ainda em ascensão e o regresso do contacto social estimulado pela reabertura económica em muitas cidades do Brasil, o país poderá registar perto de 110 mil mortes até no início de Agosto. A projecção é de Domingos Alves, especialista em modelagem computacional e porta-voz de um grupo de cientistas das Universidades de São Paulo, que recolhem e monitorizam dados sobre a pandemia e disponibilizam informações no site Covid-19 Brasil.
“Fazemos várias projecções sobre casos, óbitos e novas infecções e o nosso portal aponta para que o número de casos e o número de óbitos vá crescer nas próximas semanas. Isto difere do que o Governo Federal vem trazendo a público ao dizer que a nossa curva está achatando”, disse Alves.
“Estamos no dia 115 da nossa epidemia [o primeiro registo da doença no Brasil foi a 26 de Fevereiro]. A curva de casos e a curva de óbitos vem crescendo de maneira diferente de outros países que achataram a curva de transmissão. Com o relaxamento social que esta sendo feito no Brasil, vamos chegar ao dia 1 de Agosto com 108 mil óbitos e [o número] ainda estará a crescer”, acrescentou.
Os dados citados pelo investigador foram projectados segundo uma metodologia usada pelo Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde da Universidade de Washington, que estabelece estatísticas globais de saúde e avaliação de impacto,.
Domingos Alves também afirmou que no dia 28 de Julho o Brasil deve ultrapassar a barreira de 100 mil mortos.
O Brasil que é o país de língua oficial portuguesa mais afectado pela pandemia e um dos mais atingidos no mundo, contabilizando mais de 1,5 milhões de casos e mais de 62 mil mortes, ficando atrás apenas dos Estados Unidos.
Oito milhões de infectados?
Investigadores da Universidade Federal de Pelotas estimam que o país já tem pelo menos oito milhões de infectados pelo coronavírus, quase seis vezes mais do que o número oficial, segundo uma pesquisa de larga escala realizada a pedido do Ministério da Saúde brasileiro, que examinou 89.397 pessoas em 133 cidades.
O estudo indicou que 3,8% das pessoas examinadas entre 21 e 24 de Junho tinham anticorpos para a covid-19 nas suas amostras de sangue, ou seja, estavam infectadas ou já tinham estado em contacto com o vírus que transmite a doença.
Projectando essa percentagem, os analistas calculam que se 3,8% dos 211 milhões de brasileiros têm anticorpos para o vírus, pelo menos oito milhões já teriam sido infectados em algum momento nos últimos quatro meses.
Embora não haja sinais de baixa na curva de infecções, desde o início de Junho cidades e estados do Brasil experimenta um relaxamento gradual das medidas de isolamento social impostas por governos regionais em quase todo o país.
Enquanto a população tenta voltar ao ritmo de vida anterior a pandemia, é possível perceber que o novo coronavírus avança para cidades menores, no interior, e também voltou a provocar uma alta nas internações hospitalares na metade das capitais dos estados brasileiros.
Um levantamento feito pelo jornal Folha de S. Paulo no dia 29 de Junho indicou que o nível de leitos de terapia intensiva, usados no tratamento de casos graves de covid-19, atingiu ao menos 80% em 13 das 26 capitais brasileiras.
“A curva de mortes diárias apresenta uma espécie de planalto (quando as infecções param de saltar embora se mantenham num patamar alto até começarem a cair) a partir do dia 1 de Junho até o dia 12 de Junho. Este número de mortes por dia já começou a aumentar de novo, provavelmente por causa da reabertura que começou a ser feita no Brasil”, avaliou o especialista da Universidade de São Paulo.
Domingos Alves frisou que muitos especialistas acreditam que poderá haver um “genocídio” no Brasil: “Com esta flexibilização, todas as evidências apontam que o número de casos vai crescer e o número de óbitos vai crescer. Isto tem sido observado nas regiões centro-oeste e sul do Brasil, que por muito tempo ficaram afastadas do foco da pandemia”.
O Brasil é um dos poucos países que está a relaxar as medidas de isolamento social sem ter controlado o número de casos e de mortes, e um dos países que faz menos testes para detectar a infecção.
“A partir da flexibilização [das medidas de isolamento social], os 26 governadores brasileiros e mais de cinco mil prefeitos começaram a ficar descolados da realidade dos dados, das provas [científicas] sem nunca terem seguido as determinações da Organização Mundial da Saúde para o controlo a pandemia’”, considerou.
“Quanto ao Governo Federal, não houve um descolamento da realidade, mas uma negação da realidade. Houve uma politização da pandemia, que causou tudo o que estamos vendo agora no Brasil. Boa parte do que não tem sido feito no Brasil deve-se ao negacionismo do Governo”, concluiu Alves.