A vida em pausa
Gostava de vos agradecer, a vocês jovens de Portugal e de todo o mundo, por aceitarem adiar, por tempo indeterminado o primeiro beijo.
Fazem agora duas semanas que a escola reabriu na Noruega, depois do lockdown anunciado a 12 de Março de 2020.
Mas não para os adolescentes.
Mas não para esta adolescente que tenho em casa.
Para ela, os dias continuam iguais desde há nove semanas.
Ela continua a acordar cedo,
A conectar-se à hora marcada no Teams,
A escrever textos e apresentações,
A aceitar ajudar os irmãos mais novos quando os pais têm de trabalhar,
A lembrar aos amigos do Snapchat que por mais que custe temos que levar a situação a sério,
A fazer pizza e bolo para todos… porque diz que cozinhar a faz sentir bem,
A pôr saquinhos de bolos à porta das amigas,
A falar com os avós que moram longe,
A amar os miúdos mais giros dos filmes… e se calhar, em segredo, um do outro lado do Teams…
Volto ao tempo em que tinha a idade dela e sinto uma vontade tamanha de dar voz a todos os jovens, num tempo em que o seu esforço tem tanto de generoso como de cruel.
Há duas semanas, o ministro da Saúde norueguês Bent Høie fez um discurso dirigido aos jovens que me tocou profundamente.
Enviei-o logo à minha filha que me respondeu com vários emoji-coração.
No dia seguinte as redes sociais e os jornais exaltavam o discurso e davam um feedback agradecido: “Obrigada Bent Høie. Obrigada por nos mencionares. Obrigada por nos veres. Obrigada por nos compreenderes. Obrigada por nos dares valor.”
Publiquei-o na minha página do Facebook, traduzido para inglês, mas curiosamente só suscitou o interesse de meia dúzia de amigos, a contrastar com os cem que gostaram do pôr-do-sol da minha cidade.
Este facto inquietou-me.
E sem querer plagiar o que Bent Høie escreveu, ou outra qualquer pretensão, gostava muito de me solidarizar publicamente com a sua emoção e empatia, e alargar o alvo também aos jovens do meu país e de todo o mundo.
Gostava de vos agradecer a vocês, jovens de Portugal e de todo o mundo, por aceitarem adiar, por tempo indeterminado,
O primeiro beijo,
Os passeios com os amigos pelas ruas da cidade,
Os exames que vos tornavam mais próximo dos vossos objectivos,
A viagem de estudo planeada há meses,
Os namoros de mãos dadas,
O coração aos pulos antes daquele primeiro encontro,
O filme com pipocas e a sala cheia de sacos-de-cama,
Os aniversários cheios de abraços com sabor a bolo de cenoura,
Os abraços das vitórias e das derrotas nos torneios para os quais treinaram o ano inteiro,
As saídas à noite. Para alguns as primeiras.
As férias de Verão. Estas férias de Verão!
Obrigada do fundo do coração queridos adolescentes, mulheres e homens do nosso futuro,
Por aceitarem confiar nos adultos.
Por aceitarem pôr os vossos sonhos em stand-by e acreditarem que esse gesto pode ajudar outros a viver.
Por colocarem a vossa vida em pausa, quando o vosso coração vos manda conquistar o Mundo!
Eu, adulta, em tempos também adolescente, agradeço-vos pela vossa imensa resiliência e resistência.
E sei que o país e o Mundo vos agradecem.
Um dia também a vossa história será contada.
Skien, 1 de Maio de 2020