Paulo Pedroso defende recalibragem do sistema de protecção social em Portugal
Paulo Pedroso defende que “Portugal faz parte dos países que tomaram medidas mais abrangentes de resposta à crise” da covid-19, mas nota “fragilidades” inerentes ao seu modelo de protecção social.
O antigo ministro socialista Paulo Pedroso considerou esta sexta-feira que o sistema de protecção social em Portugal tem de ser recalibrado para responder a fenómenos como a precariedade no trabalho e à pobreza de jovens famílias.
Esta posição foi defendida pelo sociólogo e antigo porta-voz socialista no lançamento da primeira de cerca de 20 conferências digitais que serão promovidas pelo PS para debater o pós-crise, numa intervenção em que também advertiu para a necessidade de se proceder “a uma reforma profunda da prestação de cuidados a idosos e do seu modelo de financiamento”.
Além de Paulo Pedroso, nesta conferência, que foi moderada pela secretária nacional do PS para o Trabalho e Economia Social, e presidente do Conselho Geral do Fundo para Inovação Social, Susana Ramos, participou também o professor universitário e investigador Carlos Farinha Rodrigues.
Paulo Pedroso, que abandonou o PS no início deste ano, defendeu no seu discurso que “Portugal faz parte dos países que tomaram medidas mais abrangentes de resposta à crise” da covid-19, mas também acrescentou que nessas mesmas respostas se notaram “fragilidades” inerentes ao seu modelo de protecção social.
“Se fomos capazes de proteger o emprego e as empresas com o layoff simplificado, se fomos capazes de aperfeiçoar um conjunto de mecanismos para os trabalhadores por conta de outrem - pessoas que têm carreira estável perante a Segurança Social -, esta crise também é reveladora de um dos problemas do nosso sistema de protecção social. Ao mesmo tempo que temos um mercado laboral com um peso significativo de trabalho atípico, não temos depois mecanismos eficazes de protecção das pessoas que se encontram em situação de precariedade. É um problema que já vem de trás”, sustentou.
Neste contexto, o antigo ministro socialista acentuou que os precários são os que menos se encontram protegidos pelo sistema de protecção social, o que teve já consequências em termos de recomposição etária da pobreza em Portugal. “Tivermos sucesso no combate à pobreza dos idosos, mas temos os menores de 18 anos e as pessoas entre os 18 e os 25 anos a registarem um agravamento da pobreza”, apontou.
Para Paulo Pedroso, perante esta realidade em que os mais precários são os que menos beneficiam de protecção social, exige-se uma “recalibragem” do sistema - um sistema “que foi montado para proteger melhor quem tem um vínculo típico”.
“Este é um momento de recalibragem. Sabemos que os recursos são escassos e, portanto, nessa reconsideração das prioridades, temos de proteger os que ficam privados de actividade - e não se pense aqui apenas no desemprego do trabalhador por conta de outrem. Temos de pensar também como tornar mais eficazes os apoios sociais, sobretudo dirigido às famílias jovens. E a terceira prioridade é olhar para o desenho da protecção social de cidadania”, defendeu.
No plano político, Paulo Pedroso disse que a pandemia de covid-19 teve como consequência a queda dos discursos contra os sistemas públicos da saúde.
“Os Estados Unidos são o exemplo do paradoxo. Têm maior riqueza e investigação no sector da saúde, mas uma parte significativa da população não tem acesso aos cuidados de saúde”, alegou.
Carlos Farinha Rodrigues, na sua intervenção, defendeu por sua vez que esta crise da covid-19 tem “um enorme potencial para agravar as desigualdades sociais”, sobretudo aprofundando as pré-existentes, e rejeitou a ideia de alguns sectores de que o novo coronavírus “é democrático”.
“Em anteriores crises, a economia informal foi um escape. Desta vez, atingiu tudo”, apontou o professor universitário, antes de advertir para o aparecimento de “novas formas de desigualdade, por exemplo, no ensino”. “Para muitos estudantes, houve uma quebra da sua relação com o sistema de ensino, ou por não disporem ainda de Internet, ou por ficarem sem acompanhamento escolar. É muito diferente ter ou não pais qualificados”, observou.
Carlos Farinha Rodrigues disse ainda registar-se “um enfraquecimento dos mecanismos de combate às desigualdades por parte dos serviços públicos”.
“Estes serviços têm agora maior dificuldade em acompanhar os cidadãos mais desprotegidos”, disse, antes de elogiar o actual Governo, mas também de deixar alguns recados ao executivo socialista.
“Nesta crise foi possível ver a diferença entre haver um Governo com uma perspectiva social ou um Governo meramente tecnocrático. Mas o programa de relançamento económico deste Governo vai ter de ser integrado, de forma a não deixar ninguém para trás. Tem de ter em conta o emprego, o rendimento e os direitos sociais. Isso exige políticas integradas, porque a recuperação não vai ser igual para todos os sectores”, acrescentou.