Para ganhar Maio, “é preciso resistir a facilidades tentadoras”, diz Marcelo
Lares, SNS e preparação de retoma justificam a renovação do estado de emergência, que o Presidente da República espera que seja o último.
E ao terceiro estado de emergência, é preciso preparar o regresso à normalidade possível. É esse o espírito do decreto presidencial que renova o estado de excepção e foi essa a mensagem que o Presidente da República deixou na sua intervenção ao país para justificar a decisão. Mas há um aviso claro: “É preciso resistir a facilidades tentadoras” e “precipitações” que podem “deitar a perder Maio”.
“Estamos a ganhar a segunda fase”, mas “não queremos morrer na praia”, disse Marcelo Rebelo de Sousa, lembrando que aquilo que é visto lá fora como “o milagre português” é fruto do sacrifício de todos e assim terá de se manter pelo menos até 2 de Maio, quando termina esta terceira fase do estado de emergência que pretende que seja o último.
Para que isso se torne uma realidade, insistiu, o país vai ter de continuar o esforço de contenção por mais 15 dias. “Retenhamos isto: uma crise na saúde bem encaminhada e uma abertura bem ponderada dão força à economia e à sociedade – do emprego ao consumo, ao investimento, ao turismo, à cultura e à comunicação social.” Ao contrário, “uma crise de saúde menos bem controlada e uma abertura menos bem acautelada podem criar problemas à vida e à saúde, e, portanto, à sociedade e à economia”, sublinhou.
Lares, SNS e preparar a retoma
O chefe de Estado apontou três razões pelas quais considerou necessário estender este estado de excepção até ao início de Maio: garantir a protecção de quem vive em lares e a capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde, assim como a necessidade de tempo para preparar a abertura progressiva da economia.
Em relação aos lares, sublinhou que é preciso “consolidar”, em clima de contenção, a tarefa de protecção de quem lá está, mas também das comunidades: “Detectar, despistar, isolar, preservar” são os verbos que é preciso continuar a conjugar no país, que o Presidente afirma ser o quarto da Europa que mais testa.
A segunda razão é a necessidade de “continuar a estabilizar o número diário de internamentos, em geral, e nos cuidados intensivos em especial, dessa forma assegurando que o nosso insubstituível Serviço Nacional de Saúde se encontrará em condições de responder à evolução do surto em caso de aumento progressivo de contactos sociais”. Sim, esse é um dado adquirido: à medida que se vão levantando restrições, o número de infectados vai subir, garantem todos os especialistas e exemplos externos.
“Uma coisa é conviver com o vírus em actividade precavidamente aberta, sabendo que a situação está controlada, e somando-lhe um sistema de vigilância e protecção e regras de comportamento já adquiridas, outra é provocar recuos e recaídas já experimentados em sociedades que conhecemos”, avisou Marcelo.
O terceiro fundamento é a necessidade de dar “tempo e espaço ao Governo para definir critérios” para, depois do fim de Abril, proceder à “abertura gradual da sociedade e da economia, atendendo a tempo, modo, territórios, áreas e sectores”. Um regresso à normalidade que será lento, gradual e progressivo, como diz o decreto entretanto aprovado no Parlamento.
“Maio tem de ser o mês dessa ponte entre o dever e a esperança. Sê-lo-á tanto melhor quanto mais bem-sucedidos formos a atingir os objectivos na consolidação do combate à pandemia. E mais cuidadosamente prepararmos uma saída da crise, que gere confiança”, disse o chefe de Estado. “Confiança é a palavra-chave”, sublinhou Marcelo, insistindo na ideia deixada na véspera pelo primeiro-ministro, no sentido de que é preciso que a sociedade comece a ganhar confiança para retomar as suas actividades.
“Não tenham receio”, disse o Presidente dirigindo-se aos mais velhos ou doentes: “Ninguém quer encerrá-los num gueto, dividindo os portugueses entre os resistentes e imprescindíveis e os frágeis e descartáveis. Cuidar de vós é diferente de vos menorizar”. Aos mais jovens, deixou também uma palavra de incentivo: “Admiro a vossa capacidade de reagir ao maior e, para muitos, mais incompreensível choque da vossa vida.”
Os autarcas – com os quais o Presidente mantém uma ligação estreita - também mereceram uma referência especial: “Se alguém, passado o mais grave da crise, a pretexto de uma visão estreita do Direito e da Justiça, questionar, um dia, decisões dramáticas de salvação pública, tomadas de boa-fé e com isenção, serei o primeiro a testemunhar como, em tantas dessas circunstâncias, foi essencial o vosso papel de proximidade.”
Marcelo voltou a salientar todo o esforço de contenção que a sociedade tem feito e a dedicação dos profissionais de saúde, mas também quis sublinhar a importância da política neste processo, elogiando a actuação do primeiro-ministro e do Governo por ter “ouvido os especialistas, agido em unidade e ter feito deste combate o combate da sua vida”.
Enalteceu também o consenso gerado em torno da decisão do estado de emergência, dos partidos, do Parlamento e dos líderes políticos e sociais. “Mesmo os que hoje divergem, no primeiro e decisivo momento não se opuseram. É isso que ficará para a História”, sublinhou. E no fim, voltou ao “milagre” português, dizendo que não é senão fruto do sacrifício: “Se isto é um milagre, o milagre chama-se Portugal.”