Fotografia
Três casas, dois arquitectos, um prémio: assim se recupera sem tirar identidade ao Porto
Uma porta para a Rua do Almada, outra para a Rua do Alferes Malheiro, no Porto. Dentro destes limites, dois lotes que se tocam, três edifícios, seis apartamentos. Num dos lotes, aquele que está virado para a Rua do Almada, estava uma “casa tradicional portuense em bom estado” e, no mesmo terreno mas ao fundo, “uma construção mais precária”. No outro lote, “estava uma casa completamente arruinada”, que apenas tinha “a fachada em razoável estado de conservação”.
Foi assim que os arquitectos do gabinete Figueiredo + Pena encontraram o espaço quando o projecto de reabilitação para estas três casas lhes foi parar às mãos. E foi com esse mesmo projecto que venceram o Prémio João de Almada, atribuído bienalmente pela Câmara Municipal do Porto aos melhores exemplos de reabilitação que tenham sido concluídos na cidade.
A recuperação das casas foi feita preservando alguns elementos originais herdados: a escada em caracol, a clarabóia, os soalhos, as madeiras dos rodapés ou as portadas. “Tudo elementos muito valiosos que, em muitas intervenções, se deitam fora de uma forma um pouco displicente”, explica Luís Pena, co-fundador do gabinete. “Estes elementos são importantes do ponto de vista do conceito, do entendimento que temos de património”, continua. O arquitecto acredita que só desta forma se mantém “a marca que distingue o centro do Porto de outras cidades”.
Assim, foi mantida a “estrutura fundamental” da casa que está virada para a Rua do Almada — um edifício “com a tipologia das casas burguesas do Porto e bons materiais, bons acabamentos e em bom estado” —, tendo sido feita uma reorganização e ampliação do espaço. No caso dos outros dois edifícios, o cenário não pôde ser o mesmo: da casa virada para a Rua do Alferes Malheiro, uma casa “muito estreita, com dois metros e meio de largura”, só foi possível preservar a fachada. Foi “reconstruída com estrutura de madeira”, organizada “em torno de uma escada de caracol” e transformada numa habitação tipo T3.
O terceiro edifício, uma espécie de “anexo” que fica no meio do terreno, por ser uma construção “muito débil”, acabou por ser demolido e posteriormente reconstruído “com a linguagem de uma oficina”. “Os materiais de construção ficaram visíveis interiormente e todas as instalações estão à vista. A própria forma de ocupação do interior do quarteirão, com revestimento de chapas onduladas, também remete de alguma forma para esse imaginário de espaço de trabalho”, descreve Luís Pena.
O resultado final valeu-lhes o prémio na categoria “Edifícios Residenciais” da 18.ª edição do Prémio João de Almada, no valor de dez mil euros (7000 euros para o gabinete de arquitectura e 3000 para o proprietário do imóvel, a Red Crown Investment). O “reconhecimento do trabalho” deixa a equipa de arquitectos satisfeita, especialmente num momento em que se assiste a uma “reabilitação demasiado rápida (…) no Porto”. “O prémio é dos anos 80 mas hoje, mais do que nunca, é importante que estas soluções sejam feitas com cuidado”, aponta.
Os arquitectos estão actualmente a desenvolver um projecto para o Centro de Pesquisa e Conservação do Museu Jurassica em Porrentruy, na Suíça, que resultou de um concurso ganho em Fevereiro último. E Luís Pena lamenta que seja “o trabalho externo” aquele que é “mais valorizado do ponto de vista financeiro e económico”: “São esses trabalhos que nos permitem ter mais tempo e rigor nos trabalhos que são feitos cá, em valores que julgamos serem impossíveis para fazer bem.”
Na categoria “Edifícios Não Residenciais” do mesmo prémio foi distinguido o projecto de reabilitação da “Casa Rosa” Hotel, na Rua da Alegria, do arquitecto Nuno Graça Moura. Foram atribuídas menções honrosas aos Depa Architects, por uma habitação na Rua do Rosário; aos aNC Arquitectos, pelo projecto de um imóvel na Rua do Padre Fernão Cardim; ao Atelier 15, pelo Reservatório da Pasteleira; e aos arquitectos Nuno Valentim, Frederico Eça e Margarida Carvalho, pelo edifício dos Albergues Nocturnos do Porto.