Há 100 anos nasceu o Belenenses, o velho do Restelo
Houve sucessos em Belém, espalhados, na história, pelo Campo do Pau de Fio, o Estádio das Salésias, o Estádio do Restelo e o Pavilhão Acácio Rosa. O clube de futebol tem sido, também, um clube de andebol, de râguebi, de natação, de atletismo ou de andebol.
Ainda hoje, em Belém, qualquer visitante da cidade de Lisboa pode sentar-se num banco – não qualquer um, mas um banco em específico – e, enquanto contempla o Palácio da Presidência da República, colocar-se na pele de Artur José Pereira. Há 100 anos, naquele banco de jardim, cerca de um mês depois do florescer da ideia embrionária, formou-se o Clube de Futebol “os Belenenses”.
Esta é a semana do Belenenses no PÚBLICO. Teremos o título nacional, as Taças de Portugal, as descidas de divisão e a cisão com a SAD. Mas, hoje, o dia é de olhar geral. Olhar para um clube de uma zona nobre de Lisboa e que, para muitos, tem a melhor vista da cidade, no cimo de uma elevação que contempla o Rio Tejo, o Cristo-Rei e o início do Atlântico.
O Belenenses é o senhor do Restelo. Ou velho. Aos 100 anos, já pode ser o “velho do Restelo”. Camões representou esta figura como crítica da cobiça pela expansão ultramarina e o Belenenses também é, hoje, um “velho do Restelo”, crítico da expansão do futebol para o negócio. E está, por isso, orgulhosa e dedicadamente mergulhado no futebol distrital, após um recomeço do zero.
O Belenenses foi o primeiro clube a reclamar o estatuto de “quarto grande”, sendo, até 1982/83, o único a acompanhar Benfica, FC Porto e Sporting em todas as edições do campeonato nacional. Com 77 participações, o Belenenses é, até hoje, o quarto clube com mais participações na Liga portuguesa, só superado pelos três “grandes”. É, ainda, um dos cinco clubes campeões nacionais. Aí, só o Boavista se chega ao convívio entre os três “grandes” e o velho Belém. Na Taça de Portugal, tem, como o V. Setúbal, três conquistas – apenas superadas pelas de Boavista e, claro está, dos três “grandes”. Mesmo numa das mais belas páginas do futebol português, o Mundial 66, José Pereira e Vicente Lucas, jogadores do Belenenses, foram, a par do setubalense Jaime Graça, os únicos extra-grandes a fazer parte do “onze” habitual. Por tudo isto, os mais acérrimos belenenses pregam, sem pudor, que o clube é o “quarto grande” do futebol português.
Houve sucessos em Belém, espalhados, na história, pelo Campo do Pau de Fio, o Estádio das Salésias, o Estádio do Restelo e o Pavilhão Acácio Rosa. O clube de futebol tem sido, também, um clube de andebol, de râguebi, de natação, de atletismo ou de andebol. O Belenenses tem sido muita coisa, em muitos sítios, em muitos momentos diferentes da história.
O Matateu, o Pereira, o Tuck e o Filgueira
“Ser do Belenenses é ser diferente”. Quem o diz é Bernardo Ribolhos, actual capitão de equipa, uma das caras de uma equipa que, pelas palavras do próprio, tem o desafio de “reerguer o clube no inferno dos distritais”.
“A primeira vez que entrei no Restelo foi para treinar e não correu lá muito bem. Tinha sete anos e, a meio do treino, o meu pai chamou-me da bancada. Eu aproximei-me dele e, sem ver, caí no fosso do velhinho Estádio do Restelo. Um baptismo perfeito. Mas é como se diz: inícios atribulados dão origem a histórias fantásticas. E assim foi. Depois desse dia, foram 14 anos como jogador e mais quatro como treinador [camadas jovens]. Ainda hoje, quando subo as escadas do túnel, fico a olhar para ele como se ainda tivesse sete anos”, conta.
Antes de “Benny”, muitos outros passaram por lá. O Belenenses é o clube de Matateu, de Vicente Lucas e de José Pereira, mas também de Tuck, de Marco Aurélio e de Filgueira. O minhoto Tuck só conheceu dois clubes na carreira de jogador: Gil Vicente e Belenenses. Sete temporadas de Restelo fazem-no falar com propriedade.
“As pessoas têm um amor imenso ao clube. É uma ligação muito sentimental, por um clube histórico”, define. E contou um momento especial de ligação ao clube: “Não houve dia nenhum que não fosse especial, mas houve um que coincidiu com a situação mais marcante, que foi o meu primeiro jogo oficial. Curiosamente, foi no Jamor [casa do Belenenses SAD], porque o relvado do Restelo estava desgastado por causa de um concerto. Nesse dia, senti a emoção de entrar com o hino, mas, sobretudo, foi marcante porque as pessoas da bancada central tinham todas um sinal de sentido obrigatório a apontar para cima [subida de divisão. Foi toda a bancada nessa coreografia. Cada adepto tinha um sentido obrigatório e foi um jogo com um factor emocional forte”.