Automóveis
Clássicos, raros, valiosos. A colecção portuguesa de carros avaliada em 11 milhões de euros
Um leilão inédito no Alentejo com mais de uma centena de automóveis históricos. Criações marcantes, exemplares únicos, todos em estado impecável. É a colecção milionária de Ricardo Sáragga.
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dos resultados do leilão
Era provavelmente um dos segredos mais bem guardados: uma colecção de 127 exemplares que, além do valor milionário, percorre mais de cem anos da história do automóvel. Mas, mesmo depois de conhecida, há detalhes que permanecem ocultos. Não se sabe o que levou Ricardo Sáragga a iniciar a colecção há mais de trinta anos, e, apesar das várias tentativas do PÚBLICO, o próprio recusa determinantemente dar detalhes sobre o seu trajecto. Apenas que a paixão é tal que “muito provavelmente irá recomeçar do zero não tarda”, como nos diz Nick Wiles, o especialista da leiloeira RM Sotheby’s, enquanto nos acompanha numa visita guiada ao enorme edifício, numa herdade entre Alcácer do Sal e Comporta, que guarda mais de uma centena de veículos (e local do leilão a 20 de Setembro). Sáragga confirma a afirmação de Wiles no seu texto introdutório da colecção: “Esta não é a minha primeira colecção de carros, e certamente não será a última”.
Num curto texto que assina no catálogo editado pela leiloeira, Sáragga refere ainda que “muitos dos carros (…) fizeram parte da maioria dos momentos importantes” da sua vida, sublinhando o facto de sempre se ter sentido “atraído por automóveis que tivessem um passado relacionado com Portugal”.
“Todos os veículos estão prontos para ir para a estrada: a trabalhar e legais”, sublinha o responsável da RM Sotheby’s, realçando o cuidado com que cada carro foi tratado – mesmo nos mais antigos (o mais idoso remonta a 1911) é difícil encontrar imperfeições. Cada esmalte foi polido, cada fio reposto, cada forro arranjado ou substituído. A maioria apresenta-se como de origem, o que é um feito dada a idade que ostentam, além de se apresentarem com dados impressionantes sobre a sua própria história.
Pela conjunto, destaca-se o gosto de Sáragga pela Porsche, com mais de vinte carros com este emblema, entre os quais se incluem o 911 RS 2.7 Touring de 1973 laranja que constou na edição 50 Anos da Porsche em Portugal, editada pela marca, um dos primeiríssimos 911 (o S Coupé, de 1967) ou um 356 da última geração, datado de 1964 e trabalhado pela Karmann.
Mas, em 127 propostas há muita diversidade e carros para todos os gostos. Para quem gosta deles mais pequenos, é de referir a existência de um Vespa 400 (1959), um microcarro com a assinatura da Piaggio. Já para os amantes de berlinas XXL, o Mercedes-Benz 600 de 1966, adquirido pelo filho de Calouste Gulbenkian, Nubar, é uma das estrelas da colecção, sublinha Wiles, com genuíno orgulho. Com uma carroçaria e interiores concebidos pelo atelier de Henri Chapron, o automóvel que Nubar Gulbenkian deixaria ao seu jardineiro português é referência de exclusividade: tem tecto panorâmico, tablier em pele e até suportes especiais para cachimbos, entre outras preciosidades.
Também trabalhado pela Chapron, há um dos 40 Delahaye 135M Cabriolet manufacturados entre 1937 e 1939. O modelo em causa, construído no último ano de produção, foi uma encomenda especial de Tristão Guedes de Queiroz, segundo marquês da Foz, que o ofereceu à mulher, Mariana Brandão de Melo Magalhães, por ocasião do nascimento da filha de ambos.
Porém, o automóvel que mais parece impressionar o especialista britânico é o WD Denzel 1300, de 1955, por ser “uma raridade”. Foram construídos apenas 65 automóveis e, destes, apenas 30 terão chegado aos nossos dias, “sendo que nenhum tão bem preservado”. O carro chegou a estar presente em algumas provas de velocidade e de ralis e, já neste século, foi apresentado no prestigiado Cascais Concours d’Elegance.
Entre os veículos cuja história se cruza com momentos de competição há ainda um HRG Aerodynamic de 1947, conduzido em três edições do Rali Internacional de Lisboa, entre 1948 e 1950, o DB Type HBR Cabriolet, de 1951, usado pelo piloto amador José Emídio da Silva num conjunto ecléctico de provas, ou o Lotus 69 (1971), com o qual Ernesto Neves se conseguiu distinguir na Rampa da Pena, no Circuito de Montes Claros (no Parque de Monsanto), em Vila do Conde e no Autódromo do Estoril.
Numa colecção avaliada em 11 milhões de euros há ainda preços para todas as carteiras: desde os cinco mil euros de um Fiat Panda Cross 4x4, de 2007, que, entre tantos clássicos e raridades, parece destoar, até ao 8-Litre Tourer, com o qual a Bentley pretendia derrotar a rival Rolls Royce e que se apresenta com um intervalo entre os 700 e os 800 mil euros. E propostas oriundas de quase toda a parte: há americanos, entre os quais um icónico Chevrolet Corvette de 1960 ou um dos poucos Ford Mustang Convertible de primeira geração a chegar à Europa; ou italianos, como o Lancia Aurelia B24s Convertible By Pinin Farina (1956), uma versão radical descapotável de dois lugares que foi protagonista no filme A Ultrapassagem (1962), ou um Fiat Dino Spider (1967), tido como um dos descapotáveis italianos mais desejados. E, claro, Ferrari – ainda que em número contido (há cinco). Mas a maioria descende de linhagens francesas, britânicas e alemãs, num hino à indústria automóvel daqueles países.
O leilão, que decorre este sábado, dia 21 de Setembro, na propriedade alentejana de Ricardo Sáragga, é de entrada exclusiva a quem se apresentar com um catálogo (válido para duas pessoas).