Foi no ginásio que Ana Prates, 36 anos, se lesionou numa aula de grupo. Depois disso, decidiu optar por um treino diferente. Não é a única. Actualmente, existem diversos ginásios que são mais do que espaços onde se pratica exercício físico, ou seja, funcionam quase como clínicas. Além do professor ou do personal trainer (PT), existem ainda médicos, fisiologistas do exercício, fisioterapeutas e outros profissionais de saúde que, em conjunto, descobrem qual a melhor prática de exercício para cada cliente – seja ou não doente.
Por exemplo, no espaço BeeLife, em Lisboa, todos os clientes têm uma consulta com um médico fisiatra antes de iniciarem o treino. Este avalia a condição física e o que é necessário melhorar. Depois, juntamente com um fisiologista do exercício, constroem um plano, que é administrado por este último. O mesmo acontece na Clínica das Conchas, na mesma cidade.
Para Afonso Pescado, fisiatra no BeeLife, esta sinergia é essencial. Explica que o médico consegue perceber uma patologia, mas não qual o melhor exercício ou movimento para a tratar. É aí que entra o fisiologista do exercício. “Aqui optimizamos recursos. O objectivo é pegar naquela hora que a pessoa tem para o exercício e fazer com que desfrute ao máximo, atingindo da melhor forma os objectivos a que se propõe”, explica.
Os serviços disponibilizados e as valências dos profissionais das chamadas “clínicas de exercício” podem mudar de espaço para espaço, mas o objectivo é sempre o mesmo: adaptar o exercício a cada indivíduo, algo que, de acordo com os profissionais, só se consegue se as aulas forem individuais ou para grupos reduzidos.
No BeeLife, as turmas têm no máximo dez pessoas; no centro clínico do Axis Wellness, em Viana do Castelo e em Ponte de Lima, são oito; e na 360 Clínica do Exercício, em Lisboa, o número não excede os três alunos por aula. Para os profissionais destes espaços a razão é óbvia: “Num ginásio tradicional [que dá aulas a dezenas de pessoas ao mesmo tempo] não se consegue o grau de especificidade que o nosso ginásio consegue oferecer”, informa Eduardo André, fisiologista do exercício na 360 Clínica do Exercício.
“Faço exercício mas sinto apoio. Têm sempre cuidado com as minhas limitações e, se for necessário, adaptam os exercícios”, testemunha Ana Prates, que há dois meses frequenta o BeeLife.
Álvaro Santos, personal trainer e dono de um espaço com o seu nome, em Lisboa, também faz referência a alunos que trazem lesões de ginásios. “Tenho tantos… [Nestas situações] temos de preparar as pessoas, [através do exercício correcto], para o seu dia-a-dia. A ideia é fazer com que vivam mais tempo, mas com saúde e qualidade de vida”, defende.
Treinar com ordem do médico
Desde Maio deste ano que a Direcção-Geral de Saúde (DGS) passou a implementar as consultas de actividade física. Romeu Mendes, director-adjunto do Programa Nacional para a Promoção da Actividade Física (PNPAF), explica ao PÚBLICO que a ideia do Serviço Nacional de Saúde (SNS) “é dar uma solução concreta de exercício físico para o doente”.
O responsável refere ainda a necessidade de aproximar os profissionais de saúde aos do exercício físico, uma vez que “existe uma falha de comunicação [entre ambos] no [SNS] – mas há sistemas privados que funcionam muito bem”.
No entanto, com tanta diversidade de espaços e profissionais, como garantir ao consumidor que está, de facto, no sítio correcto? De acordo com Romeu Mendes é essencial que quem prescreva exercício seja “um médico com pós-graduação em medicina desportiva” ou então um fisiologista do exercício, “com uma licenciatura em ciências do desporto e uma pós-graduação em exercício físico e saúde”.
Para o restante acompanhamento, “o ideal é haver uma equipa multidisciplinar – quem fica sempre a ganhar é o cidadão”, garante.
Como nem toda a gente tem disponibilidade para pagar um ginásio com este tipo de oferta – os preços começam nos 49 euros e são feitos orçamentos à medida de cada cliente –, Romeu Mendes informa que existem já 12 projectos-piloto a funcionar no país, em centros de saúde. Nestes, a prescrição é feita pelo médico em conjunto com o fisiologista e tendo em conta as possibilidades económicas de cada um.
“Tenho preferência por enviar os doentes para sítios onde conheço o currículo dos profissionais. No entanto, tenho de pensar que só porque as pessoas não podem pagar um ginásio, isso não deve ser impedimento para que lhes prescreva exercício. Tem é de ser adaptado”, defende.
O director-adjunto do PNPAF acrescenta que, em certas situações, a pessoa pode treinar sozinha, desde que sejam dadas indicações muito claras; e dá o exemplo da marcha para quem tem diabetes de tipo 2. “Não prescrevo esse exercício sem antes explicar que é preciso levar uma garrafa de água, ir sempre acompanhado, não andar nas horas de maior calor… A ideia é detalhar o que se deve fazer, quais os principais erros e ao que se deve ter atenção”, aconselha.
E resulta? Romeu Mendes refere casos de vários doentes com diabetes de tipo 2 que deixaram de tomar medicação graças a fazerem o exercício prescrito e acompanhado. “Mas, como é claro, terão de continuar a praticar exercício e uma alimentação saudável para não voltar à medicação”, salvaguarda. Também Marco Santos, fisiologista no Axis Wellness, dá o exemplo de um cliente com hipertensão que deixou de tomar medicação graças à actividade física – “mas sabe que terá de continuar os nossos exercícios”, aconselhou, na altura.
A partir de Dezembro de 2017, a DGS começou a aplicar guias de aconselhamento em centros de saúde. Este projecto-piloto pretendia que o médico de família fizesse um aconselhamento breve de exercício físico através de guias digitais, que poderiam ser entregues aos doentes. Entre Setembro e Dezembro de 2018, 5443 utentes receberam este tipo de aconselhamento, num total de 63.817 utentes avaliados, refere a Lusa. A partir de Maio, o que começou a ser aplicado foi a consulta de actividade física.
Texto editado por Bárbara Wong