O bailinho dos eurodeputados dos Açores e da Madeira este ano ainda é mais polémico

Nestas europeias, o PS mudou novamente os nomes dos seus candidatos das regiões autónomas. O PSD inovou e pela primeira vez não terá um representante açoriano na sua lista.

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Em seis legislaturas, as regiões autónomas dos Açores e Madeira tiveram 16 eurodeputados: os dois maiores partidos, PS e PSD, renovaram os representantes dos dois arquipélagos nas suas listas de candidatos ao Parlamento Europeu (PE) em quase todas as votações, desde as eleições de 1989. Este ano não será diferente para os socialistas, que mais uma vez mudaram os dois candidatos insulares na lista das europeias. Já o PSD inovou e acabou mesmo por deixar cair o representante açoriano dos lugares elegíveis. Ambas as decisões são polémicas.

Apesar dos elogios ao seu trabalho dentro do PS e da disponibilidade que ambos manifestaram para continuar no cargo, tanto Liliana Rodrigues, da Madeira, como Ricardo Serrão Santos, dos Açores, cumprirão apenas um mandato no PE. Entrevistados pelo consórcio dos correspondentes portugueses em Bruxelas composto pelo PÚBLICO, Antena 1, Expresso, Lusa, RTP, SIC e TVI, durante a última sessão plenária da legislatura, em Abril, nenhum dos dois quis alimentar polémicas com essa situação.

“Sempre estive disponível para tudo o que interessasse ao partido, mas a estrutura regional do PS da Madeira entendeu, com toda a legitimidade, que eu não faria parte da estratégia e decidiu não me recandidatar. Estou muito confortável com isso”, afirmou Liliana Rodrigues, que vai regressar à sua carreira académica no Funchal. A representação da Madeira na lista do PS foi entregue à médica, de 29 anos, Sara Cerdas, uma perfeita desconhecida da política do arquipélago.

Frisando que “ninguém é insubstituível”, Ricardo Serrão Santos admitiu sentir alguma pena de não continuar o seu trabalho no PE, mas considerou o processo de escolha do representante dos Açores na lista socialista como “transparente”. “Houve outras opções e houve um voto no âmbito do secretariado do PS Açores em que não fui eu o escolhido”, resumiu o professor universitário, que em 2014 foi eleito como independente.

O PS Açores anunciou em Fevereiro que André Bradford, actual líder parlamentar na Assembleia Regional, seria candidato a um lugar no PE. Com a sua eleição, a presidência do grupo do PS Açores na Assembleia Legislativa Regional passa para Francisco César, filho do antigo presidente do governo regional e actual líder da bancada do PS na Assembleia da República, Carlos César.

Apesar da distribuição de pastas só se fazer após a tomada de posse, Bradford deverá herdar as mesmas pastas de Serrão Santos, a agricultura e as pescas — nas quais o independente se destacou durante a actual legislatura. De acordo com a avaliação feita pela organização independente Vote Watch, foi o terceiro eurodeputado português mais influente. E também sobressaiu como o mais apreciado pelos seus pares numa tabela informal coligida pelo consórcio de correspondentes a partir de entrevistas com todos os eurodeputados portugueses.

“São os Açores e Madeira que perdem”

Também de saída de Bruxelas, onde cumpriu três mandatos consecutivos, a socialista Ana Gomes diz não compreender a razão para tanta rotatividade nas regiões autónomas. Em declarações ao consórcio de correspondentes portugueses, a eurodeputada considerou que a renovação das listas de candidatos é importante, mas defendeu que esta deve ser feita preservando também a continuidade de elementos que já se mostraram válidos, “para maximizar a capacidade de influência” dentro do PE.

“Tenho muita pena de ver que hoje em Portugal a representação das nossas regiões autónomas Açores e Madeira estar completamente mudada, porque obviamente são os Açores e Madeira que perdem, independentemente da qualidade de quem vem aí, por aqueles que já cá estavam e fizeram um bom trabalho — estou a falar do Ricardo, estou a falar também da Liliana, que fizeram aqui bom trabalho, que os prestigiou e prestigiou Portugal e que foi útil para a Europa e é uma pena que aquilo que podiam a partir de agora ainda mais render ser desaproveitado e voltar tudo à estaca zero. Sim, tem havido muita renovação e eu acho que isso não ajuda nem a Madeira nem os Açores, acho que importa que haja continuidade de pelo menos três mandatos de qualquer deputado em particular das regiões.”

Manuel dos Santos é igualmente crítico da renovação da lista socialista, mas por razões políticas — considera que a nova lista do PS “é manifestamente inferior à anterior, que já não era boa” — e não por causa da substituição dos dois eurodeputados das regiões autónomas. Aliás, em dissonância com os seus colegas, Manuel dos Santos não compra “esta ideia de que os Açores e a Madeira têm de ter representantes em lugares elegíveis”, argumentando que “são espaços eleitorais pequenos” e que os nomes propostos pelo partido “não são propriamente génios da política nas respectivas áreas”.

Nesse ponto, de resto, diz-se mais próximo da opção do seu bom amigo e presidente do PSD, Rui Rio, que na composição da lista social-democrata ao PE destinou apenas um lugar elegível às regiões ultraperiféricas. “Gostei da opção dele e se estivesse no seu lugar provavelmente teria feito o mesmo”.

Tendência de mudança dos eurodeputados

Já as actuais eurodeputadas do PSD dos dois arquipélagos lamentam a posição do líder do seu partido face aos Açores, que classificam como um “desprestígio” e um “erro”. “É uma situação profundamente lamentável”, considera Sofia Ribeiro, que entende que é todo o país que sai prejudicado e não apenas a região autónoma dos Açores. “Prescindir de uma voz que entra nos fóruns específicos de discussão sobre as regiões ultraperiféricas, e que pode trazer uma mais-valia para o nosso país, é obviamente uma perda”, comentou a eurodeputada açoriana, que já no fim de 2018 tinha excluído a hipótese de manter-se em funções por ter apoiado o candidato derrotado do PSD-Açores.

Cláudia Monteiro de Aguiar, que surge no 6.º lugar da lista do PSD, não alinha pela tese de Rui Rio, que entende que o problema da representatividade das regiões autónomas fica resolvido com a inclusão de um assistente açoriano no gabinete da eurodeputada madeirense. Questionada sobre essa solução, classificou-a como “uma não-questão”: “O meu gabinete está definido”, observou.

Para Cláudia Aguiar, o que está em causa é “o respeito pelas regiões autónomas e pela ultraperiferia”. “Tanto a Madeira como os Açores têm de ter um representante; as características e as necessidades das ilhas são diferentes, e há um princípio que é preciso respeitar que é o da autonomia”, afirmou.

Esta tendência de mudança dos eurodeputados que representam as regiões autónomas só foi contrariada pelo sociais-democratas em duas ocasiões. Em 1989, nas primeiras eleições em que Portugal participou em simultâneo com os restantes Estados-membros, o PSD voltou a apostar no açoriano Vasco Garcia, que já tinha sido nomeado em 1985 e eleito para o PE em 1987. Nas duas eleições seguintes, em 1994 e 1999, os Açores também tiveram o mesmo candidato na lista do PSD: Carlos Costa Neves.

No PS, a excepção que confirma a regra foi Paulo Casaca, eleito para o PE pelos Açores em 1999 e outra vez em 2004. Mas os socialistas não tiveram nenhum eurodeputado das regiões ultraperiféricas nem em 1987 (o socialista açoriano José Medeiros Ferreira foi eleito pelo PRD), nem em 89, nem em 94. E só em 2004 a Madeira elegeu pela primeira vez um eurodeputado socialista, Emanuel Jardim Fernandes.

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