As mulheres estão no centro da campanha em Espanha sem conseguir a paridade

Nem o PSOE, que se vangloria de ter um Governo feminista, candidatou igual número de homens e mulheres. Foi superado até pelo PP.

Foto
As mulheres são o grupo maior de indecisos em Espanha Susanna Saez/LUSA

Os quatro principais candidatos preparavam o primeiro debate desta campanha eleitoral no estúdio da televisão espanhola (RTVE), absorvidos nas últimas recomendações dos seus assessores, quando entram no estúdio duas mulheres da limpeza, armadas com as suas sabrinas, para deixar o chão esmerado para as câmaras.

A imagem fugaz não passou despercebida a muitos movimentos de defesa dos direitos das mulheres e gerou críticas nas redes sociais, numa altura em que o tema da igualdade de género e de salários iguais entre homens e mulheres está no topo das preocupações do eleitorado espanhol.

“Dizem que uma imagem vale mais do que mil palavras. Esta imagem do estúdio do debate da RTVE mostra que “AunQuedaMuchoPorHacer [ainda há muito por fazer]. Eles querem governar e elas passam a sabrina”, escreveu o movimento Mujeres RTVE no Twitter, num tweet com uma imagem do estúdio de televisão.

A ideia partilhada é a de que se fala muito da igualdade de género, mas mais uma vez sem uma mulher como candidata à liderança do Governo espanhol. Mesmo que 36,5% dos inquiridos no último barómetro do Centro de Investigações Sociais (CIS) espanhol refira que o PSOE é quem mais tem trabalhado para a igualdade de género – Pedro Sánchez insiste muito que chefiou um Executivo feminista, com mais mulheres que homens entre os ministros –, ainda há caminho a percorrer até para os socialistas.

Nenhum dos cinco maiores partidos nacionais alcançou a paridade entre homens e mulheres nas suas listas de candidatos a estas eleições. E, curiosamente, os socialistas nem conseguem ser o mais paritário, já que os seus 42% estão abaixo dos 44% do Partido Popular (PP). Unidas Podemos (UP), apesar da feminização do nome da coligação só chegou aos 40% (na apresentação da candidatura, só havia homens para apresentar as listas) e o Ciudadanos (Cs) ficou-se pelos 38% – o discurso do seu líder, Albert Rivera, que se advoga defensor do feminismo liberal, no Dia Internacional da Mulher, não passou despercebido: estava rodeado de mulheres, mas só ele fez uso da palavra.

O Vox, o partido de extrema-direita que pretende acabar com a lei da violência de género, por ser “pura ideologia”, tem apenas 25% de mulheres nas suas listas. Uma tendência que se encontra também no seu eleitorado. Se compararmos com a última eleição na Andaluzia, no ano passado, quando o partido de Santiago Abascal emergiu como força política importante (nas últimas eleições gerais nacionais de 2016 obteve apenas 0,2%), vemos que 60% do seu eleitorado é masculino e 40% feminino.

A greve geral de mulheres de 8 de Março, no Dia Internacional da Mulher, com milhões nas ruas de vários países do mundo contra a violência de género e a favor do salário igual para trabalho igual ainda ressoa em Espanha (350 mil marcharam em Madrid, 200 mil em Barcelona). Mesmo assim, os partidos ficaram aquém das expectativas de paridade.

Carmen Calvo, vice-presidente do Governo e cabeça de lista do PSOE em Madrid, deu a estas eleições o cunho de um escrutínio decisivo face aos avanços conseguidos até agora, nomeadamente no que diz respeito aos direitos das mulheres. Para Calvo, “está em jogo o modelo de convivência, o modelo de país”. Por isso, perante o avanço “das direitas”, garante que a 28 de Abril joga-se “muito mais que umas eleições”.

O primeiro debate eleitoral desta campanha na RTVE, em que não participaram os candidatos a primeiro-ministro e onde curiosamente havia quatro mulheres – Irene Montero (Unidas Podemos), María Jesús Montero (PSOE), Cayetana Alvárez de Toledo (PP), Inés Arrimadas (Ciudadanos) – e só dois homens – Aitor Esteban (PNV) e Gabriel Rufian (ERC) –, ficou marcado pelo ataque da candidata do PP em Barcelona à proposta socialista do consentimento afirmativo nas relações sexuais.

Virando-se para María Jesús Montero, ministra das Finanças, Cayetana Alvárez de Toledo, afirmou: “É verdade que vocês vão dizendo ‘sim, sim, sim’… até ao final?” No debate de segunda-feira, Pedro Sánchez, a quem a candidata do PP chamou “homem de coragem discutível e discutível”, não deixou de a lembrar num ataque a Pablo Casado: “O maior inimigo da igualdade entre homens e mulheres é o machismo. Diga aos seus candidatos que quando não é ‘sim’, é ‘não’. ‘Não’ é não”.

Com maior predominância de votantes indecisos entre as mulheres (45%) do que entre os homens (38%), de acordo com o barómetro do CIS, os partidos têm-se esforçado para tentar captar o voto feminino. Não só há mais 1.164.805 eleitoras que eleitores, como estas se mostram menos propensas à abstenção do que os homens: 5,8% contra 6,7%.

Numa eleição tão disputada em que o bloco de esquerda (PSOE e UP) e de direita (PP, Cs, Vox) se equilibram nas intenções de voto, todos os papelinhos nas urnas contam. E Pablo Iglesias, líder do UP, até garantiu que o feminismo é a “melhor vacina” contra a subida da extrema-direita.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários