Supremo dos EUA diz que execuções “não garantem morte sem dor” mas manda executar prisioneiro
Numa votação em que os juízes nomeados pelo Presidente Trump tiveram um papel preponderante, o Supremo autorizou a execução por injecção letal de um prisioneiro que diz correr o risco de “agonia excessiva”.
O Supremo Tribunal dos EUA decidiu, esta segunda-feira, que a Constituição do país não garante uma “morte sem dor” aos presos condenados à pena capital e autorizou a execução de um prisioneiro no estado do Missouri, em mais uma votação que mostra a influência dos juízes nomeados pelo Presidente Donald Trump. Em 2014 e 2018, antes da nomeação dos juízes Neil Gorsuch e Brett Kavanaugh, o tribunal suspendeu o cumprimento da sentença em causa por duas vezes.
O caso foi apresentado por Russell Bucklew, condenado à morte em 1997 no estado norte-americano do Missouri. Nessa altura, o tribunal deu como provado que Bucklew sequestrou e violou a sua antiga namorada, matou o homem que vivia com ela e feriu um agente da polícia.
Nos últimos anos, com a data da sentença já marcada, o prisioneiro deixou de contestar a sua condenação e começou a pedir que o método de execução fosse a câmara de gás e não a injecção letal.
Bucklew tem uma doença chamada hemangioma cavernoso, que causou o aparecimento de tumores na sua face, cabeça, pescoço e garganta. Segundo o prisioneiro, a longa espera pelo momento de uma execução por injecção letal, deitado numa cama, pode provocar o rebentamento desses tumores e infligir-lhe uma “agonia excessiva” – o que poderia ir contra a Oitava Emenda da Constituição dos EUA, que proíbe uma “punição cruel e incomum”. Em alternativa, Bucklew sugeriu a execução numa câmara de gás.
Tanto em 2014 como em 2018, o Supremo Tribunal suspendeu a execução à última hora, adiando também uma decisão final sobre os argumentos de Russell Bucklew.
No ano passado, a suspensão foi decidida com cinco votos a favor e quatro contra, com os quatro juízes liberais a votarem a favor e quatro conservadores a votarem contra – o empate foi desfeito pelo juiz Anthony Kennedy, um conservador que votou várias vezes ao lado dos liberais, como no caso da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, em 2015.
Mas o juiz Kennedy abandonou o Supremo Tribunal em Julho de 2018, de livre vontade, e abriu a porta a mais uma nomeação do Presidente Donald Trump, que já tinha nomeado o conservador Neil Gorsuch em 2017. Para substituir Kennedy, um conservador com uma forte tendência centrista, o Presidente norte-americano escolheu o conservador convicto Brett Kavanaugh, que chegou ao Supremo em Outubro de 2018 no final de um processo de nomeação e confirmação marcado por acusações de abuso sexual.
Quando o caso de Russell Bucklew voltou ao Supremo, este ano, o equilíbrio que era garantido pelo juiz Kennedy já tinha dado lugar a uma tendência marcadamente conservadora: cinco juízes mais à direita (Neil Gorsuch, Brett Kavanaugh, John Roberts, Clarence Thomas e Samuel Alito) e quatro mais à esquerda (Ruth Bader Ginsburg, Stephen Breyer, Sonia Sotomayor e Elena Kagan).
Esta segunda-feira, foi anunciada a decisão da terceira análise do Supremo Tribunal sobre o processo de Russell Bucklew: “A Oitava Emenda proíbe métodos cruéis e incomuns”, disse o juiz Brett Kavanaugh, “mas não garante a um prisioneiro uma morte sem dor”. Na decisão, a maioria disse também que Bucklew não demonstrou que a morte na câmara de gás seria menos dolorosa.
“Tal como foi entendida na origem, a Oitava Emenda tolerava métodos de execução, como o enforcamento, que envolviam um risco de dor significativo, e considerava cruéis apenas os métodos que intensificavam a sentença de morte com uma dose excessiva de terror, dor ou desonra”, escreveu Neil Gorsuch.
O juiz nomeado pelo Presidente Trump acusou Russell Bucklew de querer adiar a execução através de “processos atrás de processos”.
“O povo do Missouri e as vítimas que sobreviveram aos crimes do sr. Bucklew merecem mais do que isso”, disse Gorsuch.
O juiz Stephen Breyer, que falou em nome dos quatro juízes derrotados na votação, disse que o queixoso conseguiu provar que a injecção letal poderia causar – no seu caso, e apenas no seu caso – “um sofrimento constitucionalmente inadmissível”, e que, “apesar disso, a maioria dos juízes decidiu que o estado pode executá-lo”.