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Sub-30: o corpo de João Pedro Fonseca é o pincel que dá forma ao que lhe vai na cabeça
A arte surgiu na vida de João Pedro Fonseca por “uma questão de muitos acasos”. O primeiro terá sido o facto de ter sido uma criança “muito imaginativa”, mas cuja criatividade só começou a ser exteriorizada quando foi para a escola: “Fui obrigado a partilhar todo o meu processo criativo, que acontecia dentro da minha cabeça, com algo fora de mim, físico”, conta o artista plástico de 28 anos. “E acredito que tudo na arte veio através desse processo de dar e receber entre o mundo interior e exterior.”
Ainda agora é assim: o que faz nasce de uma ideia trabalhada interiormente e só depois exteriorizada. “E o processo de materialização às vezes é uma consequência da qual eu não estou à espera” — aquilo que durante um mês é idealizado em vídeo, pode nunca resultar quando extravasado. Vale-lhe, então, a versatilidade: se o primeiro plano não funcionar, parte para a fotografia, pintura, instalação ou performance. E é nesse “balancear de procura de materialização” que o artista trabalha o “aspecto criativo”, desprendendo-se de uma só vertente e conseguindo, desta forma, “explorar as ideias”.
Apesar de ter como base a pintura e o desenho, João Pedro expande as suas obras para outros campos artísticos. Quando foi para a Faculdade de Belas Artes, em Lisboa, entrou em contacto com a performance e percebeu como o próprio corpo "pode ser matéria, material riscador”, em vez dos tradicionais lápis e pincéis — e como há ideias que deixam de estar “estagnadas” se puderem ser contadas de outra forma, sem limitação de materiais e áreas artísticas. Em 2014, o artista contava ao P3 como descobriu o mundo da perfomance graças a uma mancha de tinta branca que lhe caiu na mão, enquanto pintava em tons de preto.
O convite do encenador Carlos Pimenta para trabalhar com vídeo e cenografia na ópera L’Isola Disabitata chegou em 2016 e foi uma espécie de passaporte para o mundo das artes performativas e cénicas. Nos palcos dos teatros, João Pedro encontrou uma tela semelhante à que estava habituado: “Um espaço branco, onde tudo pode ser feito.” Sentiu-se confortável e deixou-se ficar por lá. Desde então, já trabalhou com o dramaturgo e encenador Mickaël de Oliveira, o coreógrafo Miguel Moreira e, recentemente, Olga Roriz: esteve envolvido na concepção cenográfica e vídeo da ópera O Castelo do Barba Azul e A Voz Humana — com encenação da coreógrafa —, apresentada nos dias 6, 8 e 10 de Março, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa.
Paralelamente, continua a trabalhar de forma independente. E fora dos teatros gosta de ser o protagonista das suas obras. Não só para “perceber como funciona o espaço e o corpo”, mas também porque não sabe o que alguém contratado para executar as suas peças “iria tirar dali”. Ainda que o erro não o incomode: “Tem de haver uma grande base de experimentação e falha para humanizar a peça”, acredita. Exemplo disso é a obra Anatomia da Extinção, para a qual convidou performers, sem lhes dar qualquer indicação, para que entrassem “na incógnita” e “tentassem perceber o que iriam fazer”. Ainda assim, o artista considera-se “racional demais”. Em todas as criações, deixa — propositadamente — uma parte “a que se pode chamar de fé ou incógnita”, para que se consiga descobrir a ele próprio. Ou para que o descubram. “Quanto mais as pessoas interpretam as minhas peças, mais me vou conhecendo. Eu vou pensando ‘se calhar esta pessoa tem razão e eu fiz isto porque estava em tal situação’”, explica.
Não sabe se o público entende o seu trabalho — “às vezes também não percebo muito bem o que faço”, sorri. “Embora seja conceptual.” E acredita que “a apreciação é uma coisa muito geográfica e cultural”: se apresentar uma peça como Cordeiro de Deus — onde surge completamente despido e banhado em tinta vermelha — em Lamego, de onde é natural, “as pessoas vão pensar ‘este gajo é grande maluco’”; em Lisboa, o público “vai tentar perceber o porquê daquele nome, cor e local”.
Em vista está a realização de uma curta-metragem, “experimental ou não”, e um tríptico de vídeo-arte, onde irá abordar “uma narrativa de algo interior e exterior da sociedade, tanto a nível religioso, como humanista”. Sempre em tons de cinzento, “a melhor posição para conseguirmos ver as coisas porque nunca estamos num extremo”. O que “é mais interessante e estimulativo”. “É a minha cor favorita.”
A série Sub-30 dá a conhecer jovens talentos portugueses.