Fotografia
Macau, onde a pobreza vive paredes meias com o luxo
Macau será, em 2020, o lugar mais rico do mundo, de acordo com previsões do ano passado do Fundo Monetário Internacional. Tal como 99% da riqueza mundial se concentra no famoso 1% da população, também neste caso será num pequeno troço de terra (30,5 quilómetros quadrados), habitado por pouco mais de meio milhão, que se irá encontrar a maior fortuna do globo.
Em Outubro de 2018, a pedido do jornal inglês The Guardian, o fotógrafo Gonçalo Lobo Pinheiro percorreu vários distritos do antigo território português e encontrou assimetrias no tecido urbano que tornam claro que nem todos irão beneficiar dessa mudança. A série fotográfica que então desenvolveu, intitulada Multibillion-dollar Macau: a City of Glitz and Grit — que foi recentemente distinguida nos Chromatic Photography Awards e Monochrome Photography Awards —, revela que existe um fosso entre os vários estratos socio-económicos da população macaense. No topo da estrutura, os muito ricos pagam por uma noite num hotel de luxo a mesma quantia que um imigrante recebe por um mês de trabalho.
"[Em Macau,] há arranha-céus de milhares de milhões de dólares ao lado de prédios de apartamentos decadentes", descreve o fotógrafo, em comunicado dirigido ao P3. A acumulação de riqueza de Macau deve-se, sobretudo, à receita fiscal proveniente do jogo — negócio que foi liberalizado em 2002, altura em que a região administrativa especial chinesa ganhou a alcunha de "Las Vegas do Oriente". "Em 2017, o governo anunciou reservas fiscais no total de 5,2 mil milhões de euros", refere Lobo Pinheiro. "No entanto, apesar da enorme riqueza da cidade e da pequena população de apenas 653.100 habitantes, a pobreza ainda é uma questão premente." De acordo com dados fornecidos pela Cáritas de Macau ao The Guardian, cerca de 10% da população vive na pobreza e 4% vive mesmo em estado de carência alimentar.
No terreno, o fotógrafo português radicado em Macau conheceu a chef de cozinha indonésia Roy Wardha, de 38 anos. Trabalha seis dias por semana e ganha 865 euros por mês; vive em San Can Tang num apartamento de 40 metros quadrados que partilha com 11 companheiros. A sua cama num beliche, em regime de camarata, tem o custo mensal de 130 euros; todos os meses, envia 350 euros para a família, na Indonésia. Ao The Guardian disse que "gostaria que a vida fosse mais justa, em Macau". "Gostava de receber o mesmo salário que um cidadão macaense pelo mesmo trabalho", confessa. Na região, não existe a protecção legal de um salário mínimo e a população imigrante, composta por cerca de 180 mil pessoas, encontra-se particularmente desprotegida.
Em 2020, Macau será o lugar mais rico ou o mais desigual do mundo? Eis a pergunta que o ensaio fotográfico de Lobo Pinheiro parece deixar no ar.