A China sem preconceitos nem subserviência
Nem Portugal se deve limitar ao papel de cavalo de Troia, nem deve submeter-se ao medo do “perigo amarelo” com que alguns países se tentam proteger do protagonismo chinês.
Há uma excelente discussão sobre a relação entre Portugal e a China que está a ser feita com quase dez anos de atraso: a que reflecte sobre a qualidade dos investimentos feitos pelos chineses ou, visto de outra perspectiva, sobre a pertinência de se alienarem activos estratégicos a uma potência emergente que nos pode usar como um cavalo de Tróia na sua estratégia europeia.
Hoje, já não há mais jóias da coroa como a EDP para vender nem Portugal se encontra no limiar da bancarrota para ter de vender a eito o seu melhor património. Não vale a pena lamentar o passado. O que é crucial é discutir o futuro.
Uma parceria estratégica com a potência emergente da geopolítica mundial é um objectivo primordial de que qualquer diplomacia com o mínimo de ambição. Neste particular, Portugal está numa situação confortável desde 2005 e na última década tratou de reforçar esses elos que começam nos negócios e se estendem até à política.
Nessa relação, porém, há duas condições essenciais a verificar: Portugal é um país soberano que dispensa apelos subservientes como o da secretária de Estado do Turismo (“Por favor, usem-nos, como porta de entrada, como cobaias, para testarem a forma de entrarem na Europa”, disse Ana Mendes Godinho); e Portugal tem de manter um equilíbrio entre uma relação aberta com a China sem nunca por em causa a prioridade do seu compromisso com a União Europeia.
Esgotada a fase da venda de activos estratégicos (porque infelizmente já só restam os dedos), a relação com a China tem de ser intensificada através do investimento que crie riqueza em Portugal, que aproveite a tecnologia nacional, os recursos humanos e a proximidade dos mercados europeus, como recomenda o Governo. Mas deve ser feita numa paridade que até agora esteve longe de existir.
Nem Portugal se deve limitar ao papel de cavalo de Troia, nem deve submeter-se ao medo do “perigo amarelo” com que alguns países se tentam proteger do protagonismo chinês. Aberta uma nova fase no relacionamento entre os dois países, Portugal tem a ganhar com o abraço do gigante, desde que não seja demasiado apertado.
Um abraço que permita ao país salvaguardar os seus interesses e permanecer do lado dos que continuam a lembrar Pequim que na sua extraordinária ascensão há ainda um cadáver no armário: o da democracia e do respeito pelos Direitos Humanos.