Quatro pratos de peixe para o Inverno

Falámos com quatro chefs que se preocupam com a sazonalidade dos peixes que colocam na carta. Quais são os que estão no seu melhor durante os meses de Inverno?

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Como se escolhe e como se prepara um prato de peixe tornando-o reconfortante para os dias de Inverno? Quatro ideias de chef

João Oliveira, azevia

O prato podia ser feito com linguado, mas na maior parte dos dias, João Oliveira (Vista, Bela Vista Hotel, praia da Rocha, Portimão, uma estrela Michelin) usa a azevia. “É um primo do linguado, muito semelhante, um pouco mais pequeno e que é muito desvalorizado”, explica. Sendo mais barato que o linguado, tem “um sabor muito mais característico”.

E, tal como o linguado, também a azevia está no seu melhor nesta altura do ano. “Como as águas estão mais frias e mais revoltas, o peixe, que é de areia, recolhe para águas um pouco mais fundas e a alimentação altera-se também um pouco, come mais mariscos, mais algas”, diz o chef. Por causa disso, “desenvolve uma camada de gordura entre a pele e a carne, que não aparece no Verão, quando as águas estão mais quentes”.

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João Oliveira dr

Para o prato que usa no seu menu, João aproveita precisamente essa gordura. Fileta a azevia, “cola” de forma natural os dois filetes e cozinha o peixe com a gordura extraída das cabeças e das peles, à qual junta apenas um pouco de azeite.

Serve com camarão da costa — “que faz parte da alimentação da azevia e do linguado” —, rebentos de beldroegas, amêndoa em pickle (uma conserva que fez há quatro meses com amêndoas frescas) e sementes de mostarda. Junta ainda um molho à base de biqueirão, “mas que em vez de ser salgado é avinagrado, para criar um contraste com a parte mais doce e fresca do peixe”. A este prato chama apenas Azevia, Biqueirão e Amêndoa.

Tiago Feio, garoupa

Nesta época do ano, Tiago Feio tem no Leopold (Palácio Belmonte, Lisboa) um prato com garoupa. “O que faço com a Nutrifresco [a empresa de fornecimento de peixe de Pedro Bastos] é ligar-lhes na véspera, por volta da meia-noite, e perguntar-lhes qual o peixe do dia.” Assim, apesar de ter que fazer alterações no menu em função do que o mar deu, tem a garantia de que trabalha com o peixe mais fresco e que está em melhores condições. “No menu digo apenas que é peixe do dia e altero o prato conforme o que recebo.”

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Garoupa, o prato de Tiago Feio Miguel Manso

Por estes dias de início de tempo frio, o mar tem dado com frequência garoupa. E Tiago cozinha-a também com sabores mais invernosos do que os que escolheria para um prato de peixe no Verão. Usa os cuscos de Trás-os-Montes, que cozinha “como se fosse um arroz malandro, dando-lhe uma textura cremosa”. Faz também um caldo de cebola “que dá ao prato uma profundidade de sabor” e termina-o com trigo sarraceno, para uma textura mais crocante, e halófitas da ria Formosa.

“Gosto de jogar com as texturas”, explica. “Compro geralmente peixes com 10 ou 12 quilos, carnudos, que oferecem alguma resistência na boca.” Quanto ao sabor, a garoupa “é um peixe suave”, por isso os restantes sabores também não podem impor-se demasiado, sendo o mais profundo o da cebola, mesmo assim com um ligeiro toque adocicado.

Miguel Rocha Vieira e Gil Fernandes, pargo

Gil Fernandes, o sous-chef da Fortaleza do Guincho (Lisboa, uma estrela Michelin), onde trabalha com o chef Miguel Rocha Vieira, não hesita quando lhe perguntamos se se vê claramente a diferença de alguns peixes nesta época. “Sem dúvida que vemos a diferença entre um peixe que está gordo e um que não está.”

Um dos peixes que estão a trabalhar neste momento é o pargo que, apesar de estar melhor agora, apresenta uma certa estabilidade ao longo do ano. Uma das vantagens é que “não é necessário colocar gordura extra” — cozinham-no a baixa temperatura precisamente para “valorizar a gordura natural que ele tem”.

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Pargo, o prato de Miguel Rocha Vieira e Gil Fernandes dr

No prato usam bolbo de funcho, em puré, e também funcho do mar, apanhado na costa do Guincho, em redor da Fortaleza, enquanto na zona da serra apanham o funcho selvagem com o qual fazem um vinagrete. Há ainda um outro molho feito com uma redução de vinhos montada com manteiga.

Outra das vantagens dos peixes nesta época, diz Gil Fernandes — “e não é só o pargo, em breve o robalo e a dourada vão estar em força” — é o facto de terem ovas, que no restaurante são também sempre aproveitadas. “Temos um carinho especial pelas ovas, que fazemos muitas vezes num prato a que chamamos ovada, salteadas com legumes.”

Miguel Laffan, robalo

“Adoro o robalo nesta altura”, diz Miguel Laffan, que tem no restaurante Atlântico (Hotel Intercontinental Estoril) um prato de robalo da linha com molho à francesa. “As águas estão mais frias, os peixes nadam menos e ficam mais gordos. Há uma ligação directa entre a textura dos peixes e a temperatura das águas.” Além disso, acrescenta, nesta época “sabem mais a mar e a crustáceos”.

O trabalho de um cozinheiro é precisamente tirar partido das melhores características de cada produto que utiliza nas diferentes épocas e estações. “Como agora os robalos estão gordos e têm mais gelatina, o que faço é um caldo com as cabeças e as espinhas. Adoro a reacção destes peixes com o seu próprio caldo e acho que é um prato que, com a temperatura que está lá fora, dá conforto.”

O peixe que serve no Atlântico é cozinhado a vácuo apenas com um pouco de manteiga e servido com um creme de champanhe e açafrão (“que é a especiaria de que mais gosto”) com legumes biológicos salteados, couves quando há, e “um pouco de raspa de limão de conserva e aneto, para dar algum exotismo”. É, conclui Laffan, “um prato reconfortante”.

Os peixes

Robalo

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Robalo Francisco Pestana /Catálogo Espécies de Mar de Portugal

Tem um corpo alongado de cor cinzento-prateado com reflexos azuis ou verdes. É encontrado no Atlântico Nordeste e mar Mediterrâneo, onde habita junto aos estuários enquanto juvenil, suportando águas de baixa salinidade. Quando adulto habita águas até aos 100m de profundidade. Alimenta-se de crustáceos, peixes e moluscos. Reproduz-se de Janeiro a Abril. É a terceira espécie mais produzida por aquicultura em Portugal, depois do pregado e da dourada.

Cherne (mesma família da garoupa)

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Cherne Francisco Pestana /Catálogo Espécies de Mar de Portugal

Tem um corpo robusto, cabeça grande e mandíbula proeminente, com dois espinhos operculares, uma crista óssea e uma coloração castanho-acinzentada ou cinzento-azulada. É encontrado no Atlântico Nordeste e arquipélagos da Madeira e dos Açores, nas camadas superficiais da coluna de água em juvenil e em zonas com profundidades entre os 100 e os 200m em adulto. Os juvenis formam cardumes e encontram-se junto a objectos flutuantes, enquanto os adultos são solitários, podendo ser observados em grutas ou em destroços. Alimenta-se de crustáceos, moluscos e peixes. Reproduz-se de final de Julho até ao início de Outubro, com desovas múltiplas.

Pargo

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Pargo Francisco Pestana /Catálogo Espécies de Mar de Portugal

Tem um corpo oval, robusto, rosa prateado com uma linha lateral distinta de escamas até à barbatana caudal. É encontrado no Atlântico Nordeste, no Arquipélago da Madeira e mar Mediterrâneo, onde os juvenis se encontram em zonas pouco profundas e abrigadas, migrando para zonas mais profundas ao longo da vida, até aos 300m. Alimenta-se de outros peixes, crustáceos e cefalópodes. Reproduz-se na Primavera e início do Verão.

Sargo

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Sargo Francisco Pestana /Catálogo Espécies de Mar de Portugal

Tem um corpo oval de cor prateada, com nove bandas negras verticais e uma mancha negra característica junto à barbatana caudal. É encontrado no Atlântico Nordeste, Arquipélago da Madeira e mar Mediterrâneo, onde habita estuários em juvenil e profundidades até 150m em adulto. Alimenta-se principalmente à noite de moluscos, crustáceos, ouriços-do-mar e algas que encontra no fundo. A reprodução ocorre no final do Inverno e início da Primavera, momento em que forma grandes cardumes.

Linguado

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Linguado Francisco Pestana /Catálogo Espécies de Mar de Portugal

Muito semelhante ao linguado-do-Senegal (Solea senegalensis), tem um corpo oval e achatado, habitualmente de cor branca na parte inferior e castanha escura na parte superior, onde se encontram ambos os olhos. Assemelha-se ao fundo onde habita, o que lhe permite camuflar-se. É encontrado no Atlântico Nordeste e mar Mediterrâneo; os adultos habitam em zonas costeiras até 200m de profundidade e os juvenis preferem estuários. Alimenta-se de pequenas minhocas, moluscos e pequenos crustáceos. Reproduz-se de Janeiro a Abril.

Dourada

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Dourada Francisco Pestana /Catálogo Espécies de Mar de Portugal

Tem um corpo muito ovalado de cor cinzento-prata e uma mancha dourada entre os olhos, origem do nome “dourada”. É encontrada no Atlântico Nordeste e mar Mediterrâneo, onde habita a coluna de água em zonas até 150m de profundidade. Vive solitária ou em pequenos grupos e alimenta-se de moluscos, crustáceos e ouriços-do-mar. Reproduz-se de Outubro a Dezembro e, apesar de desovar no mar, os juvenis procuram a protecção dos estuários para se desenvolverem. É pescada com arrasto e redes de emalhar, sendo a segunda espécie mais produzida por aquicultura em Portugal, apenas ultrapassada pelo pregado

Goraz

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Goraz Francisco Pestana /Catálogo Espécies de Mar de Portugal

Tem um corpo oval de tons avermelhados com uma mancha negra junto à cabeça e o interior da boca é laranja-avermelhado. É encontrado no Atlântico Nordeste, onde habita junto ao fundo marinho até aos 700m, mas os juvenis vivem mais junto da costa, em cardumes. Alimenta-se de crustáceos, moluscos e pequenos peixes. Reproduz-se no Verão e no Outono. É pescado com palangre de fundo, mas tem sido alvo de estudos para a sua produção em aquicultura.

Espadarte

Tem um corpo largo e robusto, sem escamas, negro azulado no dorso e mais claro no ventre, com um focinho alongado que forma uma característica espada achatada que usa para dividir os cardumes e para se defender. É encontrado no Atlântico Nordeste e mar Mediterrâneo, onde habita na coluna de água até aos 800m de profundidade. É solitário, altamente migrador, muito voraz e agressivo, ingerindo as suas presas de uma só vez. Reproduz-se de Janeiro a Outubro, desovando em águas mais quentes e migrando para águas mais frias para se alimentar de cefalópodes e de um largo espectro de peixes.

Fonte: As espécies mais populares do mar de Portugal/Ciência Viva

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