Haddad e Bolsonaro mantêm uma tensão de cortar à faca
O candidato petista continua a lutar por apoios na segunda volta, rendendo-se até a notícias de veracidade duvidosa, enquanto o clã Bolsonaro faz declarações que põem em causa as instituições.
Com a campanha eleitoral a aproximar-se do fim no Brasil, o que já era um clima tenso tornou-se uma nuvem pesada. As declarações bombásticas do clã Bolsonaro, com o filho Eduardo a dizer que seria fácil encerrar o Supremo Tribunal Federal, e o pai, Jair, candidato à presidência da República, a prometer “uma faxina” no Brasil depois de ser eleito, em que “os marginais vermelhos ou vão para fora ou vão para a cadeia”, o rival de esquerda na corrida tenta ganhar algum fôlego.
Mas isso não quer dizer que Fernando Haddad, o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT), tenha sido bem-sucedido. Numa entrevista conjunta aos jornais Globo, Valor Económico e Extra e revista Época, repetiu a acusação feita no fim-de-semana pelo músico Geraldo Azevedo, num espectáculo na Bahia, em que disse ter sido torturado numa das vezes em que foi preso, durante o regime de ditadura militar, pelo vice de Bolsonaro, o general na reserva Hamilton Mourão. Isso teria acontecido em 1969 – só que nessa altura Hamilton Mourão tinha apenas 16 Anos.
“Esse cara bebeu [Azevedo]. Observe que, em 1969, eu estava no Colégio Militar, em Porto Alegre, no 1º ano do 2º grau”, disse Mourão ao jornal O Globo, prometendo processar o cantor, que entretanto admitiu que pode ter confundido os nomes. Uma consulta feita à Comissão da Verdade não mostra nenhuma citação do general, que entrou para o exército em 1972, diz o jornal Extra, um dos mais populares na zona do Rio de Janeiro.
Foi um passo em falso para o candidato do PT, que luta contra a campanha do rival muito baseada nem avalanches de notícias fabricadas, muitas delas enormidades que parecem saídas do velhinho Jornal do Incrível mas que têm público cativo nos eleitores dispostos a acreditar que Lula da Silva e o seu partido são capazes de tudo.
Antes, os esforços de Haddad para conquistar apoios para uma frente democrática anti-Bolsonaro até pareciam estar a dar alguns sinais de vida.
Houve finalmente a declaração de apoio de Marina Silva, a seis dias da votação da segunda volta das presidenciais. A ex-ministra de Lula, mas que abandonou o Governo com um profundo ressentimento contra o PT já tinha apelado aos seus eleitores para não votarem em Jair Bolsonaro, mas entendeu ser necessário oferecer o seu “voto crítico” a Haddad por considerar que uma vitória do ex-capitão do exército traz vários riscos o para o futuro do Brasil.
Na primeira volta, Marina Silva teve apenas 1% - está bem distante dos 20% que obteve na primeira volta das presidenciais de 2014, em que concorreu contra Dilma Rousseff.
Ainda assim, Haddad agradeceu, numa mensagem partilhada no Twitter. O candidato do PT assumiu que o voto de Marina o honra, “por tudo que ela representa e pelas causas que defende”.
E despertou também alguma esperança de obter ainda algum apoio da parte do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, com quem falou por telefone na segunda-feira, para debater “a escalada de ataques do seu adversário, Jair Bolsonaro, a várias instituições” brasileiras.
Os juízes do Supremo declararam a sua indignação após ser divulgado um vídeo em que Eduardo Bolsonaro – que a 7 de Outubro foi eleito deputado com mais votos do que qualquer outro na história do Brasil – garantia que para fechar o Supremo bastava “um soldado e um cabo”. O ex-Presidente tinha dito, no Twitter, que “as declarações do deputado Eduardo Bolsonaro cheiram a fascismo”, e “merecem repúdio dos democratas.”
Fernando Henrique, cujas relações com Lula da Silva azedaram, chegou a dizer que havia uma porta para o diálogo com Fernando Haddad, a seguir à primeira volta. Mas logo a seguir afirmou que a porta se tinha “enferrujado” e nunca houve uma conversa aprofundada entre ambos, com vista a um apoio entre a parte mais tradicional do Partido da Social Democracia Brasileira, os chamados “cabeças brancas” – outra, a dos “cabeças pretas”, líderes mais jovens, com pensamento mais à direita, rendeu-se a Bolsonaro.
Haddad diz manter a esperança até ao fim. Interrogado sobre arrependimentos nesta campanha, durante um encontro com pastores evangélicos no Rio de Janeiro, o candidato petista assegura que não se arrepende de nada e acredita que há a possibilidade de criar uma onda favorável à sua candidatura até ao momento em que os eleitores forem votar no domingo, na segunda volta, relata a Folha de São Paulo. “Para quem está há [apenas] 45 dias em campanha, os resultados são extraordinários.”