Sabores dos cigarros electrónicos podem danificar vasos sanguíneos e coração

Fumar cigarros electrónicos pode não ser mais seguro do que os tradicionais, alerta investigadora.

Foto
REUTERS/Phil Noble

De acordo com uma experiência conduzida por investigadores da Universidade de Boston, EUA, os líquidos dos cigarros electrónicos com aromas como cravo e baunilha podem danificar as células dos vasos sanguíneos e do coração, mesmo quando não contêm nicotina.

Os investigadores examinaram o que acontece em testes de laboratório quando expõem células endoteliais – aquelas que revestem artérias e veias, bem como o interior do coração –, a uma variedade de sabores populares de cigarros electrónicos. Testaram o efeito de diferentes doses e concentrações de nove sabores químicos populares: banana, manteiga, canela, cravo, eucalipto, menta, morango, baunilha e “queimado” – este último, também usado para reproduzir um sabor de pipoca ou tabaco.

Em altas concentrações, nos testes de laboratório, todos os nove aromas danificaram células, relatam os investigadores no estudo publicado da Arteriosclerosis, Thrombosis and Vascular Biology. Cinco dos sabores (baunilha, hortelã, canela, cravo e queimada) comprometeram a produção prejudicada de óxido nítrico, uma molécula que inibe a inflamação e a coagulação e ajuda os vasos sanguíneos a dilatar, em resposta ao aumento do fluxo sanguíneo.

"A perda de óxido nítrico é importante porque tem sido associada a consequências de doenças cardíacas, como ataques cardíacos e derrames", comenta Jessica Fetterman, investigadora principal, da Faculdade de Medicina da Universidade de Boston, à Reuters por e-mail. "É uma das primeiras alterações que observamos nos vasos sanguíneos na progressão para doenças cardíacas e serve como indicador precoce de toxicidade. O estudo sugere que os aditivos aromatizantes em si, na ausência de outros produtos ou componentes de combustão, causam danos cardiovasculares."

Algumas das grandes empresas de tabaco dos EUA estão neste momento a desenvolver cigarros electrónicos. Os aparelhos apresentam uma ponta reluzente e um elemento de aquecimento que transforma a nicotina e os aromas líquidos numa nuvem de vapor que a pessoa inala.

Foto
Unsplash/ Itay Kabalo

Mesmo quando os líquidos electrónicos não contêm nicotina, os pulmões são expostos a produtos químicos aromatizantes, quando os vapores são inalados. Enquanto muitos dos aromas são considerados seguros para comer, existe investigação anterior que sugere que a inalação de vapor desses produtos químicos pode danificar os pulmões.

Neste estudo mais recente, os investigadores testaram células de nove não-fumadores e 12 fumadores de cigarros tradicionais. Também testaram algumas células endoteliais de corações humanos, que podem ser compradas. Os testes mostraram que mesmo antes de serem expostos a aromas químicos, as células dos fumadores de tabaco já tinham uma capacidade reduzida de produzir óxido nítrico. As células de não fumadores apresentaram uma produção de óxido nítrico prejudicada depois de serem expostas a aromas químicos.

O estudo apresenta algumas limitações: além da pequena dimensão dos observados, não foi uma experiência desenhada para provar se ou como os aromas químicos poderão causar danos directos aos vasos sanguíneos ou resultar em problemas cardíacos. Também não é evidente que a exposição a aromas químicos possa ser melhor ou pior para a saúde do que a nicotina, que também afecta os vasos sanguíneos e o coração.

"Já sabemos que o fumo do tabaco afecta as células endoteliais, levando a doenças cardiovasculares", explica Irfan Rahman, investigador do Centro Médico da Universidade de Rochester, em Nova Iorque, que não esteve envolvido no estudo. Os resultados actuais sugerem que fumar cigarros electrónicos não é mais seguro do que fumar cigarros tradicionais, comenta por e-mail.

Os consumidores poderão ter alguma dificuldade em determinar a quantidade de produtos químicos nos cigarros electrónicos, dificultando a tentativa de evitar doses mais altas, segundo Prue Talbot, investigadora de biologia molecular da Universidade da Califórnia em Riverside, que também não participou no estudo.

"Actualmente, é difícil para o consumidor controlar a exposição a substâncias químicas de sabor", diz por e-mail. "Os fabricantes não listam os produtos químicos com sabor e as concentrações nos produtos, por isso os consumidores não têm uma maneira simples de identificar os produtos que não escolheriam se tivessem mais informações sobre seu conteúdo", atira.

Ainda assim, as pessoas não fumam cigarros electrónicos há tempo suficiente para que os cientistas tenham uma imagem clara de quaisquer problemas de segurança, especialmente no que diz respeito a fumar sem nicotina, diz Maciej Goniewicz do Roswell Park Comprehensive Cancer Center em Buffalo, no estado de Nova Iorque.

“Os produtos de tabaco combustíveis já libertam muitos tóxicos que causam doenças cardiovasculares, mas a situação pode ser diferente para os cigarros electrónicos que não queimam tabaco”, aponta Goniewicz. "Acho que é importante comparar, em estudos futuros, a toxicidade cumulativa do aerossol do cigarro electrónico inalado com e sem produtos químicos aromatizados."