Sarkozy detido e interrogado sobre financiamento líbio à campanha de 2007

Antigo Presidente é acusado de ter ultrapassado o limite imposto pela lei ao financiamento de campanhas. Adensando a polémica, foi Khadafi quem lhe deu 50 milhões de euros, em troca de apoio internacional.

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Sarkozy e Kadhafi em Paris em 2007 Reuters/POOL

O ex-Presidente francês Nicolas Sarkozy foi ontem detido para ser interrogado pela polícia de Naterre. É primeira vez que o antigo chefe de Estado é directamente questionado pelas autoridades relativamente a esta investigação sobre possível financiamento ilegal, com origem no regime líbio de Muammar Kadhafi, da campanha eleitoral que o levou ao Eliseu em 2007.

Este caso está sob investigação desde 2013, mas as suspeitas foram tornadas públicas antes e pela mão do próprio regime de Khadafi. As primeiras denúncias surgiram numa altura em que as relações diplomáticas entre França e Líbia se desmoronaram depois de um período de cooperação próxima.

Em 2011, quando a França encabeçou uma missão da NATO para uma intervenção militar na Líbia – que contribuiu para a queda e posterior morte de Khadafi - Saif al-Islam, filho do antigo líder líbio (que anunciou que pretende candidatar-se à presidência da Líbia nas marcadas para o final do ano), respondeu: “Sarkozy tem de primeiro devolver o dinheiro que levou da Líbia para financiar a sua campanha eleitoral”.

Este mau momento seguiu-se a anos de relações muito próximas entre Paris e Trípoli. Ou, melhor dizendo, entre Sarkozy e Khadafi – por exemplo, a pompa e circunstância que marcou a visita do líbio à capital francesa em 2007, numa altura em que era acusado de violação dos direitos humanos e em que a maioria dos países ocidentais lhe tinha virado costas, causou polémica. O líbio tentava por esta altura reaproximar-se do Ocidente e tentar limpar a sua imagem para o exterior.

No ano seguinte ao degradar das relações entre ambos os países, e das declarações de Islam, o site Mediapart publicou um documento, de 2006 (quando Sarkozy era ministro do Interior), assinado pelo chefe dos serviços secretos líbios na altura, Moussa Koussa, onde se lia que Muammar Khadafi estava pronto, “em princípio”, a financiar a campanha de Nicolas Sarkozy para as eleições presidenciais de 2007, com 50 milhões de euros - ultrapassando o tecto legal de 22,5 milhões de euros permitidos em cada campanha. No entanto, não se especificava se o financiamento se tinha concretizado.

Em 2016, chegou mais uma denúncia que reacendeu todo o escândalo. Às autoridades, e também em público através de uma entrevista ao Mediapart, o empresário franco-libanês Ziad Takieddine disse que fez três viagens de Trípoli até Paris com malas de dinheiro que deveriam ser entregues ao então chefe de gabinete de Sarkozy, Claude Guéant (que foi mais tarde ministro do Interior). Em concreto, Takieddine afirma que, em cada viagem, transportou uma mala com 1,5 a dois milhões de euros em notas de 200 e 500 euros. Malas que, segundo disse na altura, lhe foram entregues pelo chefe dos serviços de informação de Khadafi, Abdallah Senoussi.

Este testemunho corrobora o de Senoussi (cunhado de Kadhafi), que, em Setembro de 2012, confirmou, numa audiência no Tribunal Penal Internacional, a existência de financiamento líbio à campanha presidencial de Sarkozy. E também o conteúdo de um bloco de notas do ministro do Petróleo de Khadafi, Choukri Ghanem, encontrado depois da sua morte em 2012, onde são feitas referências a transferências para Sarkozy.

Outro dos factos em investigação foi a compra de um apartamento em Paris por parte de Gueant três meses depois da vista de Khadafi a Paris. O antigo chefe de Gabinete de Sarkozy pagou 500 mil euros pelo imóvel, montante que lhe chegou à conta de forma repentina e sem explicação. Gueant afirmou que o dinheiro foi obtido pela venda de dois quadros. Mas as autoridades suspeitam que o montante chegou da Líbia através de um outro intermediário: o empresário Alexandre Djouhri.

Djouhri foi detido em Janeiro deste ano em Londres acusado de fraude e lavagem de dinheiro. De acordo com o que foi noticiado pela imprensa francesa, o empresário sofre de problemas cardíacos, tendo passado dez dias hospitalizado. Em Julho, haverá decisão por parte da justiça britânica sobre um pedido de extradição para França.

Brice Hortefeux, político próximo de Sarkozy, e que serviu como ministro do Interior durante a sua presidência e a de Jacques Chirac, foi também interrogado durante a mesma operação, deu conta a imprensa francesa. Porém, não foi detido.

Agora, e segundo a legislação gaulesa, Sarkozy poderá ficar detido 48 horas. Passado esse período, o antigo Presidente francês poderá ser apresentado a juízes para ser formalmente acusado.

Sarkozy, que foi Presidente entre 2007 e 2012, negou sempre qualquer envolvimento líbio na sua campanha presidencial de 2007, dizendo que as alegações eram “grotescas”.

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