“Ninguém deverá cuidar da coluna porque dói, mas sim porque tem coluna”

O quiroprático Pedro Figueira publicou o livro Acabe com as Dores nas Costas. Quer desafiar as pessoas a serem mais proactivas e a pensarem na saúde da coluna de uma forma diferente.

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Unsplash/ Jacob Postuma

Não seria de estranhar que Pedro Figueira lhe perguntasse com que frequência lava os dentes. O quiroprático e autor do livro Acabe com as Dores nas Costas quer desafiar as pessoas a pensarem na saúde da coluna de uma forma diferente e usa uma metáfora para explicar porquê. O especialista lembra que há algumas décadas a saúde oral era contemplada de forma bem diferente. “[Hoje] ninguém escova os dentes porque tem dores. Escovamos os dentes porque temos dentes. Ninguém deverá cuidar da coluna porque dói, mas sim porque tem coluna”, explica.

“Todos dizemos que a saúde é um dos bens mais valiosos, mas temos alguma dificuldade em agir. E a coluna não é excepção”, atira. Não escreveu o livro só para avisar que é importante tratar da coluna, até porque, admite, “temos cada vez mais informação, mas não quer dizer que a proactividade das pessoas seja proporcional”. Pretende, antes, motivar as pessoas a responsabilizarem-se pela sua própria saúde. Isso começa, tal como o livro, por esclarecer o que é a dor e para que serve: “A maneira como nos sentimos é um mau juiz da nossa saúde”, escreve. “Se nos limitarmos a esperar pela dor, nunca vamos conseguir resolver o problema.” 

A boa notícia é que, segundo a visão optimista do autor, é possível mudar drasticamente a forma como a higiene da coluna é tida em conta na sociedade. “Alguns dizem que pode ser uma ilusão, mas essa é a minha esperança.” O autor do livro sabe do que está a falar. Além de ser quiroprático há 12 anos, ultrapassou uma lesão grave na coluna, aos 18 anos, quando jogava basquete, e tem hoje uma hérnia discal “muito considerável”, que em condições normais poderia impedi-lo de se mexer.

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Para já, a mudança está nas mãos de cada um e o livro propõe uma série de dicas práticas para melhorar a sua saúde em geral e a da coluna em particular. Tal como devemos usar fio dental diariamente e fazer uma higienização de seis em seis meses, o quiroprático aconselha que se insira na rotina diária uma série de exercícios simples de poucos segundos. O primeiro grupo de exercícios, com uma duração máxima de três minutos, deve ser realizado ao acordar e ao deitar e o segundo grupo, até dois minutos, pode ser feito em qualquer altura do dia, entre duas a quatro vezes.

Já ouviu falar do “pescoço SMS” (text neck, em inglês)? Refere-se à posição frequentemente adoptada quando se usa o telemóvel – ou outros aparelhos –, com a cabeça para a frente, aumentando grandemente o seu peso sobre a coluna. Pedro Figueira chama a atenção para posturas incorrectas como esta, que assumimos em determinados momentos do dia-a-dia. Inclui desde as pequenas tarefas domésticas que fazemos em “piloto automático” à posição da coluna durante a condução.

“Quanto mais comportamentos formos introduzindo, quantos mais hábitos mudarmos, mais eficaz será a mudança. Não é tudo de uma vez, é gota a gota”, aponta o quiroprático. Uma forma eficaz de começar é olhando primeiro para os três locais onde a maioria das pessoas passa mais tempo: a cadeira, a cama e o sofá.

A coluna das crianças não é de borracha

É uma expressão que já todos ouvimos: “a coluna das crianças é de borracha”. Contudo, de acordo com o quiroprático, tal não corresponde à verdade.

Há coisas que estão fora do controlo dos pais. É impossível evitar que os filhos caiam várias vezes quando estão a aprender a andar. Não se deve é pensar que essas quedas são absolutamente inócuas. As crianças, como qualquer ser humano, têm uma colunas e as quedas causam microtraumas equiparáveis, por exemplo, a estar com uma postura torta a ver televisão.

Para clarificar, o quiroprático não sugere que os pais controlem a quantidade de vezes que as crianças caem. Quanto muito, indica, podem ter cuidado em determinadas situações. Mas o mais importante é mesmo terem a consciência de que os bebés nascem já com vértebras e, assim, assumirem uma posição proactiva. Mais uma vez, recorre à metáfora da higiene oral: “Quando nasce o primeiro dente vão ao dentista. Fazendo um paralelo a brincar, digo ‘quando sair a primeira vértebra venha cá para eu ver’”.

Alguns pediatras têm a atenção de passar a mão pela coluna para detectar eventuais desvios grosseiros, mas não é uma avaliação muito detalhada, continua. “Somos avaliados à nascença, mas não testamos a coluna. E porquê? Assumimos esta posição [descrente]: ‘a criança vai nascer já com problemas de coluna?’".

Quanto mais cedo se começar a ter atenção à coluna, melhor esta vai estar à medida que se cresce. Vamos “chegar aos 20 anos um bocadinho melhor, aos 40 anos um bocadinho melhor, aos 60 anos um bocadinho melhor”, aponta Pedro Figueira. O quiroprático recusa a ideia, que mesmo alguns médicos têm, de que uma pessoa mais velha terá, naturalmente, uma coluna em mau estado. Para justificar, traça mais uma comparação à saúde oral: se antigamente as pessoas chegavam a uma certa idade com a boca num mísero estado, actualmente uma pessoa com 80 anos pode ter uns dentes impecáveis.

“Enquanto aceitarmos que a pessoa por ter 60 ou 80 anos tem de ter uma coluna horrível, então não podemos fazer nada”, comenta. Ou seja, precisamos primeiro de compreender que o estado da coluna está nas nossas mãos e não no passar do tempo ou nas circunstâncias inevitáveis do dia-a-dia. Será que essa visão fatalista não é aquilo que falta mudar para realmente mudarmos? 

Acabe com as Dores nas Costas (14,90 euros) é lançado esta terça-feira, às 19h30, na Fnac do Colombo, em Lisboa, com a apresentação de Fátima Lopes, que escreveu o prefácio do livro.

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