“Estou aqui para defender os interesses dos americanos”, disse Trump a Davos
Presidente americano fez discurso suave sobre globalização e comércio internacional e aproveitou para vender cortes de impostos e desregulação aos investidores presentes em Davos.
A falar perante uma plateia de líderes políticos e de negócios de todo o mundo que enchiam por completo a sala principal de Davos, Donald Trump, não demorou mais do que alguns segundos para expressar as duas principais ideias do discurso de cerca de meia hora: “Estou a aqui para defender os interesses dos americanos” e “o mundo está a assistir ao ressurgimento de uma próspera economia norte-americana”, disse.
O Presidente dos Estados Unidos, o primeiro a visitar Davos desde Bill Clinton em 2000, aproveitou a maior parte do seu discurso não a responder à defesa da globalização feita nos dias anteriores por outros líderes mundiais, mas sim a vender a economia norte-americana como o destino ideal para o investimento aos muitos líderes empresariais que estiveram na edição deste ano do Fórum Económico Mundial deste ano.
“Depois de anos de estagnação, a economia norte-americana está a crescer e os mercados estão a bater recordes atrás de recordes”, acrescentou, aproveitando para mandar um recado àqueles que, na plateia, pudessem gostar mais de ver Hillary Clinton no seu lugar. “Se os meus oponentes tivessem ganho – e eu sei que muitos aqui os apoiavam – em vez de uma subida de 50% na bolsa, teríamos uma descida de 50%”.
Para agradar aos líderes das grandes empresas mundiais que o estavam a ouvir, Donald Trump tinha a receita perfeita: menos impostos e menos regulação. Defendeu o corte de impostos realizado (que inclui uma redução do imposto sobre os lucros das empresas de 35% para 21%) e falou daquilo que a sua administração está a fazer relativamente à regulação: “22 menos regulações por cada nova regulação introduzida”.
E, com estes dois trunfos na mão, fez o convite que vários líderes políticos de países de menor dimensão (incluindo Portugal) costumam fazer em Davos: “Agora é o tempo perfeito para trazerem os vossos negócios, empregos e investimentos para os Estados Unidos.”
Só depois se referiu ao tema que mais expectativa causava: a política que os Estados Unidos iriam seguir no comércio internacional. Nos dias anteriores, os chefes de Estados da Índia, França e Alemanha tinham surgido em defesa da globalização e do comércio livre, num evidente recado aos EUA, que na segunda-feira tinham anunciado um aumento de tarifas para alguns produtos importados.
Trump optou, em Davos, por um discurso mais moderado, não anunciando nem ameaçando mais medidas proteccionistas. Disse antes que é favorável ao comércio livre, mas que este precisa de ser justo e recíproco.
O Presidente norte-americano criticou sobretudo práticas como “o massivo roubo de propriedade intelectual e os subsídios públicos”, um ataque implícito à China. “Vamos restaurar a integridade ao nosso sistema comercial”, garantiu.
Trump abriu também a porta à assinatura de acordos comerciais. “Estamos preparados para assinar acordos bilaterais com todos os países que o desejem, incluindo os países do TPP”. O TPP é o acordo comercial entre os países do Pacífico que Obama assinou e Trump cancelou assim que assumiu a presidência.
Alguns minutos antes, numa entrevista à CNBC, Trump tinha dado uma ideia um pouco mais concreta sobre qual é a sua abordagem aos acordos comerciais, reafirmando que dá preferência aos entendimentos feitos individualmente entre países em vez dos acordos assinados por vários países em conjunto. “Eu gosto de acordos bilaterais, porque se surge um problema, podemos terminá-lo. Quando estamos num acordo com muitos países, como acontece com o TPP, não se pode fazer o mesmo”, disse.
Este tipo de opção por negociações bilaterais é uma das explicações para que, para além da saída do TPP, os EUA tenham travado as negociações que estavam em curso com a União Europeia e que estejam ainda a analisar o que fazer ao NAFTA, o acordo em vigor com o México e o Canadá. “O NAFTA é um acordo horrível, estamos a renegociá-lo. Posso terminá-lo ou não, vamos ver o que acontece”, afirmou Trump na mesma entrevista.
No discurso, Trump repetiu as ideias-base da política externa da sua administração, nomeadamente o pedido aos parceiros para gastarem mais com a sua defesa e a defesa da estratégia de pressão à Coreia do Norte e ao Irão.
A seguir ao discurso, em que claramente preferiu fugir a um debate directo com os outros líderes mundiais, Trump respondeu a duas perguntas do presidente do Fórum Económico Mundial, Klaus Schwab, mas este limitou-se a perguntar porque é que tinha decidido cortar os impostos e a pedir-lhe para falar das suas experiências profissionais antes de chegar à presidência. Trump ainda assim aproveitou para fazer um ataque à imprensa. “Foi só quando me tornei político que me apercebi quão má e falsa a imprensa pode ser”, disse. Esse foi o único momento em que se ouviram alguns assobios na sala.
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