A nova geração de governantes sauditas
Mohammed bin Salman sabe que não pode governar sozinho – e com esse objectivo em mente que tem vindo discretamente a promover um grupo de jovens príncipes. Têm pouco mais de 30 anos, são netos ou bisnetos do primeiro rei saudita e parecem destinados a desempenhar um papel crucial nas aspirações reformistas do príncipe herdeiro.
O príncipe herdeiro Mohammed bin Salman (MBS) aparenta estar a destruir a nossa compreensão sobre como é governada a Arábia Saudita. Com o objectivo de consolidar o seu poder, deitou há meses pela janela a prudência e a construção de consensos – as técnicas habituais da liderança saudita –, preferindo actuar com velocidade quase negligente e um aparente desprezo pela necessidade de ganhar apoios entre os seus numerosos tios e primos.
As detenções do início deste mês de 11 príncipes acusados de corrupção sugere que a família real, a Casa de Saud, já não está acima da lei.
As análises sobre as jogadas recentes de MBS dividem-se entre os que prevêem que ele está encaminhar o país para uma ditadura e os que antecipam uma revolta na família. Mas uma análise mais cuidadosa das acções e declarações feitas pelo príncipe no último ano sugerem que ele é mais calculista do que impetuoso. O procurador-geral saudita afirmou na semana passada que as investigações aos casos de corrupção estão em curso há três anos e já numa entrevista em Maio, Bin Salman se referia a uma grande operação de combate à corrupção. “Posso garantir que qualquer pessoa envolvida, seja ministro, príncipe ou seja quem for, não irá ficar impune”, afirmou.
Entretanto, desde Abril que Bin Salman, de 32 anos, tem vindo silenciosamente a orquestrar as nomeações de um grupo de jovens príncipes, com idades entre os 20 e os 30 anos, para cargos influentes. Serão cruciais para o sucesso dos seus planos de remodelação do reino e poderão emergir nas próximas décadas como fiel da balança do poder.
São netos ou bisnetos do fundador do reino saudita, Ibn Saud, que morreu em 1953. Bin Salman tem sido muito prudente ao promover os seus jovens príncipes, apelando à sua ambição e vaidade, e garantindo a sua lealdade. É uma boa forma de incorporar qualquer competição entre as várias linhas da família – Ibn Saud teve mais de 40 filhos e os netos são na ordem das centenas. As acções do príncipe têm evitado até agora uma revolta colectiva da família, o que prova uma vez mais a utilidade do provérbio: “dividir para reinar”.
Como em todas as monarquias, a linha de sucessão é na maioria das vezes mais importante do que a competência para os potenciais líderes sauditas. Bin Salman até pode querer promover o talento – mas irá certamente prestar atenção à forma como pode evitar o ressentimento ou os sinais de oposição. Promover os filhos pode limitar a revolta causada pelo afastamento dos pais.
A Casa de Saud já passou por transições difíceis no passado. O que é diferente desta vez é que a idade deixou de ser significado de senioridade e pode mesmo ter-se tornado um handicap.
Uma juventude relativa significa necessariamente menor experiência, mas esse é um risco que Bin Salman parece decidido a correr.
Os príncipes jovens e em ascensão a que vale a pena estar atento (numa lista por ordem alfabética)
Abdulaziz bin Fahd
É bisneto de Ibn Saud e vice-governador da região de Jawf, na fronteira com a Jordânia, desde Junho deste ano. O seu pai, um militar, foi nomeado comandante das forças terrestres sauditas em Abril
Faisal bin Sattam
Foi nomeado embaixador em Itália em Junho de 2017. Mostrou muito cedo o seu apoio à ascensão de Bin Salman: enquanto membro do Conselho da Fidelidade (Allegiance Council, que integra os membros mais poderosos da família), votou em 2014 contra a escolha do príncipe Muqrin como segundo na linha de sucessão, um dos primeiros sinais de apoio ao campo de Salman (Muqrin tornou-se príncipe herdeiro com a morte do rei Abdullah, em Janeiro de 2015, mas o rei Salman afastou-o três meses depois de assumir o trono. O defunto rei terá pensado em substituir Muqrin por Salman, criando uma vaga como príncipe herdeiro para o seu filho mais velho, Miteb, que foi demitido como ministro da Guarda Nacional no início deste mês e é um dos que foram detidos).
Abdulaziz bin Saud
Com 30 anos, foi nomeado ministro do Interior em Junho. Substituiu o seu tio e então príncipe herdeiro Muhammad bin Nayef, que foi forçado a demitir-se. O pai de Bin Saud é governador da província Oriental, rica em petróleo, onde a população xiita saudita é maioritária. Os seus novos poderes foram limitados dias depois de ter sido nomeado, com a transferência de parte das responsabilidades do ministério para a nova organização de segurança do Estado. Se ficou revoltado, não o manifestou em público.
Abdulaziz bin Turki
De 34 anos é o vice-presidente da Autoridade Geral do Desporto, cargo para que foi nomeado também em Junho. O seu pai, Turki bin Faisal, foi embaixador em Washington e Londres, bem como chefe do serviço de informações exteriores do reino, a Presidência Geral de Informações. Ultimamente, Turki bin Faisal tem estado envolvido em negociações públicas com antigos responsáveis israelitas.
Ahmed bin Fahd
Bisneto do rei Ibn Saud, foi nomeado vice-governador da província Oriental em Abril. O pai, que tinha sido governador da mesma região entre 1986 e 1993, morreu em 2001.
Bandar bin Khalid
De 52 anos, foi nomeado em Junho consultor do Conselho Real. O seu pai é governador da província de Meca.
Khalid bin Bandar
Nomeado embaixador na Alemanha em Junho. Estudou em Oxford e é filho do príncipe Bandar bin Sultan, antigo embaixador dos Estados Unidos que se tornou próximo de vários Presidentes americanos.
Khalid bin Salman
De apenas 29 anos foi nomeado embaixador em Washington já este ano. Antigo piloto de caças F-15 é irmão de Bin Salman.
Saud bin Khalid
Nomeado vice-governador de Meca em Abril.
Turki bin Muhammad
Tem 38 anos e foi escolhido como consultor do Conselho Real. O seu pai, filho do rei Fahd, foi governador da Província Oriental entre 1985 e 2013.
Um príncipe que até há duas semanas integraria esta lista é Mansour bin Muqrin, vice-governador da província de Asir, que morreu na queda de um helicóptero a 5 de Novembro. Ocupava aquele cargo desde 2013 e tinha sido nomeado conselheiro do rei Salman em Abril de 2015, quando o pai foi afastado da posição de príncipe herdeiro. Especula-se que não gostava de Bin Salman, o que é plausível dado o afastamento do seu pai. Um rumor adicional sugere que a sua morte não foi acidental, mas para já não há provas disso.
Esta lista de príncipes também é notável por aqueles que não constam dela. Não inclui nenhum dos filhos ou netos do rei Abdullah e apenas um neto do rei Fahd, meio-irmão e antecessor do último monarca. Também ausentes estão quaisquer familiares directos do príncipe Ahmed bin Abdulaziz, um dos Sete de Sudairi – como eram conhecidos os filhos que o rei Ibn Saud teve com Hussa al-Sudairi, a mais influente das suas esposas. A omissão é facilmente explicável: acredita-se que Ahmed terá votado no Conselho da Fidelidade contra a escolha de Bin Salman como príncipe herdeiro, em Junho.
Bin Salman vê-se claramente, e é visto pelo seu pai, como o próximo rei saudita. O último rumor é que a mudança pode acontecer muito em breve. Tradicionalmente, o sucesso da transição iria depender da aceitação e do apoio da família real alargada, mas a impaciência de Bin Salman e a sua ambição sugerem que não haverá opção. A sua autoridade irá depender apenas do apoio daqueles que constam desta lista.
Outro grupo que poderá ser crucial são os príncipes que integram as Forças Armadas. Estes são mais difíceis de identificar e ocupam essencialmente posições destinadas a evitar golpes militares. Um telegrama do Departamento de Estado norte-americano de 1985 divulgado pela Wikileaks oferece uma boa análise, ainda que datada. “A mera presença dos príncipes nas Forças Armadas é um garante de estabilidade do regime de Al-Saud”, concluiu.
Acredita-se que o rei Salman vê o filho como um Ibn Saud dos tempos modernos, um potencial grande líder com enorme ambição e muito mais promissor do que qualquer outro candidato mais velho ao trono. Mas até mesmo Bin Salman parece reconhecer que, para transformar a economia do reino e lidar com os desafios do caos regional, ele precisa de ser o líder de uma equipa real.