Infra-Estruturas de Portugal cobra 750 euros/mês por memorial aos refugiados
Presidente da Câmara de Almeida diz que tentou sensibilizar a empresa pública para o carácter cultural e humanístico do projecto.
Inaugurado há uma semana pelo Presidente da República, o museu Vilar Formoso Fronteira da Paz – Memorial aos Refugiados e ao Cônsul Aristides de Sousa Mendes está instalado precisamente na estação ferroviária daquela vila fronteiriça, nuns armazéns que há várias décadas estavam desactivados e em avançado estado de degradação e que agora foram recuperados para o efeito.
A Infraestruturas de Portugal (antiga Refer), porém, cobra 750 euros por mês à Câmara de Almeida pela ocupação daqueles activos, num contrato que tem a duração de 20 anos.
António Baptista Ribeiro, presidente da Câmara de Almeida, disse ao PÚBLICO que tentou sensibilizar a empresa pública para o carácter cultural e humanístico do museu, mas que a empresa foi insensível a essa argumentação, optando por cobrar um aluguer por dois armazéns que em tempos serviram para guardar as mercadorias transportadas nos comboios e que agora já não tinham qualquer préstimo.
“Só consegui negociar os 750 euros: inicialmente, pediram-me o dobro desse dinheiro”, explica o autarca. Mais: a Infraestruturas de Portugal queria que, no contrato, a Câmara pagasse também uma balança de pesar vagões e uma velha grua (sem uso há décadas) só porque estes equipamentos também estavam junto aos armazéns. “Queriam mais 500 euros pelo guindaste, mas eu disse que não”, acrescenta António Baptista Ribeiro.
As obras de construção civil do museu custaram 570 mil euros e incluíram a consolidação das paredes e a mudança do telhado. A Câmara já paga a renda à Infraestruturas de Portugal desde há um ano, quando tomou posse dos edifícios.
O projecto total custou 1,2 milhões de euros e foi financiado pela Câmara de Almeida, pelo Estado português, pela União Europeia e pelo EEA Grants, um fundo financeiro através do qual a Noruega, a Islândia e o Liechtenstein apoiam projectos dos países beneficiários do Fundo de Coesão.
Luísa Pacheco Marques, arquitecta responsável pelo museu, disse ao PÚBLICO que tentou fazer entender à Infraestruras de Portugal que a empresa só se valorizaria se fosse parceira do museu e cedesse as instalações. “Isto não é um projecto comercial. Não é só mais um museu, mas sim um projecto que ajuda a contrariar a decadência do interior (e da própria estação de Vilar Formoso, que está meio morta) e que extravasa a dimensão local, regional e nacional porque tem uma projecção verdadeiramente internacional”, argumenta a responsável.
Luísa Pacheco Marques diz que já recebeu pedidos da Sousa Mendes Foundation, que quer organizar visitas ao museu a partir dos Estados Unidos, e que a Bodhy Foundation também está interessada em incluí-lo no seu roteiro.
Na inauguração de sábado passado, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que este museu “é uma chamada de atenção constante para que não nos esqueçamos, não nos resignemos, não nos demitamos da nossa luta por valores fundamentais da pessoa humana”.
Nos dois armazéns foi construído um percurso com seis núcleos expositivos: Gente como nós, Início do pesadelo, A viagem, Vilar Formoso fronteira da paz, Por terras de Portugal e A partida.
Contactada pelo PÚBLICO, a Infraestruturas de Portugal confirmou o aluguer de 750 euros por mês pagos à IP – Património, uma empresa afiliada que procura valorizar os activos que eram da Estradas de Portugal e da Refer. Na inauguração esteve presente o administrador dessa empresa, José Carlos Osório.
Ministério das Finanças mais generoso
O edifício da Alfândega, que fica na fronteira rodoviária de Vilar Formoso, foi recuperado pela Câmara de Almeida para nele funcionarem os serviços alfandegários (que necessitam hoje de menos espaço do que antigamente) e o Centro de Desenvolvimento Econónimo Transfronteiriço. Trata-se de um imóvel com arquitectura típica do Estado Novo, com azulejos de Júlio Resende e esculturas de Lagoa Henriques.
O município custeou as obras de recuperação e fica com a sua posse durante 30 anos, mas neste caso não tem de pagar renda à Direcção-Geral do Tesouro, que detém o edifício. O Ministério das Finanças foi, neste caso, mais generoso do que a Infraestruturas de Portugal.
António Baptista Ribeiro diz que o próximo passo é a recuperação do edifício da Guarda Fiscal, no largo da estação ferroviária, onde gostaria de ver instalada a GNR.