Bombeiros ficaram com 71% das verbas para a prevenção de fogos
Dos 56 milhões de euros aprovados pelo PO SEUR para a redução dos riscos dos incêndios só 10,2 milhões foram gastos na prevenção. O grosso das verbas do fundo europeu de Coesão foi para obras e veículos dos bombeiros.
A maior fatia das verbas do Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (PO SEUR) destinadas ao objectivo da “redução dos incêndios florestais” não teve como primeiro destino a floresta ou o ordenamento florestal. Foi atribuída à compra de veículos para as corporações de bombeiros ou para a construção, modernização ou ampliação de quartéis. De um total de 56 milhões de euros distribuídos pelo programa, 40 milhões foram para os bombeiros e apenas 10,2 milhões acabaram na Instalação de Redes de Defesa da Floresta contra Incêndios, que contemplam a abertura de vias de circulação, a criação de áreas limpas de combustível (matos) nos povoamentos florestais ou acessos a pontos de água. A restante fatia do programa financiado pelo Fundo de Coesão (5,8 milhões de euros) foi aplicada em Acções Inovadoras para a Prevenção e Gestão de Riscos, em Instrumentos de Planeamento, Monitorização e Comunicação e em Ações de Comunicação e Sensibilização para Prevenção de Incêndios Florestais.
O balanço das candidaturas apresentadas ao PO SEUR tem como data limite o dia 31 de Julho, antes de o discurso político do Ministério da Agricultura e do próprio primeiro-ministro terem insistido na necessidade de se reforçar a prioridade da prevenção dos incêndios em detrimento da aposta nos meios de combate. Os dados da execução do programa traduzem a orientação política que o anterior Governo levou às negociações com a Comissão Europeia - e que, entretanto, o actual executivo ainda não alterou. À luz dessa orientação, os investimentos na compra de um jipe para os bombeiros estavam na mesma linha de prioridade da criação de faixas de gestão de combustível, essenciais para travar o fogo na floresta. Como os gestores do PO SEUR reconhecem num esclarecimento ao PÚBLICO, não há nos regulamentos uma distinção “taxativa” entre a “perspectiva de prevenção ou de combate”, até porque “o reforço das condições de operação das entidades responsáveis pelo combate aos incêndios reforça também a sua prevenção e a minimização dos seus efeitos”.
O Ministério da Agricultura reconhece que as verbas do PO SEUR para a prevenção se ficaram nos 10,2 milhões de euros, mas considera que esse valor deve ser “complementado com os apoios distribuídos através de outros instrumentos”. Em concreto, o Governo inclui nesta rúbrica 46 milhões de euros do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR) aplicados no combate a “agentes bióticos e abióticos”, 14 milhões do Fundo Florestal Permanente para o Programa Nacional de Sapadores Florestais e para os gabinetes técnicos florestais dos municípios e 12,7 milhões para 64 novas equipas de sapadores, 20 das quais já estão criadas. O PDR, o programa de fundos estruturais destinado ao investimento privado na agricultura e florestas, rejeitou 1364 projectos por falta de dotação orçamental, noticiou o DN. O Governo promete reprogramar o PDR para reforçar a prevenção.
No PO SEUR, que exclui o investimento de particulares, a ausência de verbas consignadas ou de qualquer discriminação positiva para o investimento estrutural na floresta fez com que a dinâmica das corporações de bombeiros garantisse o controlo de 71% dos fundos. Dos 13 avisos lançados pelos gestores do programa para o objectivo “redução dos fogos florestais”, nove visaram “o reforço das capacidades operacionais das entidades que atuam no domínio da prevenção e gestão de riscos de incêndios”, ou seja, os bombeiros, mas também a Autoridade Nacional da Protecção Civil ou a GNR. Os outros quatro avisos, direccionados para a criação de redes de protecção, tiveram como destinatários os municípios ou o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
Nos avisos para o reforço dos meios de combate, foram disponibilizados 27,7 milhões de euros, mas as candidaturas aprovadas (335) obrigaram à atribuição por parte do Fundo de Coesão de 40 milhões de euros. Já nos avisos destinados às redes de prevenção, a dinâmica foi menos intensa: dos 11,4 milhões de euros inscritos na dotação, acabaram por ser atribuídos 10,2 milhões de euros aos 34 projectos que foram aprovados. E deste montante o ICNF ficou com mais de 40%. Exactamente 4,135 milhões de euros, resultantes da aprovação de dois projectos para melhorar as redes de protecção das florestas sob a alçada do Estado.
Novos quartéis e mais obras
Na lista das candidaturas aprovadas pelo PO SEUR, há um festival de novos quartéis a serem construídos ou alvo de obras de ampliação ou modernização – são ao todo 64 quartéis que vão ser alvo do financiamento apoiado pela União Europeia em 85% do valor do investimento. A corporação de Manteigas, por exemplo, vai aplicar 442 mil euros numa “remodelação profunda no rés-do-chão e menos profunda no primeiro piso”, sendo que no rés-do-chão é “premente a necessidade de se resolverem humidades e salitres (entre outras situações)”. A Associação Humanitária de Castro Daire vai investir 457 mil euros no seu quartel para “colmatar a actual inexistência de áreas funcionais básicas”, necessidade que os bombeiros de Farejinhas, no mesmo concelho, comparte, tendo por isso apresentado uma candidatura (aprovada) no valor de 521 mil euros.
Juntamente com os quartéis, os bombeiros não deixaram passar a oportunidade dos avisos do PO SEUR para modernizarem os seus equipamentos. Mais de 70 corporações de bombeiros juntaram-se a municípios ou à GNR para disputar as verbas do programa. A maioria esmagadora propõe-se adquirir veículos florestais ou “veículos tanque táctico florestais”, caso do município de Coimbra ou os bombeiros de Cacilhas, que custam entre 104 mil e 120 mil euros. Os projectos mais ambiciosos foram os da GNR, que conseguiu arrecadar 893 mil euros para renovar a sua frota de veículos usados ou adaptados ao uso nos espaços florestais.
Já quanto às candidaturas relacionadas com a prevenção, os investimentos previstos situam-se entre os 90 mil e os 740 mil euros – neste caso na Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra. Individualmente, o projecto mais vultuoso (377 mil euros), foi apresentado pela Câmara de Viana do Castelo para proteger a floresta das encostas do Monte de Santa Luzia.