Pelo Museu Nacional da Música em Coimbra
Coimbra é uma Cidade da Música, mesmo que não queiram que assuma esse estatuto.
O Museu Nacional da Música tem tido uma vida atribulada e hoje estará perante mais um dilema no que toca à sua instalação. Atualmente na estação do Alto dos Moinhos, do Metropolitano de Lisboa, com base num protocolo celebrado entre a Direcção-Geral do Património Cultural e o Metropolitano de Lisboa, que está no seu términus, é natural que viva mais um tempo de ansiedade relativamente ao seu futuro.
Sendo um museu nacional e com um interessante espólio, a verdade é que ao visitá-lo e ao ler a sua história percebe-se quanto seria importante uma instalação definitiva e condigna. Um museu provisório é sempre um museu adiado que vai perdendo capacidade de afirmação, de reforço do seu espólio e de eventual degradação das suas condições de salvaguardo do património. Como é sabido, não se fazem obras de manutenção ou melhoram as condições de instalação e exposição num espaço temporário.
Para mais não parece que instalações anexas a uma estação de metropolitano, como aquelas que hoje ocupa, sejam o espaço mais adequado à localização de um museu nacional. Aliás, os dados estatísticos dos últimos anos falam por si. O Museu da Música é dos museus nacionais um dos que tem um menor número de visitantes e este facto não pode ser desligado da sua localização.
Atrevo-me a dizer que esta situação só tem sido possível porque estamos a tratar de música. Porque a nossa música nunca foi devidamente considerada pelos poderes públicos como um bem cultural essencial, tal como acontece noutros países, nem como um bem económico como de algumas décadas para cá foi assumido, por exemplo, pela Suécia, em que representa uma fatia significativa do seu PIB.
Com a recente vitória no Festival da Eurovisão foi possível perceber, através de uma simples canção cantada na nossa língua, o impacto a nível mundial e a consequente importância da música para o país, aos mais diversos níveis.
Como em tantas outras áreas, estamos hoje a descobrimo-nos e a ser descobertos e, por isso, não podemos desperdiçar esta oportunidade de evidenciar a nossa riqueza musical nas suas mais diversas expressões. É imperioso conhecer e divulgar o que se fez e o que se faz neste pequeno país mas tão singular nas mais diversas áreas culturais.
Quando recordamos o fantástico trabalho de pesquisa e recolha realizado pelo etnomusicólogo Michel Giacometti, que fundou na década de 1960 os Arquivos Sonoros Portugueses, e trabalhos mais recentes de recolha musical como a série documental Povo que ainda canta, de Tiago Pereira, percebemos a riqueza musical do país profundo e o quanto é preciso continuar a fazer para preservar esse património.
Também não podemos esquecer o reconhecimento do fado como Património Imaterial da Humanidade, bem como um conjunto de grandes músicos, seja a nível de composição seja de execução, que se vem afirmando internacionalmente na música ligeira e no jazz, bem como a existência de excelentes instrumentistas a tocar nas melhores orquestras sinfónicas do mundo.
Há, ainda, a nível de construção de instrumentos, uma enorme competência e uma grande capacidade de reinvenção e de recuperação de instrumentos que estavam em risco de desaparecimento.
Não sendo um melómano e assumindo a minha absoluta desafinação, tenho no entanto presente, como diz a canção, “que os desafinados também têm um coração”, e que não seria possível viver sem música, e também considero que a minha cidade de Coimbra é de facto uma Cidade da Música, mesmo que não queiram que assuma esse estatuto. Há aqui um património musical fantástico, uma canção urbana única, excelentes músicos, dezenas de coros e também estudiosos e profundos conhecedores da nossa música.
Há em Coimbra um ambiente musical extremamente rico e ativo que é um importante elemento a acrescentar à sua qualidade de vida e a reforçar a sua natureza de cidade de cultura. Tudo isto, e porque um dos nossos mais celebrados músicos, Carlos Seixas, nasceu em Coimbra e vai fazer, no próximo dia 25 de agosto, 275 anos que faleceu, levam-me a defender a instalação definitiva em Coimbra do Museu Nacional da Música.
Tanto quanto é sabido, o anterior governo terá equacionado a hipótese de o Museu da Música ser instalado em Mafra, o que implicaria custos que à partida são estimados em mais de 6,5 milhões de euros. Ora, o Palácio Nacional de Mafra já tem problemas que cheguem, veja-se o que se passa com o estado dos seus carrilhões.
Também não será despiciendo invocar a importância da descentralização de equipamentos culturais como este, lembrando, por exemplo, os argumentos invocados na defesa da instalação da Agência Europeia do Medicamento no Porto.
A localização geográfica de Coimbra, o seu ambiente e ambição cultural, bem como a possibilidade de encontrar sem grandes dificuldades instalações capazes de acolherem dignamente o Museu Nacional da Música e de permitirem o seu desenvolvimento, são argumentos a considerar. Fica o desafio à cidade, ao governo da cidade e ao Ministério da Cultura!